Descomemorar é preciso: Petrópolis não saiu ilesa

Por Rafaela Elisiario*

Em abril do ano de 2014, diversos eventos aconteceram em
descomemoração aos cinquenta anos do golpe civil-militar no Brasil. Os
movimentos sociais uniram-se em torno da realização de diversas
atividades que relembrassem, de forma crítica e séria, o ataque contra
a democracia brasileira que se configurou com a implantação do regime
militar de 1964. 

Desde a redemocratização do Brasil, até a luta pela
investigação dos crimes de Estado cometidos durante o período de
repressão, assim como, o resgate desse tema que, muitas vezes, é
varrido para debaixo dos tapetes, tem sido pauta permanente de
diversas organizações ligadas aos Direitos Humanos, como também, de
organizações de familiares atingidos pelas ações ditatoriais.

A Comissão Nacional da Verdade, criada através da Lei 1228/2011 e
instituída em 16 de maio de 2012 veio, ainda que tardiamente, apurar
as graves violações dos Direitos Humanos ocorridas nos momentos
políticos de cerceamento das liberdades democráticas coletivas e
individuais. Períodos onde os setores repressivos utilizaram-se de
inúmeros modos e aparelhos de tortura, inclusive contra crianças, para
banir qualquer movimentação que se mostrasse contrária ao regime
vigente.

Todo esse panorama de repressão foi orquestrado pela Escola
Superior de Guerra (ESG), que a partir da década de 60 além de ser a
principal formadora de quadros para ocupar as funções nos governos
militares, também gerou a ideologia hegemônica do regime muito
influenciada pela Doutrina de Segurança Nacional (DSN).

As marcas deixadas pela ditadura civil-militar também perduram no
interior de nosso país, como em Petrópolis. Exemplo latente dessa
afirmação foi a existência da “Casa da Morte”, localizada na Rua
Arthur Barbosa, no bairro Caxambu. A Casa ficou conhecida como um dos
piores porões da ditadura pelo seu histórico de graves torturas e
mortes cometidas naquele local durante a década de 70. Todas as
sessões de tortura foram facilitadas pelo fato da localização afastada
e existência de poucos vizinhos na época.

A Casa da Morte era um centro clandestino que funcionava como órgão da
estrutura repressiva do regime militar, esses centros eram ligados aos
órgãos de inteligência e repressão do Exército, como é o caso da sigla
CIE- Centro de Informações do Exército. Esses dados deixam claro que
Petrópolis não saiu ilesa do período repressivo brasileiro, aqui os
aparatos de repressão também demonstraram a face mais cruel e violenta
promovida pela ditadura.

A desapropriação da Casa da Morte e a transformação desta em um
Memorial é o mínimo que se pode fazer como resposta simbólica às
barbáries cometidas naquele espaço. Essa movimentação contribui também
para o resgaste de uma história que, não à toa, é constantemente
invisibilizada, assim como, para o avanço de uma memória histórica
coletiva das lutas do povo brasileiro.

Passadas as descomemorações dos 50 anos do golpe militar, para além de
toda luta institucional, o desafio é continuar promovendo espaços que
tornem pública a discussão acerca desse tema, envolvendo cada vez mais
pessoas e democratizando o acesso à essas informações. A consolidação
da democracia em nosso país perpassa pelo entendimento de todo legado
repressivo que uma ditadura de 21 anos pode ser capaz de enraizar, em
suas mais diferentes formas, na sociedade.

*Rafaela Elisiario é historiadora e dirigente da UJS em Petrópolis.

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