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(Na foto, o blogueiro assinando o livro de visitas no Aeroporto Internacional Simon Bolívar, em Caracas).
Dando continuidade à entrevista com o professor José Luiz Quadro Magalhães, cuja primeira parte publiquei na semana passada, reproduzo abaixo a segunda parte.
Lembrando-se que este se trata do primeiro conteúdo do Projeto Bolívar, pelo qual publicarei, semanalmente, material sobre as revoluções bolivarianas, além de uma biografia exclusiva de Simón Bolívar.
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Entrevista com professor José Luiz Quadros Magalhães, da UFMG e PUC-MG
Parte 2/2
11:20
Cafezinho: Um dos problemas principais da Venezuela, da imagem pública da Venezuela, é essa questão democrática. E também a acusação, pelos EUA, como integrante do “eixo do mal”…
JLQM: Sim, o governo Bush…
Cafezinho: Sim, e no Brasil, que tem uma imprensa vinculada à essa corrente de ideias norte-americanas, acabou intoxicando a opinião pública com essa visão distorcida sobre a Venezuela. Você, como professor, percebeu isso, essa visão intoxicada sobre a Venezuela?
JLQM: Ah, claro! Eu vejo muito isso. Em sala de aula, a visão que muitos alunos tem da Venezuela sofre dessa contaminação…
Cafezinho: Você falou também de um professor que lhe agrediu, chamando-o de “bolivariano”.
JLQM: Sim, há colegas que se inflamam, e não conhecem a realidade venezuelana, e às vezes falam. Houve uma agressão, mas há também colegas que falam brincando, mas aquela brincadeira que tem um toque pejorativo, jocoso. “O Zé Luiz é bolivariano, os orientados do Zé Luiz são bolivarianos… ”
Cafezinho: Na própria linguagem, se vê isso. O termo “bolivariano” é usado na imprensa como sinônimo de algo ruim. E na verdade, não é.
JLQM: Pois é, e por que esse termo bolivariano. Esse termo é inspirado nas ideias, e o que marca esse projeto político venezuelano, de união da América Latina, de descolonização. A ideia da descolonização. Dessa ideia de uma América Latina livre. E nessa linha, de união da América Latina, sem a intervenção dos colonizadores europeus, ou do império norte-americano, a gente vê, por exemplo, iniciativas que partiram da Venezuela muito importantes para o continente, como foi a criação da Celac, a comunidade de estados latino-americanos e caribenhos, a criação da Unasur, unindo a América do Sul, e projetos políticos, econômicos e sociais importantíssimos… A Telesur, do qual a gente (Brasil) acabou não fazendo parte – e precisamos fazê-lo -, e que existe na Argentina, Venezuela, Cuba, Equador. Então você tem um projeto de unidade e descolonização, e de descolonialidade, que é esse projeto bolivariano.
Agora, é muito importante também lembrar que as constituições da América Latina, e os projetos latino-americanos de desenvolvimentos econômico, e transformação social, eles são diferentes entre si. Eles são muito avançados, muito democráticos, mas o que ocorre aqui na Venezuela é uma coisa. O que ocorre no Equador é um outro projeto, mas também de integração, também socialista, mas adequado às características do Equador. E na Bolívia, um outro diferente, um projeto para um Estado plurinacional. Na Bolívia, por exemplo, tem hoje direito reconhecido para as 36 comunidades étnicas que constituem hoje quase 90% da população boliviana que hoje se autodenominam indígena. Antes do início do Estado pluracional era menos de 50%. Hoje as pessoas retomam o seu orgulho, retomam sua história, coisas que a gente vê acontecer aqui na Venezuela, as pessoas conhecendo a história da Venezuela.
Então são projetos distintos, o que acontece na Bolívia, Equador, Argentina, Venezuela, Uruguai, Brasil, Chile. Cada um com sua realidade histórica, mas buscando a construção de uma América Latina diversa e integrada, e descolonial, sem ficar abaixando a cabeça, como nós fizemos durante 500 anos, para os colonizadores, primeiramente europeus, e depois os Estados Unidos, o império norte-americano.
Cafezinho: Há interesses contrários à integração…
JLMQ: Claro!
