Análise Diária de Conjuntura – 14/09/2015
O momento é de ler Maquiavel. O florentino ensina que um aceno de paz nem sempre acalma o adversário. Muitas vezes ocorre o contrário.
Por favor, leiam esse trechinho, do capítulo décimo quarto, livro segundo, do Comentários sobre a Primeira Década de Tito Lívio. É uma importante lição política.
Aquele a quem tivermos cedido, por manifesta covardia, longe de ficar satisfeito, exigirá de nós outras concessões, aumentando suas pretensões em função do desprezo que lhe teremos inspirado. Por outro lado, só encontraremos defensores indiferentes para nossa causa, porque lhes pareceremos fracos, ou pusilânimes.
Contudo, se no momento em que percebermos as intenções do adversário reunirmos nossas forças, ainda que inferiores, faremos com que o inimigo comece a nos ver com respeito. Os outros príncipes nos respeitarão mais; e algum poderá oferecer-nos o seu apoio, que teria negado se nos visse abandonar a própria defesa.
O editorial da Folha, um ultimato ameaçador, mostra que os golpistas perderam a modéstia. Querem usar a conjuntura desfavorável ao governo (por erros políticos do mesmo, admito), para impor, à força, uma agenda ultra-liberal, que não deu certo em lugar nenhum do mundo.
Todos os países ricos viveram, nos últimos dez anos, crises financeiras gravíssimas, que procuraram solucionar ampliando os gastos do Estado, nacionalizando empresas falidas (nos EUA, foi a General Motors; na Islândia, país super liberal, vários bancos foram estatizados), aumentando a dívida pública.
Tudo bem que não podemos fazer o mesmo, mas é curioso que logo aqui, onde temos imensos contingentes sociais vivendo no limiar da extrema pobreza, em situação de extrema insegurança alimentar, os jornalões não encontrem nenhuma palavra voltada para a questão social.
A ordem é só cortar gastos sociais. Gastos com juros, ninguém fala em cortar. Aumentar o rigor sobre a evasão fiscal, outra iniciativa estranhamente alheia às preocupações da mídia.
Na Europa, as medidas contra evasão fiscal continuam avançando. O uso do dinheiro vivo está sendo cada vez mais restringido, para que o Estado possa controlar melhor a circulação monetária.
Os EUA não ficam atrás. As cadeias americanas estão cheias de sonegadores de impostos. A pátria de Thomas Jefferson financiou, por décadas, a sua infra-estrutura e seus programas sociais com impostos sobre herança que passavam de 80%. Hoje esse valor médio caiu, para menos de 50%, ainda muito acima do Brasil, mas isso apenas depois do país financiar a sua infra-estrutura.
No Globo, vejo um editorial contra a Constituição de 88, acusando-a de ser excessivamente social. Ou seja, no momento em que o país clama por melhores serviços públicos, a nossa mídia se posiciona do outro lado e prega a redução do Estado.
Trecho do editorial do Globo desta segunda-feira:
A Constituição seguiu essa tendência nos gastos sociais. Caberia unicamente ao Estado eliminar a pobreza. Foi assim que, em mais ou menos uma década, entre governos tucanos e petistas, a carga tributária deu um salto de dez pontos percentuais, de 25% para 35% do PIB. Estima-se que esteja hoje na faixa de 37%, uma enormidade, se comparada com outras economias emergentes. Chega mesmo a rivalizar com a soma dos tributos de sociedades desenvolvidas —, mas estas dão em troca ao contribuintes serviços básicos de boa qualidade. Não é o caso do Brasil.
O editorial é uma falácia, como aliás quase tudo que vem de uma imprensa inacreditavelmente descomprometida com os problemas da desigualdade, e adepta de um liberalismo de almanaque que nunca existiu em lugar nenhum do mundo. O capitalismo no mundo desenvolvido sempre foi dependente do Estado. Ainda é. Os trilhões de dólares que os governos ricos enterraram em seus sistemas financeiros, há apenas alguns anos, não eram verba do Estado?
E se o Brasil não dá “em troca aos contribuintes serviços básicos de boa qualidade” com a carga tributária atual, como poderia melhorar com menos dinheiro? Além do mais, a mídia manipula descaradamente a questão tributária ao não diferenciar carga tributária de arrecadação fiscal per capita – esta última é muito baixa no Brasil.
Esquece-se que o Brasil precisa de carga tributária alta porque ainda está construindo a sua infra-estrutura. E, à diferença dos países ricos, construímos tudo com nosso dinheiro, não colonizando ou invadindo outros países, ou fazendo guerras, nem patrocinando golpes de Estado, como até hoje fazem os EUA.
As guerras dos países ricos não são contabilizadas, pelos liberais de almanaque, como gasto público?
O Globo prega o fim do Estado indutor. Ótimo. Mas qual Estado mais indutor do que aquele que invade outro país, ou que financia golpes ou que pratica espionagem maciça sobre os negócios e a política de outro país?
Sempre que leio os textos de nossos liberais de almanaque, acometem-me risos nervosos. Eu me considero infinitamente mais liberal do que todos eles. Só que eu acho que o liberalismo deles é mentiroso e infantil.
As liberdades econômica, política, intelectual, para existirem, precisam de um Estado forte, que as protejam dentro do marco de uma constituição democrática e livre. A nossa mídia e os liberais de almanaque falseiam o sentido de liberdade, confundindo-a com a hegemonia do mais forte.
Como é possível achar que a comunicação do Brasil, dominada por meia dúzia de famílias cujas fortunas foram construídas na ditadura, pode ser livre ou democrática?
Associar o Brasil à Grécia é mentir. Somos lideranças regionais, seremos a quinta economia do mundo. Temos uma população de 202 milhões de pessoas. Temos água, agricultura, petróleo, minérios, indústrias, grandes cidades.
O governo continua errando ao se deixar pautar pela mídia, e pela agenda negativa. Corte de despesas se faz, mas em silêncio, sem alarde. Não é agenda política.
Em momento de aperto financeiro, o governo precisa investir em inteligência – o insumo mais revolucionário e mais barato do mundo. Financiar projetos inovadores de tecnologia da informação, baratear as comunicações, investir em discursos inteligentes, aprimorar a educação do povo através da cultura, produzir análises públicas mais transparentes confiáveis.
Informar a população, hoje refém de uma mídia decadente, golpista e mentirosa!
Dilma tem de se associar a agendas positivas. A única maneira de trazer estabilidade a seu governo, é oferecendo um plano de saída para a crise.
A crise tem de ser olhada como oportunidade!
Oferecer grandes projetos não custa nada, Dilma. O país precisa voltar a acreditar em si mesmo. Sem fé em si mesmo, não haverá investimento, sem investimento não haverá desenvolvimento.
O país voltará a ser feliz. Claro que vai! As novas grandes lideranças políticas serão aquelas que mostrarão como e porque.
Como escreveu Maiakosvki: para o júbilo, o planeta está imaturo; é preciso arrancar alegria ao futuro!