Um peixe adulto vem nadando e cruza com dois peixinhos adolescentes. O peixe adulto pergunta aos dois: “como está a água?”, mas não espera a resposta e segue em frente.
Os peixinhos se entreolham e um deles pergunta: “O que é água?”
A anedota é contada por David Foster Wallace (foto), em seu livro “Ficando longe do fato de estar meio que longe de tudo” (PDF aqui, página 159), uma coletânea de ensaios reunida por Daniel Galera, um dos maiores entusiastas e introdutores da literatura de Wallace no Brasil.
Wallace, que escreveu o texto para um discurso de paraninfo, tentava provar aos estudantes que o conhecimento serve para adquirirmos consciência do que acontece à nossa volta, uma realidade que não conseguíamos ver pela mesma razão pela qual os peixinhos da anedota não sabem o que é água.
A mesma coisa vale para a política. A maioria das pessoas respira política dia e noite, assim como os peixinhos respiram água, mas não sabe o que é política. Não tem consciência do que ela é realmente, de onde nasce, como funcionam seus mecanismos e quais são as suas consequências.
O peixinho provavelmente só ganhará consciência do que é água após viver momentos difíceis. Se for pescado, por exemplo, e ficar exposto ao tormento da ausência da água. Naqueles poucos minutos antes de sucumbir, o peixinho agonizante talvez reflita consigo mesmo: ah, agora eu sei o que é água!
Os brasileiros (e, na verdade, quase o mundo inteiro) são vítimas da mesma armadilha. De maneira geral, tocamos a vida normalmente com as informações de que dispomos. Quer dizer, o nível das injustiças e arbítrios que fazem parte da nossa vida, a depender da classe a qual pertenço, seguem mais ou menos dentro de padrões reconhecidamente – embora absurdos – normais.
A democracia, com seus trancos, sustos, atrasos, também segue relativamente normal, e após algumas décadas de estabilidade democrática, ela se torna quase invisível.
Só ganharíamos consciência aguda do que seja democracia se sofrêssemos com sua ausência.
Entretanto, através da cultura política, uma coisa que o Brasil ainda teve pouco tempo e oportunidades para desenvolver, podemos entender os perigos e males do arbítrio sem necessariamente tê-lo vivido.
Essa cultura política democrática ganhou força nos anos finais de um regime militar decadente e nos primeiros anos da república nova.
Entretanto, a partir da universalização do sufrágio universal, a imprensa iniciou uma campanha diuturna de criminalização da atividade política.
Não que a política não mereça ser tratada com crítica e denúncias. Merece e precisa. Mas é preciso investir na formação de uma cultura política autenticamente democrática, que não transfira as responsabilidades de tudo para o outro, para a classe política, mas que mantenha o sentido de nossa responsabilidade pessoal.
No mesmo ensaio de Wallace, há outra anedota divertida, um diálogo entre um religioso e um ateu. O ateu conta ao religioso que atravessava uma nevasca terrível, em algum lugar do Alasca, e se viu completamente perdido. Então ajoelhou-se e rezou pela primeira vez na vida, implorando a Deus que o salvasse.
“Então apareceram uns esquimós do nada e me disseram por qual caminho seguir”.
O religioso vê o episódio como prova da existência de Deus. O ateu, não; não faz conexão entre a sua oração e o aparecimento dos esquimós. E pensando bem, segundo a visão de mundo de um ateu, por que deveria fazê-lo?
A situação me parece igualmente adequada para ilustrar os impasses que, em certos momentos, parecem rasgar a nossa sociedade.
Tucanos e políticas vêem a realidade apenas segundos suas próprias óticas. Mas não estão errados. Ao contrário, a democracia bebe a sua força da diversidade à qual, justamente por ser uma democracia, consegue manter em estado de tensão controlada.
Não podemos esquecer, todavia, que foi durante a vigência de regimes constitucionais e democráticos (mesmo que democráticos apenas na aparência), que a humanidade viveu as suas guerras externas e internas mais sangrentas.
Não vivemos, como os Estados Unidos, uma guerra civil entre um norte industrial e progressista, e um sul reacionário e racista, que resultou na morte de 750 mil soldados e um número até hoje não calculado de vítimas civis.
Não vivemos guerras de extermínio, como na Europa.
No entanto, os níveis de violência social e política em nossa sociedade sempre foram muito altos.
Mas as classes dominantes sempre se encarregaram de criminalizar a política.
Sempre procuraram transferir o debate político para as páginas policiais, como fazem hoje, porque é um universo onde o povo não tem voz. Ou até tem voz, mas apenas como massa de manobra.
Nas conspirações judiciais, o povo é usado para chancelar o arbítrio, através da manipulação de suas frustrações.
O capitalismo, através da publicidade e da indústria do entretenimento, produz uma imensa massa de cidadãos frustrados, porque não tem dinheiro para adquirir o carro exibido pelos personagens da novela. E depois a mesma mídia faz com que essa frustração se volte não contra o capitalismo, mas contra os únicos instrumentos democráticos de que dispõe o povo para mudar e melhorar as coisas.
Os executivos e legislativos municipais, estaduais e federais podem ser corruptos, desqualificados e mesquinhos, mas são as únicas instâncias do Estado onde o povo pode escolher diretamente seus representantes, ao contrário do Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal, onde a elite cultiva carinhosamente a sua hegemonia.
Para não ficarmos num debate vago, encerremos o post – para variar! – falando do golpe.
Hoje o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo prestou depoimento à CPI da Petrobrás, que é um dos braços da conspiração midiático-judicial em operação para derrubar a presidenta.
O ministro me lembrou os peixinhos da metáfora de Wallace.
Cardozo parece um daquele personagens tão comuns na história das grandes crises, que parecem ou fingem ignorar as movimentações golpistas que se armam em volta do governo do qual participam.
Uma espécie de Maria Antonieta.
É como se perguntássemos a Cardozo: e aí, ministro, como está o golpe?
E ele – apesar de estar no coração de um processo acelerado de desestabilização do governo federal, de criminalização aguda da política, criminalização dos movimentos sociais, demonização da esquerda, contaminação dos órgãos de repressão com ideologias golpistas, proliferação do ódio e intolerância fascistas – apesar de tudo isso, ele ainda assim responde, atônito: que golpe?
Rodrigo
16/07/2015 - 19h18
Quanta retórica para justificar o injustificável. Impressiona a capacidade de lançar mão de exemplos, metáforas, analogias e todo tipo de artifício para defender o que, tempos atrás, quando era outro o grupo no poder, criticavam indignados.
Me entristece ver pessoas inteligentes usando sua argúcia mental em proveito de interesses podres.
PS: Quanto este blog esta recebendo pelo banner da CEF aí do lado???
Miguel do Rosário
16/07/2015 - 19h50
Bah, a retórica é sua. Respeite a opinião alheia. E pare de mesquinharia quanto à publicidade. Vc faz esse tipo de pergunta para colunistas de grandes jornais, ou só para mim?
Joel Pinheiro Guimarães
18/07/2015 - 11h50
Qual interesse nesse tipo de comentário que nem passa pelo cerne do assunto, mas apenas tenta desqualificá-lo? A conversa do banner é só pra tentar reforçar um argumento já sem nenhum crédito.
Orlando Pereira C Filho
16/07/2015 - 11h26
Mas vamos dizer…
Orlando Pereira C Filho
16/07/2015 - 11h26
E uma Mulher extraordinária e singular da história e na história
Orlando Pereira C Filho
16/07/2015 - 10h42
É simples assim é só vencer as eleições , tendo à frente um líder mundial da estatura de um Lula , um partido popular , alianças sinceras , tenha projetos e programas , pronto e sairás vencendo , vencendo
Henrique Pedro
16/07/2015 - 09h25
Vamos dizer que o governo em questão fosse do PSDB, e o PT estaria na rua com palavras de ordens, como fez com o fora FHC. Nesse caso, essa pagina, e todas as outras governistas, não estariam falando de golpe e sim de um levante do povo e da festa da democracia.
O Cafezinho
16/07/2015 - 13h04
Se fizesse isso, o PT estaria sendo golpista. E a mídia falaria isso. Manifestação popular contra medidas do governo, tudo bem. Pretender derrubar presidente eleito, é golpe.
Henrique Pedro
16/07/2015 - 15h43
Se esse presidente cometer alguma irregularidade, seria golpe o manter no poder.
José Eugenio Burgos
17/07/2015 - 16h08
E tem provas? Alguém tem???
Henrique Pedro
17/07/2015 - 20h36
José o uso da forma condicional (Se) e o significado da minha colocação, significa que em caso de irregularidade, o que de fato seria acompanhado de provas, seria um golpe manter um governo no poder.
Henrique Pedro
17/07/2015 - 20h39
Quanto a matéria do cafezinho falando sobre as “boas intenções” do governo na pedalada fiscal, o que é um argumento ridículo, mas se o mesmo fosse usado em um tribunal, seria simplesmente um atestado de culpa, já que boa intenção não livra ninguém de irregularidades cometidas.
Renato Talarico
16/07/2015 - 06h08
COM DEMOCRACIA QUEREMOS MONARQUIA !! https://www.facebook.com/Brasil.Monarquia?fref=ts
Daniel Fiuza
16/07/2015 - 05h35
Lula, diz aí qual é a lição que você queria que o povo brasileiro não esquecesse? Para você, qual é a salvação da lavoura nesse país?
https://www.youtube.com/watch?v=yvC3K2zbh04
Frederico Freder
16/07/2015 - 04h55
O cafezinho, já viu o video da Dilma com a repórter da Folha?