Cafezinho: Por trás de algumas críticas à América Latina, há esse medo da integração latino-americana…
JLMQ: Com certeza, e o problema todo é que nós temos uma elite econômica pequena, ainda bem pequena, e com a cabeça em Miami. Se a gente pegar por exemplo, o que acontece na França. Na França, há um embate entre os interesses do capital e os interesses dos trabalhadores, essa luta de classes, etc, que é histórico. Só que tem uma diferença. A elite econômica francesa, ela é francesa. A elite econômica brasileira não é brasileira. Ela está com a cabeça nos Estados Unidos. Ela critica o Brasil, critica os brasileiros. Ela não se gosta. Temos uma elite entreguista. Nós temos partidos políticos entreguistas. Querem entregar a Petrobrás, como no passado já tentaram. Querem entregar nossa riqueza, querem entregar o pré-sal para empresas norte-americanas. Isso é uma diferença muito grave.
Eu dou aula para um curso de inteligência, que era da Escola Superior do Ministério Público, e hoje é do Inasis, e tem alunos que são oficiais do exército brasileiro, da Abin, da Polícia Federal, da Polícia Civil, da Polícia Militar, e a gente comentava sobre a segurança interna do Brasil. E a gente comentava justamente isso: o nosso maior inimigo hoje é essa mentalidade colonial da nossa elite econômica.
A gente até brincava, e eu acho que o bom humor e a brincadeira ajudam a gente ver o absurdo de determinadas situações, que se por exemplo ocorresse uma invasão norte-americana no Brasil, a elite brasileira pegaria o porta-aviões para ir à Miami, em vez de resistir à ocupação estrangeira.
Então isso é algo que a gente precisa mudar. Mas eu acho que mais do que isso. Não só mudar a cabeça da elite econômica, mas acabar com a elite econômica. A gente precisa ter um país que seja para todos os brasileiros, sem desigualdade.
Cafezinho: Esse ano tivemos algumas manifestações grandes, em que havia várias faixas pedindo intervenção militar em inglês.
JLMQ: É, eu vi na internet pedidos de intervenção militar norte-americana. Teve uns caras que fizeram uma carta ao presidente Obama, pedindo pra ele intervir. Olha que mentalidade! É superficialidade, ignorância, desconhecimento. E isso é muito grave, porque esses caras são anti-nacionais.
Cafezinho: Vamos voltar à questão bolivariana. Fale mais sobre esse grupo do qual você faz parte, de juristas que estudam as novas constituições latino-americanas.
JLMQ: Esse grupo, como eu disse, são mais de 300 constitucionalistas. É uma rede que a cada dia recebe novas adesões. Agora em dezembro a gente deve lançar até o final do ano duas novas coleções de livros. Uma que vai sair pela faculdade de direito de Santo Agostinho, de Montes Claros, e outra pela Lumen Juris, Rio de Janeiro. A gente tem um portal, que é abrigado pela Universidade Federal de Goiás, que se chama Rede pelo Constitucionalismo Democrático Latino-Americano. Mas é uma rede. Uma rede livre. Então obviamente que nós somos muitos professores, pesquisadores, estudantes, mestrandos, doutorandos. A gente tem teses de doutorado. Por exemplo, nessa coleção da Lumen Juris deve sair até o final do ano sete teses de doutorado e mestrado sobre o tema do novo constitucionalismo. Nessa coleção da Santo Agostinho, a previsão é que saia até agosto cinco livros sobre o direito à diversidade e o novo constitucionalismo latino-americano. Estão sendo criadas disciplinas sobre o novo constitucionalismo latino-americano, na universidade estadual do Amazonas – é um projeto ainda, para criar um mestrado. Há um projeto para criar um mestrado sobre direito à diversidade e o novo constitucionalismo latino-americano na Universidade Federal de Ouro Preto. Há um projeto para um mestrado também na faculdade de direito de Santo Agostinho de Montes Claros. Há estudos para inserção de disciplinas na Federal de Ouro Preto, na Estadual do Amazonas, na Federal do Ceará. A nossa coordenadora brasileira é a professora Germana, que é da Universidade Federal do Ceará, e que também está criando uma disciplina nessa área. Enfim, isso está crescendo. Agora, é importante dizer que não há visão homogênea. Nós somos muitos e cada um tem uma visão distinta desse processo.
Uma coisa que é comum é que todos nós acreditamos nesse processo, estamos estudando. Mas uns acreditam que isso pode significar uma ruptura com esse direito moderno, como eu, que acredita nisso, e somos muitos também. Tem alguns que acreditam que é um processo de reforma, importante, avançado, mas mera reforma. E a gente fica dividido entre esses dois grupos. Os que não integram a rede, a gente tem muitos colegas que agem daquela maneira: não li, não quero ler e tenho raiva de quem leu. Tem esses aí, infelizmente. E outros que consideram constituições curiosas, mas não conseguem enxergar esse novo.
