Imprensa insiste em distorcer alta do dólar

Por Carlos Eduardo, editor assistente do Cafezinho.

De tanto repetir a mesma falácia várias e várias vezes, a grande imprensa consegue transformar um erro grosseiro de economia em verdade absoluta.

Dizer que o dólar alcançou sua maior cotação desde o início do Plano Real sem deflacionar a moeda, simplesmente não faz sentido algum.

Qualquer estudante de Economia sabe perfeitamente que os valores nominais não condizem com a realidade, e devem sempre ser atualizados em valores reais.

O dinheiro varia no tempo. R$ 100 reais hoje não são iguais a R$ 100 reais daqui há um mês. Assim como a cotação do dólar em R$ 4 em 2002 não é igual a cotação de R$ 4 em 2015.

Os números precisam ser corrigidos pela inflação. Este é um dos princípios mais básicos da matemática financeira.

Curioso como a imprensa repete o mesmo erro que já havia cometido anteriormente em julho deste ano, quando afirmou que a cotação de R$ 3,36 era a mais alta em 12 anos.

Errado.

Para a afirmação ser correta, o dólar em julho deveria custar mais de R$ 7, como bem apontou na época o jornalista Rodolpho Gamberino, da TV Gazeta (veja o vídeo).

De lá pra cá, ou os editores de economia da grande imprensa não aprenderam nada, ou estão agindo de má-fé. Para o dólar alcançar o maior valor da história do Plano Real, em valores atuais, teria que ser superior a R$ 8 e ainda estamos longe disso.

Para entender melhor o assunto, recomendo a leitura da Coluna Econômica de Luís Nassif, logo abaixo.

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A miopia na análise dos recordes do dólar

por Luis Nassif, no GGN

Um dos vícios mais recorrentes dos jornais é a síndrome do “maior desastre”. Consiste em comparar um indicador ruim com o pior indicador anterior. Tipo: foi o pior desempenho desde o ano tal.

Não há receita para a manchete. Ás vezes se submete o indicador à tortura das comparações irrelevantes. Tipo, é o pior indicador desde 2012, ou mais negativo dos últimos 6 meses, períodos estatisticamente irrelevantes.

Outra impropriedade frequente são as manchetes sobre as cotações do dólar, comparando com outros períodos sem deflacionar. Manchetes tipo “o dólar atinge a maior cotação da era do real” tem tanto valor quanto dizer que os automóveis de hoje têm preços nominais muito mais altos do que 20 anos atrás. Comparar a cotação atual do dólar com o valor nominal do dólar em períodos passados tem o mesmo significado que comparar preços de geladeira, do feijão ou qualquer outro produto de consumo.

O indexador utilizado para calcular a cotação efetiva do dólar é o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Ampliado). Corrige-se o real pela IPCA, o dólar pela inflação dos EUA e faz-se a conversão para se chegar ao câmbio efetivo.

Efetuando essas contas, chega-se à conclusão de que o dólar a R$ 4,00 em setembro de 2015 tem o mesmo valor real do dólar de R$ 0,85 em setembro de 1994, isto é, após a apreciação de 15% imposta pelo real.

O alarido atual é ridículo. Em outubro de 2002, configurada a vitória de Lula, o valor efetivo do dólar equivalia a um dólar atual na casa dos R$ 8,76.

Em janeiro de 1999, a maxidesvalorização jogou o dólar para o equivalente a R$ 4,37 de agora.

De janeiro de 1999 a setembro de 2005, não houve um mês em que o dólar médio tenha sido inferior a R$ 4,00.

Mesmo no período de maior apreciação do real – no primeiro governo FHC – a cotação real do dólar esteve por volta de R$ 3,50.

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Esses saltos não se deveram à deterioração dos fundamentos da economia, mas a dúvidas sobre o cenário político. Depois do tiroteio da campanha de 2002, na qual analistas terroristas chegaram a prever a invasão do Brasil pelas FARCs – e houve quem acreditasse, como foi o caso dos leitores da Veja – a lagoa ficou propícia para pegar lambaris. Investidores profissionais pescavam lucros em cima do pânico dos lambaris.

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O que movimenta o dólar, agora, são essencialmente dúvidas fundamentadas sobre a crise política, decorrentes da grande sucessão de erros de Dilma Rousseff.

Só que nenhum desses erros, até agora, comprometeu os fundamentos da economia. Criou problemas fiscais, acentuou a recessão. Se o Banco Central persistir em trancar o crédito e manter os juros nas alturas, pode-se ter um problema concreto mais à frente, o chamado efeito engarrafamento – no qual empresas que vinham em velocidade, de repente descobrem que não existe mais estrada pela frente, brecam de uma vez provocando o abalroamento das que vêm atrás.

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Ainda não se chegou a esse quadro.

Há o risco iminente do Congresso derrubar os vetos de Dilma à farra de gastos. Nesse caso, Dilma seria jogada inapelavelmente no corner.

Por outro lado, há a possibilidade de um choque de bom senso da parte do Senado e da Câmara, motivado pela antevisão do caos. Nesse caso, a crise se esvaziaria rapidamente e o dólar voltaria para níveis mais adequados, por volta de R$ 3,50.

A pior das hipóteses aconteceu várias vezes, como no início de 1999, quando FHC se viu confrontado com uma rebelião de governadores de estados quebrados. Parecia que o mundo ia se acabar. Mas, como diria Assis Valente, o tal do mundo não se acabou.

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