por Carlos Eduardo, editor-assistente do Cafezinho
Engraçado como a grande imprensa brasileira adora dizer que o “Petrolão” é maior caso de corrupção da história do Brasil. Ou seus jornalistas são muito ruins de conta, ou se trata de pura má-fé. Nem vou entrar aqui no mérito dos escândalos das privatizações do Governo FHC, ou relembrar o caso do Banestado, dois exemplos que superam e muito os valores do “Petrolão”.
Pois vejam só esta história absurda.
Entre 2007 e 2013, 30 operadores de bancos estrangeiros que atuam no Brasil conspiraram para influenciar as taxas de câmbio do real em relação ao dólar, com o objetivo de destruir a indústria nacional e prejudicar nossas exportações, além é claro de obter lucros fáceis
Estima-se que operação fraudulenta tenha ocasionado um prejuízo US$50 bilhões à economia ao longo de seis anos. Se convertermos os valores para reais, na cotação atual, teremos um desvio de R$200 bilhões, ou dez vezes os valores desviados no “Petrolão”.
Os membros do esquema usavam uma plataforma de chat eletrônico da Bloomberg e ainda tiveram a cara de pau de nomear os grupos como “A Máfia” e “O Cartel”, certamente convictos da impunidade por seus atos. E o pior de tudo é que a Associação Brasileira de Comércio Exterior acredita que o país tenha deixado de criar dois milhões de empregos por causa dessa manipulação da banca internacional.
Abaixo segue entrevista da agência russa Sputnik com o empresário José Augusto de Castro, presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior.
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Comércio Exterior brasileiro se junta ao CADE em atuação contra bancos internacionais
Do Sputnik News
No início de julho deste ano, o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica divulgou a instauração de processo investigativo contra 15 grandes bancos com sede no exterior e contra 30 pessoas físicas. A acusação: “suposto cartel de manipulação das taxas de câmbio envolvendo o real e as moedas estrangeiras”. O processo, segundo o CADE, é o mesmo adotado nos Estados Unidos, na Suíça e no Reino Unido.
As instituições financeiras sob investigação do Conselho brasileiro são: Barclays, Citigroup, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC, JPMorgan, Bank of America, Merrill Lynch, Morgan Stanley e UBS. Também estão sob investigação o Banco Standard de Investimentos, Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Nomura, Royal Bank of Canada, Royal Bank of Scotland e Standard Chartered, além de 30 pessoas físicas.
Segundo o CADE, não havia, na época da instauração do processo, indícios de envolvimento de bancos brasileiros nesta manipulação do câmbio.
A tática era valorizar a moeda brasileira com o claro objetivo de baratear as importações e prejudicar a receita com as exportações de produtos nacionais.
Alguns analistas avaliam as perdas econômicas em 50 bilhões de dólares, além de 2 milhões de empregos que deixaram de ser criados.
A AEB está acompanhando a evolução dos fatos. Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o empresário José Augusto de Castro, presidente da Associação, disse que ao final do processo os empresários do comércio exterior e a entidade que os representa pretendem reunir as informações disponíveis e adotar as medidas cabíveis, de ordem judicial, para buscar a reparação pelos danos sofridos.
Sputnik: Há quanto tempo a AEB – Associação Brasileira de Comércio Exterior está se mobilizando contra essas manobras dos grandes bancos internacionais de manipulação da moeda brasileira?
