Muito boa essa entrevista de Renato Meirelles, presidente do Data Popular, ao El País. Vale a pena ler na íntegra.
Com delicadeza, Meirelles deixa claro que, na sua opinião, a imprensa tem manipulado os dados sobre o apoio ao impeachment.
A população está confusa e insatisfeita, mas não quer derrubar uma presidenta que ela mesmo elegeu há tão pouco tempo.
O mais interessante, na entrevista, é que Meirelles critica o governo pelas mesmas razões que a blogosfera tem apontado desde a vitória eleitoral de Dilma em outubro de 2014: a falta de comunicação.
Meirelles vai mais longe e acusa a falta de comunicação de estar ajudando a piorar o cenário de crise.
“(…) Governo não fez nada para explicar, por exemplo, o ajuste fiscal e a crise econômica. A última passeata [de abril] teve menos gente do que a penúltima [março] e isso deixou uma sensação de que as coisas estavam resolvidas para o Governo. E não estavam, como não estão resolvidas desde 2013. Pensar no que levou as pessoas a reelegerem este Governo é fundamental pra entender o que a população quer e acredita. E o Governo tinha que ter aprendido. ”
Em vários outros trechos, Meirelles deixa transparecer a mesma perplexidade de todos nós: por que o governo não explicou devidamente o ajuste fiscal, por que pintou o combate às fraudes no seguro desemprego como ajuste fiscal, por que abandonou o povo aos abutres da mídia?
Agora até Renan Calheiros, presidente do Senado, parece estar à esquerda do governo, pedindo pelo amor de Deus para o governo interromper um pouco o envio de medidas negativas, recessivas, ao congresso, e mostrar à população alguma lei social nova, dar algumas pautas positivas ao senado e à câmara.
O presidente da China acabou de vir ao Brasil, anunciando a criação de um fundo de mais de R$ 200 bilhões para investimento em infra-estrutura. Cadê o desenvolvimento dessas notícias? A mídia é aquilo que já sabemos: apocalíptica, desonesta, colonizada e golpista. Mas o governo também não parece fazer nada.
Não era hora de Dilma lançar um PAC da Comunicação?
Meirelles observa ainda que o governo lê mal a conjuntura: o fato das manifestações pelo impeachment terem diminuído de março para abril fez o governo descansar, quando deveria ter aproveitado a oportunidade para mudar profundamente a sua comunicação.
A mesma coisa vale para agora: diz-se que a mídia atenuou seus ataques, e aí Dilma, enganada por esses estratagemas, posterga medidas necessárias para melhorar a comunicação e a gestão do governo, como uma grande e profunda reforma ministerial.
É incrível como o governo prefere estar sempre na retaguarda. Nunca adota iniciativas para estar à frente dos acontecimentos, pautando a mídia e oferecendo novidades.
A imagem de Dilma Rousseff, por sua vez, foi tratada com um desprezo inacreditável. Depois de uma campanha altamente polarizada em torno da mística do coração valente, a primeira nomeação ministerial é Katia Abreu, com quem Dilma fica circulando por aí o tempo inteiro. Esse tipo de coisa foi que destruiu, em tempo recorde, a sua popularidade. Além disso, seus discursos são longos, chatos, sem poesia.
Aliás, esta é uma das coisas que mais me choca nos discursos de Dilma. Como são mal escritos! Como são desprovidos daquela poesia fundamental para conferir à Dilma a densidade histórica que ela mereceria: a responsável pelo início e conclusão de importantes obras de infra-estrutura, a criadora de programas revolucionários na educação, ensino técnico e na saúde, a fiadora máxima dos grandes programas sociais, a responsável pelos anos de mais baixo desemprego da nossa história.
Hoje mesmo, a presidenta lançou um programa de infra-estrutura em energia elétrica de R$ 186 bilhões. Este será seu grande legado, a infra-estrutura.
Para cúmulo do desastre linguístico, a presidenta abre suas intervenções com vícios atrasadíssimos de cerimonial, como agradecer a dezenas de autoridades presentes.
Enfim, as críticas estão todas na mesa. Até mesmo Eduardo Cunha, arqui-inimigo do governo, já deu entrevistas para dizer que o governo não se comunica, ninguém mais sabe o que está acontecendo, que obras estão em andamento.
E não adianta dar entrevista à Globo às três horas da manhã. Tem que elaborar uma comunicação criativa, integrada, voltada mais para o futuro do que ao passado.