Algumas questões para quem respeita e quer ver respeitar o Direito no Brasil
Por Rogerio Dultra dos Santos, em seu blog.
Há muito parece que por aqui não existe mais a distinção entre o sentimento subjetivo de justiça e os parâmetros objetivos do processo judicial. Quem reclama da instituição “justiça” e de suas burocracias enviesadas é visto como alguém que não aceita que a sua concepção de verdade ou de certo/errado seja questionada. Examinar ou criticar decisões ou procedimentos do Poder Judiciário tem tomado usualmente a dimensão de um “chororô” de perdedores.
Há muito esta oposição entre a compreensão pessoal sobre o que é justo, por um lado, e o funcionamento institucional que sustenta as regras sociais de convivência, por outro, soçobrou ante os extremismos político no nosso quintal.
Assim, demandar o devido processo é hoje uma atitude considerada de desespero dos que se sentem injustiçados, e não uma necessidade básica que torna possível a convivência social das diferenças, ou uma garantia coletiva, racional e objetiva da liberdade, para ficar no âmbito da tradição do constitucionalismo liberal.
Nesse sentido, algumas perguntas sobre o que tem ocorrido nos últimos meses no país podem até parecer afirmações enviesadas ou convicções cegas, mas, pela sua simplicidade, trazem a possibilidade de se questionar as obviedades irrefletidas e as afirmações – estas sim, imperativas – a que somos submetidos diuturnamente.
Para além das simpatias ideológicas, olhar para como se realiza o direito pode ser um sinal de quão sadia ou enferma caminha a sociedade em que vivemos.
Seguem as perguntas sobre a relação óbvia e tradicional entre a política e o direito que, aglutinadas, podem revelar de que modo enxergamos o Estado de Direito que compreendemos possível.
É possível que juízes e promotores comentem processos sob sua jurisdição em público?
Juízes federais devem receber prêmios de empresários que são réus na Justiça Federal?
É lícito que o juiz da causa escreva um artigo em um jornal de grande circulação nacional afirmando que o processo sob sua responsabilidade trata do “maior esquema de corrupção do Brasil”, mesmo que não tenha sido proferida sentença?
São lícitos vazamentos seletivos de documentos pelo judiciário?
E partes de delações premiadas gravadas e divulgadas num jornal nacional?
O estatuto da magistratura está sendo respeitado quando isto acontece?
Juízes e procuradores devem combinar táticas de acusação em conjunto?
A confissão é a rainha das provas?
Bandidos que delatam devem figurar como a espinha dorsal probatória de um processo judicial?
É possível concordar com a abertura de inquéritos contra parlamentares com base apenas em delações premiadas, e com o arquivamento em relação a Aécio Neves, sendo que em relação a este a “prova” existente (testemunhal) era de mesma espécie?
Por outro lado, onde estão as provas da operação Zelotes?
Não está havendo diferença de tratamento?
FHC não recebeu dinheiro da Odebrecht?
Porque a acusação e o juiz Moro não aceitaram nas delações premiadas informações sobre contratos em outras esferas de governo, se as empresas que financiam o PT, o PMDB e o PP também financiaram outros partidos, como PSDB e PSB?
E qual seria mesmo o crime cometido por Lula?
Promover empresas no mercado global?
Ex-Presidentes dos EUA não fazem isso?
Estas questões, que podem ser vistas como partidárias, seriam consideradas talvez normais e preocupantes se se mudassem os personagens e o cenário. Talvez fossem entendidas como necessárias se o alvo não fosse o PT e o “maior escândalo de corrupção de todos os tempos” – como se a história não nos fornecesse, no próprio país, muito mais munição do que tem nos feito imaginar a nossa pobre imprensa. Ou se as “verdades” do processo não fossem a pauta quase exclusiva da mídia de massa, a martelar as nossas mentes de forma incessante.