José Augusto de Castro: No final do mês de junho nós tomamos conhecimento de que poderia ter havido uma valorização do real no período entre 2008 e 2012, e começamos a avaliar o que de fato ocorreu, porque não temos como saber o que está ocorrendo. Nós só sentimos os efeitos da valorização do real, que tornou as exportações brasileiras muito caras e as importações muito baratas. Ocorre que o processo que existe hoje no CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica é conduzido em segredo de Justiça. Após as poucas informações que foram divulgadas, nós começamos a acompanhar. Mais tecnicamente falando, houve um período em que o volume de negócios através das operações de hedge – são os derivativos – tiveram um crescimento muito forte, e infelizmente a maioria dessas operações caminhava para tornar o real valorizado, ou seja, tornar o real mais barato. Isso fazia com que a exportação ficasse muito mais cara quando tivesse que ocorrer. Como consequência, nos últimos cinco anos nós falamos muito aqui – nós o Brasil como um todo – do processo de desindustrialização do país, do processo de transferência de linha de produção do Brasil para o exterior. A quantidade de empresas exportadoras dobrou e em contrapartida as empresas exportadoras diminuíram, nós passamos a ter crescente déficit na conta de manufaturados, um conjunto de fatores negativos. E, claro, a origem disso tudo era a taxa de câmbio.
JAC: Na verdade o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior não tem as informações, porque ele não acompanha as operações. Ele tem a taxa de câmbio, mas, como o câmbio é flutuante, pode subir ou descer. O Banco Central, em princípio, tem obrigação de acompanhar. Alguns dados que são divulgados hoje, nós vemos que são dados que chamariam a atenção: o real passou a ser a segunda moeda mais negociada no mundo, somente atrás dos Estados Unidos; o volume de operações no mercado futuro passou a ser cinco vezes o volume de operações no mercado à vista. O normal é ter um equilíbrio ou o mercado à vista ser até um pouco maior do que o mercado futuro. Agora, depois do fato passado, nós passamos a verificar. Mas nós, do setor empresarial, não temos como saber, em detalhes, o quanto está sendo negociado e, principalmente, o que é de uma operação ou da outra. Os dados foram surgindo a partir da avaliação feita pelo CADE e que vem a público, e nós começamos a tomar conhecimento.
S: A quem beneficiariam essas manipulações da moeda brasileira?
JAC: Basicamente aos bancos que fizeram as operações, porque geraram lucros muito altos para eles, porque além do lucro da aplicação no mercado financeiro havia a diferença de taxa de câmbio: quanto mais valorizado o real, maior seria o lucro desses bancos. São bancos de peso. O que eu acho – é a minha opinião, não é uma afirmação – que começou a chamar a atenção foi porque nos EUA e na Europa, especificamente na Inglaterra, houve também esse processo, e os bancos fizeram um acordo, nos EUA e na Inglaterra, em torno de 5 bilhões de dólares. Cada um dos bancos pagou essa quantia em cada país. E o levantamento que foi feito nos EUA, na investigação, os próprios EUA sugeriram que possivelmente o Brasil poderia ser vítima do processo. Acho que a partir daí o CADE começou a avaliar, e depois que um determinado banco fez acordo de leniência admitindo que o que ocorreu foi de fato uma manipulação cambial. Como o processo corre em segredo de Justiça, nós estamos aguardando que acabe o prazo de apresentação de defesa pelos bancos para, a partir daí, começarmos a ter acesso e acompanhar os processos.
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Relembre o caso
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Superintendência do Cade investiga cartel na manipulação de taxas de câmbio
da Assessoria de Comunicação do CADE, em 02 de julho de 2015.
A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade abriu, nesta quinta-feira (02/07), processo administrativo para investigar suposto cartel na manipulação de taxas de câmbio envolvendo o real e moedas estrangeiras. Também será apurada a manipulação de índices de referência de mercado de câmbio, tais como o do Banco Central do Brasil (PTAX), do WM/Reuters e do Banco Central Europeu.
As empresas investigadas no processo (PA 08700.004633/2015-04) são Banco Standard de Investimentos, Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Barclays, Citigroup, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC, JP Morgan Chase, Merril Lynch, Morgan Stanley, Nomura, Royal Bank of Canada, Royal Bank of Scotland, Standard Chartered e UBS, além de trinta pessoas físicas.
