por Tadeu Porto
Em um certo momento na semana passada, no meio da greve dos petroleiros e petroleiras (que tive o prazer de classificar como revolucionária aqui mesmo nesse espaço), tivemos que jogar uma moeda para decidir, em assembleia, quem iria defender primeiro pela permanência ou suspensão da greve.
Todo sindicalista sabe que é assim: em uma greve é fácil entrar, o difícil é sair. Uma das contas mais complexas de um movimento paredista é saber a hora em que se deve suspender o mesmo. E, claro, qualquer categoria minimamente democrática escuta os argumentos dos dois lados para, então, a maioria dos votos definirem os rumos futuros. A construção das defesas do “parar” ou “continuar” é meticulosamente pensada e vale inclusive considerar qual lado começara a argumentação, como num debate eleitoral.
E é nessas horas que se lança mão da boa e velha moeda! Um objeto que não representa apenas o capital em aço, mas também um instrumento de imparcialidade, afinal, depois de um toque na lateral da moedinha veremos ela rotacionar sob seu próprio eixo sabendo que temos 50% de chance de ser atendido! Ao fim, com “cara” ou “coroa”, teremos a sensação de que o destino interveio e escolheu a opção mais neutra possível.
Pelo menos é isso que gostaríamos de pensar. Entretanto, como tudo na vida vem com um anexo complicador, até mesmo uma simples circunferência de metal com dois lados diferentes pode nos enganar se sua distribuição de massa for irregular, ou seja, a probabilidade de cair um dos lados poderá ser (bem) maior.
Esse fenômeno tem o nome de “moeda viciada”: e não é coincidência que tenha o mesmo adjetivo que usamos, por exemplo, para classificar a estrutura política do nosso país: viciada desde a máquina pública até os representante escolhidos direta ou indiretamente.
A prisão do (ex?)senador Delcídio Amaral é uma grande evidência disso. É a mostra de que a moeda da justiça brasileira pode até a chegar a 1000 rotações por minuto mas vai cair sempre do mesmo lado: o da estrela vermelha.
Vale salientar algo aqui: eu, como petroleiro, não nutro a menor simpatia pelo Delcídio pois na nossa guerra contra o Serra e a Chevron ele jogou ao lado dos entreguistas.
Mas isso não é motivo para virar as costas para o absurdo que está colocado sobre a parcialidade da justiça nacional. Num país onde o presidente da câmara é acusado com uma gama de provas contundentes e mesmo assim consegue se manter no cargo para achacar a Deus e o mundo, há de se separar um tempo para raciocinar se existe uma perseguição viciada a certos atores políticos no país.
Claro, as provas contra Amaral são cabais e fortes! Eu sei que existe uma polêmica sobre como interpretar a constituição acerca da prisão de parlamentares somente em flagrante, não conheço o direito tão a fundo, mas, particularmente, achei foi muito bom a prisão do senador. Ele quis influenciar de maneira suja e anti-ética os rumos de uma investigação que certamente mudará a cara do Brasil. Todos temos críticas a lava-jato mas é inaceitável tentar mudá-la pelo caminho da ilegalidade.
Mas é difícil, muito inclusive, aceitar que o STF realize uma prisão aparentemente tão coerente contra o líder do governo no senado e deixe a desejar nos julgamentos contra outros políticos.
Demóstenes Torres, por exemplo, esteve envolvido em escutas e relações muito controversas com o “bicheiro” Carlinhos Cachoeira. Hoje, Cachoeira é visto em páginas de fofocas com sua querida esposa, a musa da CPI, onde a mídia coloca sempre uma visão muito humana do pobre coitado contraventor (Tadinho, sofreu na cadeia. Ô dó…).
José Arruda foi pego recebendo dinheiro vivo no mensalão do DEM. Nas eleições do ano passado, ele tentou virar governador do Distrito Federal mas o TSE barrou, pela lei da ficha limpa, a candidatura do mesmo. Mas isso não impediu que viesse a tona um vídeo onde o ex-democrata afirma, com toda a tranquilidade do mundo, que estava fazendo lobby para revirar os votos de sua impugnação com ajuda do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O helicóptero de Gustavo Perrela foi pego com meia tonelada de pasta base de cocaína, em flagrante. O piloto da aeronave era funcionário do gabinete do deputado e estranhas ocorrências são notadas até hoje, desde o silêncio sepulcral da mídia sobre o assunto, até a declaração de um procurador que viu indícios de farsa na investigação do caso. Mas os Perrelas andam tranquilos por aí, participando, inclusive, de CPI’s como a do futebol.
Pra finalizar os parágrafos de exemplos, vamos de Eduardo Cunha. O próprio nome do parlamentar fala por si só: o achacador mor (roubando a expressão do Ciro). Cunha é a encarnação de tudo de ruim que temos na política: cínico, arrogante, impune e indecente. Parece não ter medo de nenhum ataque que venha por meio de provas irrefutáveis sobre os possíveis crimes que ele já cometeu E pior: utiliza o cargo que tem para poder se defender e tentar atacar as pessoas que podem (e devem!!) lhe fazer pagar pelo o que faz.
A título de ilustração, Cunha chantageou a presidenta Dilma as claras para que a mesma não reconduzisse o Janot (o mesmo procurador que reinterpretou a CF88 e mandou prender o Delcídio) e mesmo assim continua como terceira opção na sucessão presidencial e utilizando o cargo para obstruir a votação contra ele mesmo no conselho de ética da casa!
É bom ver a justiça nacional finalmente derrubar o muro da impunidade para poderosos que tanto assolou nossa cultura. Todavia é importante ficarmos atentos pois não chamamos corrupção de câncer atoa: ou cortamos tudo de uma vez e nos curamos, ou arriscamos fazer essa retirada de forma grosseira e viciada e deixar a doença se espalhar de novo e voltar ainda pior!
Tadeu Porto é diretor do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF)