Fica Minc: a cultura não pode parar
Por Theófilo Rodrigues, colunista eventual do Cafezinho.
O anúncio de que o governo federal pretende acabar com cerca de dez ministérios até o fim de setembro, reorganizando sua estrutura administrativa e fiscal, gerou um verdadeiro clima de suspense no ar seco de Brasília.
Como alguns setores corporativistas minoritários do funcionalismo público já haviam se manifestado favoravelmente pela incorporação do Ministério da Cultura ao Ministério da Educação, um mal-estar geral no âmbito dos movimentos sociais surgiu: será que o Ministério da Cultura (Minc) seria um dos dez excluídos?
Seria no mínimo estranho se isso ocorresse justamente com o ministério melhor avaliado pela sociedade civil organizada que apoiou a campanha da presidenta no ano passado.
Durante o primeiro mandato de Dilma o Minc patinou. Primeiro com Ana de Hollanda e depois com Marta Suplicy, parecia que toda a originalidade formulada por Gilberto Gil, Celio Turino e Juca Ferreira no governo Lula havia sido deixada para trás. Com Hollanda e Suplicy a política pública que era até então pensada de baixo para cima voltara a ser construída por poucas mãos em gabinetes do Minc.
Dilma só percebeu que algo caminhava mal no setor no fim de seu governo em 2014. Durante um importante ato público de apoio dos artistas e produtores culturais para sua campanha a presidenta teve contato com a realidade. Quando Marta Suplicy entrou naquele theatro Casa Grande lotado centenas de pessoas passaram a gritar um único nome: Juca, Juca, Juca!
Dois meses depois Dilma anunciou a volta de Juca Ferreira como Ministro da Cultura de seu governo. E o Minc voltou a ser o que era no governo Lula: um laboratório de inovação democrática, de reelaboração de narrativas e experimentação de novos fazeres culturais.
Tendo como Secretário Executivo o jornalista João Brant – na prática um vice-ministro – o Minc passou a ocupar um espaço vazio que durante os treze anos de governo do PT havia sido deixado às mínguas. Reconhecido militante da democratização da mídia com atuação no Coletivo Intervozes, Brant trouxe seu tema de militância para o centro do palco. A comunicação alternativa e popular tornou-se eixo estratégico das políticas públicas do ministério, caso do recém lançado edital de Pontos de Mídia Livre.
Com Ivana Bentes e Alexandre Santini na Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural o Minc voltou a priorizar o estabelecimento dos Pontos de Cultura. Mais do que isso, formularam uma interessante inovação institucional com a possibilidade da autodeclaração dos Pontos de Cultura para que toda a sociedade, de baixo para cima, possa participar ativamente da rede cultural do país.
Com Juana Nunes, Randal Farah e Ismael Cardoso na Secretaria de Educação e Formação Artística o Minc passou a integrar educação e cultura como até então não conhecíamos. Incorporaram imediatamente o lema Pátria Educadora do governo federal desenvolvendo parcerias criativas com o MEC.
Mesmo tendo um baixíssimo orçamento o Minc demonstrou em poucos meses que pode ser feito muito com pouco. Tornou-se assim o melhor exemplo de como deve ser exercida a política pública. E por isso o Minc não pode acabar.
Ademais, dos 39 ministros da Esplanada apenas um traz consigo o “selo Mujica de qualidade”. De todos os ministros de Dilma Juca Ferreira é o único que tem a capacidade de lotar auditórios de universidades com jovens e ser aplaudido do início ao fim como quem rege uma orquestra. Se o núcleo dirigente do Planalto não conseguiu perceber isso até os dias de hoje, então talvez seja merecedor da impopularidade que possui.
Theófilo Rodrigues é cientista político e coordenador do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé – RJ.
***
PS Cafezinho: Há um eixo fundamental nessa discussão que o Theo não abordou. É o conceito de soft-power. Sem poderio militar, o Brasil precisa se impor no mundo através da diplomacia e da cultura.
A ilustração do post é do filme Ao Sul do meu Corpo, de Paulo Cezar Saraceni, um dos mais belos filmes que eu já assisti.