Atualizado em 05/12/2015 às 00h19, com adição do Instituto Liberal e do IL de São Paulo
De vez em quando a direita brasileira, por meio de algumas páginas, usa discursos do tipo “Queremos mais educação”, “A educação vai transformar o Brasil” e outras supostas defesas do ensino básico e universitário. Mas dezembro de 2015 tem sido um mês em que o pessoal formador de opinião desse lado do espectro político no Brasil mostrou que na verdade não está nem aí para a situação dos alunos de escolas públicas brasileiras.
O quase total silêncio perante as ocupações e protestos promovidos pelos estudantes de escolas estaduais de São Paulo ameaçadas de fechar pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) evidencia isso. Digo “quase total” porque, dentre centenas de postagens ao longo dos quatro primeiros dias deste mês, pouquíssimas mencionaram as ações estudantis – mas, pasmem, todas eram postagens contra os estudantes.
Foram investigadas 32 páginas de direita bastante representativas no Facebook, incluindo páginas de políticos, formadores de opinião aclamados, partidos, páginas de “politização contra corrupção”, ONGs “liberais” e páginas assumidamente conservadoras. São fanpages com uma enorme penetração na parcela da opinião pública brasileira que se identifica mais com ideias e crenças de direita.
Foi vasculhado o histórico de postagens dessas páginas entre a meia-noite do dia 1º de dezembro e as 9h30 da manhã do dia 4, intervalo de tempo no qual as ocupações continuaram se expandindo e os protestos estudantis nas avenidas de São Paulo capital se espalharam.
Das 32 páginas pesquisadas, 25 prestaram o mais absoluto silêncio omisso perante as ações dos adolescentes em SP. Apenas sete mencionaram em alguma postagem as manifestações, tendo sido um total de treze postagens, todas elas criticando os alunos ou pessoas que apoiam as ações deles.
Abaixo está a lista de páginas que pesquisei para escrever este artigo, e quantas postagens cada uma delas dedicou às ações estudantis:
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Partidos políticos e representantes seus com posições claramente de direita:
PSDB: zero
Democratas: zero
Solidariedade (partido): zero
PMDB Nacional: zero
Partido Novo: zero
Aécio Neves: zero
Paulinho da Força: zero
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Formadores de opinião de direita:
Rachel Sheherazade: zero
Reinaldo Azevedo: zero
Rodrigo Constantino: zero
Luciano Huck: zero
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ONGs “liberais”
Instituto Millenium: zero
Estudantes Pela Liberdade: zero
Instituto Ordem Livre: zero
Instituto Liberal: uma única postagem, contra os estudantes
Instituto Liberal de São Paulo: duas postagens, contra os estudantes
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Entidades e páginas de “politização contra corrupção”:
Movimento Brasil Livre: zero
Vem Pra Rua Brasil: zero
TV Revolta: Uma única postagem, contra os estudantes
Movimento Contra Corrupção: Duas únicas postagens (esta e esta), ambas contra os estudantes
OCC – Organização de Combate à Corrupção: zero
Folha Política: zero
O Brasil Acordou: zero
Mobilização Patriota: zero
Povo Brasileiro: zero
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Páginas assumidamente conservadoras
Canal da Direita: uma única postagem, contra os estudantes
Jovens de Direita: cinco postagens, todas contra os estudantes
Vem Pra Direita Brasil: zero
Direitas Já: zero
Movimento Endireita Brasil: zero
O Reacionário: uma única postagem, sem dar nenhum posicionamento sobre as ações dos estudantes, mencionando-os apenas para criticar a deputada Jandira Feghali, do PCdoB
FORA PT: zero
Obs.: Não foi pesquisada a página Revoltados On Line, por ser de extrema-direita. Apenas páginas de posturas não consideradas extremistas (mesmo que muitas sejam de fato absurdas) foram vasculhadas.
Fica muito evidente que a direita brasileira, desde os liberais até os conservadores não extremistas, não está nem aí para a educação. Nesse histórico de quatro dias pesquisado, não houve uma postagem sequer defendendo alguma maneira que se acredite que poderia melhorar o ensino escolar no Brasil – nem mesmo, por exemplo, a privatização e terceirização das escolas públicas.