As supostas condutas anticompetitivas envolveram o mercado de câmbio (em inglês “Foreign Exchange market” ou “FX market”) e as instituições financeiras que operam neste mercado.
No mercado de câmbio são realizadas as operações que se referem à compra de uma moeda em troca de outra. Essas operações têm como base a taxa de câmbio, considerada um preço chave da economia, que influencia desde os níveis de consumo interno de um país, como os níveis de investimento, importação e exportação, além de todas as transações financeiras que a tomem por base. Ainda que o real seja a moeda oficial do país, um número considerável de operações cambiais realizadas por entidades brasileiras também são feitas por meio de moedas estrangeiras, como euro, dólar, libra esterlina, franco suíço, dentre outras.
O mercado de câmbio conta ainda com os índices de referência (ou taxas de câmbio de referência), calculados com base nas taxas de câmbio à vista de mercado e publicados periodicamente por entidades públicas e privadas – tais como o Banco Central do Brasil (PTAX), o WM/Reuters e o Banco Central Europeu – em todo o mundo para pares específicos de moedas. Esses índices de referência são usados como parâmetro por empresas multinacionais, instituições financeiras e investidores que avaliam contratos e ativos mundialmente, entre outros.
Os clientes das instituições financeira que executam operações de câmbio são, dentre outros, todos aqueles agentes que periodicamente necessitam realizar operações de compra e venda de moeda, como bancos, fundos de investimentos, pessoas físicas (investidores, turistas), empresas privadas e entidades governamentais, por exemplo. Quando os clientes desejam realizar transações no mercado de câmbio, as instituições financeiras que oferecem esse serviço concorrem entre si para executar a operação, oferecendo um preço competitivo (taxa de câmbio para compra ou para venda de determinada moeda). As operações de câmbio também podem ser feitas com base nos índices de referência.
Conduta – O parecer da Superintendência aponta que existem fortes indícios de práticas anticompetitivas de fixação de preços e condições comerciais entre as instituições financeiras concorrentes. Segundo as evidências, os representados teriam feito um cartel para fixar níveis de preços (spread cambial); coordenar compra e venda de moedas e propostas de preços para clientes; além de dificultar e/ou impedir a atuação de outros operadores no mercado de câmbio envolvendo a moeda brasileira.
As instituições financeiras acusadas também teriam se coordenado para influenciar índices de referência dos mercados cambiais, por meio do alinhamento de suas compras e vendas de moeda. Foram encontrados indícios adicionais de práticas anticompetitivas de compartilhamento de informações comercialmente sensíveis sobre o mercado de câmbio, como informações sobre negociações, contratos e preços futuros; ordens de clientes; estratégias e objetivos de negociação; posições confidenciais em operações e ordens específicas; e o montante de operações realizadas (fluxos de entrada e saída).
Todas as supostas condutas teriam comprometido a concorrência nesse mercado, prejudicando as condições e os preços pagos pelos clientes em suas operações de câmbio, de forma a aumentar os lucros das empresas representadas, além de distorcer os índices de referência do mercado de câmbio.
As práticas anticompetitivas foram viabilizadas por meio de chats da plataforma Bloomberg – por vezes autodenominados pelos representados como “o cartel” ou “a máfia”. As condutas teriam durado, pelo menos, de 2007 a 2013.
Com a instauração do processo administrativo, os acusados serão notificados para apresentar defesa no prazo de 30 dias. Ao final da instrução processual, a Superintendência-Geral opinará pela condenação ou arquivamento e remeterá o caso para julgamento pelo Tribunal do Cade, responsável pela decisão final.
Leniência – A investigação teve início a partir de um acordo de leniência celebrado com a Superintendência-Geral do Cade e o Ministério Público Federal. Por meio da leniência, instituto previsto na Lei 12.529/11, um participante de cartel denuncia o ilícito do qual fazia parte, aponta os demais envolvidos e se compromete a colaborar com as autoridades na apuração do caso, em troca da extinção ou redução da punibilidade.