Análise Diária de Conjuntura – 17/09/2015
A Agência Câmara informa que Eduardo Cunha recebeu o pedido de impeachment de Helio Bicudo, o “fundador do PT” que a oposição tem instrumentalizado para dar seguimento ao golpe. É curioso como a grande imprensa, de repente, passou a dar grande importância à Bicudo, a ponto de suas opiniões se tornarem manchetes de jornal.
Dê-se o mérito à Folha, que apoia disfarçadamente o impeachment, por relatar os métodos a serem adotados pelos conspiradores (aliás, o próprio Painel da Folha de hoje chama o movimento golpista de “conspiração”):
Segundo o jornal, a oposição, liderada por Cunha (que apenas fingirá não apoiar o impeachment, mas ele está por trás de quase tudo), fará o seguinte.
As três CPIS da Câmara controladas por Cunha – Petrobrás, BNDES e Fundos de Pensão – devem colocar votação simultânea requerimentos bombásticos, com forte efeito midiático, como a convocação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O objetivo é forçar os deputados governistas a se concentrarem nas comissões de inquérito, afastando-se do plenário, longe da votação do recurso de impeachment, que precisa dos votos da maioria simples para ser aprovado.
Em seguida, vem a parte mais difícil para a oposição: para que seja aberto o processo de impeachment e Dilma provisoriamente afastada, a oposição terá que obter 342 votos dos 513 deputados.
O golpômetro segue estável, apesar das notícias sobre o impeachment, porque elas apenas repetem os fatos da véspera.
A notícia mais comentada das últimas 24 horas, no entanto, foi a intervenção de quase cinco horas de Gilmar Mendes, ministro do STF, no plenário da corte, antes de apresentar seu voto contrário à proibição de doações empresariais para campanhas políticas.
Mendes extrapolou todos os limites razoáveis para um juiz. Na verdade, ele se colocou como o anti-juiz por excelência: parcial, raivoso, destemperado.
Pôs a culpa de toda a corrupção do país num só partido, o PT, claro, que procurou criminalizar de todas as maneiras. Daí sobrou para todo o campo progressista, incluindo os blogs.
Gilmar acredita num tipo de democracia onde só ele tem razão, só ele tem voz. Ele é uma das maiores vergonhas da história do judiciário brasileiro, portando-se exatamente como um juiz jamais deveria se portar.
Ele só age assim, naturalmente, porque é blindado na grande mídia. Sua raiva dos blogs é porque somente aí é criticado. A grande mídia o bajula, mesmo sabendo que ele infringe todos os códigos de ética, todas as leis, ao se portar como líder de oposição, o que é expressamente vedado pela Constituição.
É incrível que, após sua manifestação, ainda se ache em condições de julgar as contas da presidenta Dilma.
Entretanto, a sua histeria teve um efeito de gol contra em setores mais esclarecidos da opinião pública, porque ficou bem claro que Gilmar não julga com objetividade, e sim tomado por um ódio político doentio.
De um lado temos a judicialização da política e de outro a politização do judiciário.
Outro exemplo: setores do Ministério Público agora defendem que procuradores possam se candidatar a cargos políticos.
Dá a impressão que o MP efetivamente quer assumir o poder no Brasil.
Recentemente, a procuradoria geral da república fez um vídeo, para ser exibido às autoridades italianas, no qual se afirma que o MP é o poder principal do país – tudo para convencer a Itália a extraditar Pizzolato.
Aliás, há muito tempo não se vê tanto recurso gasto para perseguir uma pessoa, que de resto é acusada injustamente, visto que não poderia ter participado do desvio dos recursos do fundo visanet. Não participou, nem sequer houve o desvio. E ainda foi vítima do ocultamento, por Joaquim Barbosa, então juiz responsável pela Ação Penal 470, de documentos que poderiam lhe inocentar.
O Brasil é um dos países, na sua faixa de desenvolvimento, com menor índice de resolução de homicídios; é também um dos países com as maiores taxas de evasão fiscal do mundo; mas o MP está preocupado apenas em extraditar Pizzolato, um réu inocente do crime que se lhe imputou.
O procurador chefe da Lava Jato deu palestra para dondocas dos Jardins, convidado por um desses movimentos golpistas, e falou que a Lava Jato irá se alastrar…
Não satisfeitos em terem quebrado as maiores empresas de engenharia do país, e paralisado o setor do petróleo justamente no momento em que os preços da commodity caíram para o menor nível em muitos anos, os procuradores da Lava Jato agora querem repetir sua truculência protofascista para outros setores da economia.
Tudo isso vai na linha da fascistização da sociedade, um processo que, sintomaticamente, a grande imprensa não denuncia – e não denuncia porque ela está na origem dele.
Caso raríssimo na grande imprensa, intocável na Folha pelo tempo de serviço prestado, Janio de Freitas dá a linha narrativa mais inteligente para entendermos a atual conjuntura. É um recado sutil à esquerda, para que esta enfrente a situação com a astúcia que a complexidade do momento pede. Trecho:
(…) Também por isso, mas não sobretudo por isso, Dilma impôs às duras discussões sobre cortes no Orçamento, contra a quase indiferença na equipe econômica, certa imunidade de vários programas à tesoura. Como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, assim depois destacados, entre outros, pelo próprio Levy.
Se não conduzido pelo atual governo, o “ajuste” será no mais puro e duro neoliberalismo. Caso o governo ficasse com o PMDB, estaria minado por uma falta de quadros próprios que o obrigaria a sujeitar-se às exigências direitistas do PSDB. O PMDB de hoje é numeroso e vazio. Mercantilista e vazio. Amorfo e vazio.
Caso o governo ficasse com o PSDB, por uma eleição precipitada, contaria com serviços bem pagos do PMDB, como foram os do PFL no governo precedente dos peessedebistas. Para o “ajuste” de retorno ao Brasil que começara a deixar-se superar, aos 500 anos de história.
Em outros termos, Freitas defende Dilma e seu ajuste, e explica que o ajuste terá de ser feito sem Dilma ou com Dilma, porque não há nenhuma força política hoje capaz de deter a violência da máquina econômica. Com Dilma, o ajuste será mais suave, preservando garantias e direitos. Com o PSDB, caso este viesse a assumir o poder numa “eleição precipitada” (leia-se golpe), o ajuste seria o do retorno ao Brasil iníquo, violento e desigual dos últimos 500 anos, um Brasil que começávamos a superar.
(A foto que abre o post é real, infelizmente. É uma das faixas empunhadas nas marchas coxinhas).