O silêncio foi quase completo, sendo quebrado com raridade apenas para achincalhar o movimento dos estudantes paulistas. As páginas não dão a mínima para o fato de que o que aqueles jovens estão reivindicando é o mais básico direito de estudar. Suas reivindicações, até o momento, sequer englobam a construção de novas escolas públicas e o aumento dos investimentos em educação. Têm sido simplesmente a preservação do seu direito à educação, por meio da revogação da “reorganização” que vem impor o fechamento de quase cem escolas no estado de São Paulo.
Destaca-se também a completa omissão perante o recrudescimento da repressão policial contra os jovens, tanto nas escolas ocupadas como nas ruas. Absolutamente nada se falou sobre a decisão do gabinete da Secretaria de Educação de declarar guerra literal aos estudantes, nem sobre as diversas violações aos Direitos Humanos, à Constituição, ao Estatuto da Criança e do Adolescente e a decisões da Justiça, recorrentemente protagonizadas nesse contexto por uma das polícias mais violentas do planeta.
Uma razão para tal mudez é o fato de que Geraldo Alckmin, mesmo sendo um dos maiores inimigos da educação pública no Brasil, é do PSDB, partido que tem tomado posições clara ou implicitamente de direita. É um partido aliado das páginas que foram pesquisadas, compartilha com elas o fanático desejo pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff e o compadreado ideológico. Portanto, é de se esperar que tais fanpages protejam tucanos, por mais autoritários, antidemocráticos, antipopulares e repressores que sejam – tendo sido isso visto também no final de abril.
Também foi tumular o silêncio perante o show de autogestão que os estudantes têm dado nas escolas ocupadas, promovendo a organização interna que, ao longo de anos, o Estado e a diretoria têm se recusado a fazer. Os únicos momentos em que a atuação deles foi mencionada foi de maneira negativa, para acusá-los de não criticarem o governo federal e serem mancomunados com movimentos sociais e partidos.
Essa segunda “acusação”, se muito, se aplica a apenas alguns jovens. E mesmo assim, não há nenhum demérito em ser filiado a partidos ou coletivos de luta, sendo isso na verdade o mais justo exercício da cidadania democrática e constitucional. A oposição de algumas das fanpages de direita mencionadas aos estudantes por causa desses banais motivos deixa claro o quanto essas páginas são avessas aos mais fundamentais valores democráticos, sejam estes da democracia direta ou da representativa.
O que se viu nessas páginas, ao invés, foi um foco quase exclusivo à abertura do processo de impeachment contra a presidenta Dilma, além de alguns ataques periféricos a outros nomes do PT, como Lula e Delcídio do Amaral, e alusões críticas à crise econômica. Ficou muito evidente que a intenção da direita brasileira é manipular a opinião pública, de modo que esta acredite piamente que os problemas causados por petistas são os únicos males vigente no Brasil, e usá-la como massa de manobra para retirar de vez o PT do poder e transferi-lo ao PMDB de Michel Temer, um potencial futuro presidente ainda mais conservador e antipopular do que Dilma.
É notável, aliás, que tais ataques a Dilma e ao PT, na maioria das vezes, são munidos de uma linguagem muito raivosa, agressiva, incitadora do ódio político e da irracionalidade. Combinando essa apologia incitatória ao ódio com o total descaso perante o movimento democrático estudantil em São Paulo e a repressão militar por ele sofrida, fica transparente, de tão claro, que a direita brasileira odeia a democracia e a usa apenas para fins demagógicos: manipular o povo em torno de conveniências particulares de seus representantes políticos e formadores de opinião.
Nessa história toda, fica fortemente evidente que a direita no Brasil não se importa com a educação escolar das crianças e dos adolescentes. E por tabela, não dá a mínima para os mais basilares valores democráticos. Para ela, o povo é apenas uma massa a ser controlada, marionetizada e manipulada, de modo que reivindique acriticamente, sem pensar, o que seus representantes mais antidemocratas querem. Fica lógico por quê esse descaso para com a educação: a ignorância das pessoas interessa politicamente para os direitistas engajados.