Cafezinho: Vêem mais como excentricidades, e não é isso…
JLMQ: Não é. São experiências reais, e, mais importante, partem do povo. A gente pode pegar especialmente o caso boliviano. Não é uma constituição que partiu de um gabinete. O povo boliviano construiu o sistema. E os constitucionalistas e teoricos foram teorizar sobre o que o povo fez. É isso o que está acontecendo. É de uma radicalidade democrática sem igual. E é exatamente o oposto do que as pessoas estão falando. A gente viu isso aqui. E deveríamos voltar aqui, para ir ao interior, ver esses processos, das comunas. Hoje passamos por algumas comunas e algumas favelas, perto de onde está o túmulo do presidente Hugo Chávez, e a gente vê essa força popular, que estão discutindo política, discutindo projetos. Eu vi isso também no Equador. O primeiro dia em que cheguei no Equador, eu fui numa praça, num domingo, e havia um grupo de pessoas reunidas, onde ficam as sedes dos três poderes, discutindo a Constituição do Equador, discutindo política, discutindo a carta de direitos humanos. Isso é sensacional!
Aqui na Venezuela, em banca de jornal você compra a constituição. Aqui havia grupos de estudo da Constituição venezuelana, nas favelas e comunidades.
Cafezinho: Isso é uma coisa curiosa, esse apagão informacional em toda América Latina. Os países que fizeram reformas de aprofundamento da democracia, são acusados de violar princípios democráticos…
JLMQ: É tudo ao contrário!
Cafezinho: E há países onde houve retrocesso, como o Peru, com Fujimori…
JLMQ: É, o Peru com Fujimori teve um retrocesso enorme…
Cafezinho: Estivemos juntos aqui em programas jornalísticos, públicos e privados, também no Ministério da Comunicação, e pudemos observar muito essa questão da comunicação, que é uma das grandes acusações que se faz à Venezuela, é que ela controla a comunicação, e que isso seria uma violação de um dos princípios da democracia, que é a liberdade de imprensa, e da comunicação. O que a sua experiência esta semana te mostrou?
JLMQ: Isso é uma grosseira mentira, mas é uma mentira fácil de ser desmontada. Porque qualquer cidadão brasileiro pode entrar na internet e ver que todos os jornais da Venezuela tem sites. Então pode ver os jornais de oposição, ver o que eles falam do presidente, do governo. Há jornais públicos, de oposição, apolíticos, etc. Isso é fácil de ser comprovado. É só entrar na internet. Nós estivemos na Globovision, que é uma tv igual à rede globo, poderosíssima. Estivemos num jornal chamada Últimas Notícias. Eu nunca vi uma redação tão grande. De oposição! É fácil ver essa grosseira mentira. E a gente precisa rejeitar isso no Brasil. Não podemos continuar sendo feitos de bobos. A grande mídia no Brasil mente pra gente, distorce, encobre fatos. E a gente está deixando de conhecer projetos democráticos, populares, que estão transformando os países, e que por esse motivo estão sendo tão atacados, pelas elites, representadas no Brasil pela grande mídia, Globo, Veja, essas coisas horrorosas, que querem manter privilégios, que não querem mudar o nosso país! Não querem permitir que as pessoas tenham direitos iguais, e que possam participar da vida social, política, econômica, em condições iguais.
Cafezinho: Eles se assustam sobretudo pelo fato do governo, que é um governo democrático, eleito pelo povo, de ter voz. Uma voz própria. Porque geralmente em nossa tradição supostamente democrática, o governo só poderia falar através da mídia. Mesmo os governos neoliberais, como FHC, Sarney, só podiam ter voz, se fizessem acordos com a mídia.
JLMQ: Sim, e aí financiando essas mídias, o que acontece até hoje, e que é um absurdo. A grana que o Estado brasileiro, com dinheiro do povo brasileiro, passa via propaganda, para os grupos de mídia, para ter espaço na TV. Aqui na Venezuela, há uma lei, que garante ao governo dez minutos por dia nas tvs, para o governo falar do que está fazendo. Prestar contas à população.
Cafezinho: Você não acha antidemocrático, o governo ter dez minutos todos os dias, nas tvs?
JLMQ: Isso é extremamente democrático. Antidemocrático é o governo eleito pelo povo ter que pagar milhões para as redes privadas, para contar à população o que está fazendo! O governo é obrigado a prestar contas. Onde é o melhor lugar para prestar contas, rádio, tv e jornal, não é? E ele tem de pagar para prestar contas? Claro que não! E o que são 10 minutos? Isso é muito democrático. Isso deveria ter em todo lugar. O governo presta contas, fala que tal projeto está sendo feito, permitindo que as pessoas inclusive possam criticá-lo. Isso é democracia!
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