O Rato e o Navio

por Rogerio Dutra dos Santos, no Democracia e Conjuntura

A bile dos ressentidos começa a ocupar os noticiários da madrugada. O Vice-Presidente da República Michel Temer, Presidente do PMDB, escreveu uma carta para Dilma para ser publicizada. E foi. Agora ele acusa a Presidência de “vazamento” e aproveita para referendar sua imagem de golpista, que foi sugerida pela mídia durante as últimas semanas, quiçá meses.

Temer, em algum momento da crise política, apesar dos seus 99.046 (isso, noventa e nove mil) votos como Deputado eleito “por média” pela última vez, em 2006, acreditou que poderia ser Presidente da República. Em uma fração de segundos se livrou da situação de operador dos interesses de Eduardo Cunha e da responsabilidade de representante de uma coalizão partidária e acreditou ter luz própria. Acreditou que poderia brilhar.

O problema é que – independentemente do que se faça -, no Brasil, a política não perdoa os traidores. Se a Dilma caísse, como desejam os golpistas, cairia de pé, ninguém duvida. Se Lula fosse preso, como deseja a “Operação Lava-Jato”, o seria de cabeça erguida – e diante de uma comoção popular – ninguém duvida. Mas Temer não teve sequer a coragem de romper de fato e de direito com Dilma. Não renunciou, não pediu pra sair, nem nada. Reclamou, fez um mi-mi-mi e está quieto, esperando as repercussões positivas (???) e eventuais prêmios pela sua atuação medíocre e temerária.

E esta “carta-testamento”, auto-vazada? Factóide lamentável de um desesperado, talvez encontre eco entre os twiteiros (“Saio da vida para entrar nos memes do twitter” ou “Hello, it’s me you looking for?”, foram os primeiros de dezenas de twitters, memes e gifs hilários desta madrugada, diversão garantida aos auspícios de Temer). Qual o objetivo pragmático a ser alcançado pelo Vice Presidente menos confiável que já passou por aqui? Provavelmente almeje um golpe em que figure como salvador da pátria.

O que é certo é que Temer ainda não dimensionou o que acontecerá com sua carreira. Tema-se por um dos suicídios políticos mais imbecis da história brasileira. Bem que Eduardo Cunha avisou que não cairia sozinho. Cairá abraçado com seu parceiro, Michel Temer, que sai da história para entrar no ostracismo.

Agora, falando sério: diferentemente do que afirma e reafirma em sua carta-testamento a Dilma, Temer não manda no PMDB. Ninguém manda no PMDB. Muito menos o Temer. O PMDB não desembarcará do governo. Não haverá uma deserção de cargos e salários para além de seus correligionários mais próximos e dependentes. Dilma não perderá a maioria congressual do dia para a noite.

Já Michel Temer, em uma cartada, perdeu completamente a moral. Virou piada nacional. Uma das madrugadas mais ricas em chistes dos tempos recentes de twitters e facebooks. E tem mais. O que o Temer prometeu para que estas defecções pontuais acontecessem? Ninguém sabe. Imagina-se que os mesmos cargos serão devolvidos aos demissionários, depois de instaurado o governo-tampão mais improvável. Mas quem de boa fé acredita? Quem de boa fé aposta, na real, no Temer Presidente do Brasil?

Em momentos de crise, os ratos são os primeiros a abandonar os navios. Neste caso, contudo, a crise está longe de ser terminal. Uma parte significativa dos críticos ao governo se assumiu legalista-democrática. O governo respira forte em sua estratégia de enfrentamento aberto a um processo de impeachment que nasce desmoralizado pela sua autoria. O grito de Cunha contra o comitê de ética é o grito dos desesperados. A união umbilical entre Cunha e Temer parece o único elemento a permanecer íntegro numa dinâmica golpista fadada ao fracasso. A ratazana equivocou-se na avaliação. Sairá da história como um sujeito menor. Um anão rodeado de medíocres. E, provavelmente, fora do navio, morrerá afogado numa bile de torpeza e ressentimento.

 

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