Messias Franca de Macedo
15/07/2015 - 21h28
Lava Jato é uma operação de espetáculo para atacar o sistema político brasileiro
Analista político critica tendência golpista da mídia ao noticiar informações da operação e a ocultação do nome de Aécio Neves quando ele surge na investigação
por Redação RBA publicado 15/07/2015 16:14
(…)
https://soundcloud.com/redebrasilatual/lava-jato-e-uma-operacao-espetaculo-calculado-para-atacar-sistema-politico-brasileiro
FONTE [LÍMPIDA!]: http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2015/07/lava-jato-e-uma-operacao-de-espetaculo-para-atacar-o-sistema-politico-brasileiro-1660.html
Messias Franca de Macedo
15/07/2015 - 21h11
… Se a seriedade, a imparcialidade e o republicanismo fossem apanágios das nossas [nossas?!] instituições, os mensaleiros filho do presidente do TCÚÚÚÚÚÚ e o ‘Aécio Furnas Forever’ já estariam presos preventivamente, mofando na ‘Guantánamo do Paraná’!
Mensalão do TCU e de Furnas, respectivamente!
Segundo o Ricardo Pessoa da UTC e o [mega]doleiro Albert(o) Yousseff desde o antanho do escândalo do Banestado da famigerada era FHC da ‘Privataria Tucana’, de novo, respectivamente!…
“É ou não
‘miniSTRO’ ‘Zé’?!
João Paulo Lacerda
15/07/2015 - 23h47
Milena Mendonça
Sandra Pacheco Costa
15/07/2015 - 23h12
E
Karla Viana
15/07/2015 - 23h08
Repetição e repetição sem parar. Todo mundo sabe que o Ministro não está conduzindo bem a coisa. Mas não cai. Porque?
Joel Pinheiro Guimarães
16/07/2015 - 09h41
Se, por um acaso do destino, vc vier a saber do porque da permanência do ZZZzzé CardoZZZzzo como ministro, ainda, por favor, mate a minha curiosidade
Messias Franca de Macedo
15/07/2015 - 20h05
Depoimento de Cardozo é o seu retrato: muito palavrório e…nada
Autor: conspícuo e impávido jornalista Fernando Brito
[Ray VENTURA – Tout va tres bien Madame la Marquise
https://www.youtube.com/watch?v=jGQaz8bfoqE ]
(…)
Preferi lembrar de um clássico do final dos anos 30, Tout va très bien, madame la marquise.
Em si, é uma brincadeira com uma marquesa que, ausente há 15 dias do castelo, telefona pedindo notícias de como vão as coisas.
Sucessivamente, vai recebendo afirmações de que tudo vai bem, mas que sua égua cinza morreu. Tudo vai bem, fora isso e o fato de que ela morreu no incêndio de seu estábulo. E tudo vai bem, menos porque o estábulo pegou fogo porque todo o castelo queimou.
Fora isso, porém, tudo vai bem, apesar de um detalhe: o castelo ardeu porque o senhor Marquês, falido, resolveu atear-lhe fogo, quando descobriu-se falido e, assim, espalhando o incêndio, se matou…
(…)
FONTE [LÍMPIDA!]: http://tijolaco.com.br/blog/?p=28278&cpage=1#comment-207734
Virginia Mesquita
15/07/2015 - 23h01
Dá um desânimo…
Messias Franca de Macedo
15/07/2015 - 19h57
… Falando em peixes, o golpe fazendo água…
ENTENDA
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… E já que quase ninguém assiste mesmo o ‘casal -20’…
E para os que ainda assistem o jornaleco televisivo:…
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Dilma inaugura a ponte que não ia sair
São três quilômetros que desafogam a BR-101.
A Ponte Anita Garibaldi é a primeira ponte estaiada em curva do país
Publicado em 15/07/2015
Ponte Anita Garibaldi acaba com engarrafamentos na região de Laguna (SC)
(…)
https://www.youtube.com/watch?v=5nA_P4e7tjg
FONTES [LÍMPIDAS!]:
aqui
http://blog.planalto.gov.br/ponte-anita-garibaldi-acaba-com-engarrafamentos-na-regiao-de-laguna-sc/
e aqui
http://www.conversaafiada.com.br/economia/2015/07/15/dilma-inaugura-a-ponte-que-nao-ia-sair/
Rose Garden
15/07/2015 - 22h54
Exercitar: nadar contra a corrente
Ester Damasio
15/07/2015 - 22h53
Para pensar! Mas os contaminantes da globo impedem justamente isso: pensar!