Exclusivo! A nova pesquisa sobre o sistema carcerário brasileiro

Essa pesquisa é muito importante, amigos. Trata-se da mais grave denúncia já feita ao sistema judiciário, penal e carcerário brasileiro.

Ela prova que a origem do problema das superpopulações nos presídios vem do judiciário, de sua prática abusiva da prisão provisória e preventiva, usada por magistrados de maneira indiscriminada, arbitrariamente, antepondo sempre razões duvidosas de “ordem pública” ao direito à liberdade.

Essa prática tem ligação direta com as recentes conspirações judiciais.

Antigamente o Judiciário abusava apenas dos pobres.

Com a judicialização da política, o abuso da prisão preventiva agora atinge empresas, partidos e agentes políticos.

Desde que isso seja necessário, claro, para saciar a fome de escândalos da mídia: ou seja, desde que atinja, direta ou indiretamente, aqueles que os barões da imprensa elegem como seus adversários políticos.

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MINISTÉRIO DA JUSTIÇA PUBLICA PESQUISA SOBRE O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO

Por Rogério Dultra, no blog Democracia e Conjuntura.

Lançada esta semana em Brasília, a pesquisa “EXCESSO DE PRISÃO PROVISÓRIA NO BRASIL: Um estudo empírico sobre a duração da prisão nos crimes de furto, roubo e tráfico” pode ser acessada diretamente AQUI.

A investigação visou examinar a situação concreta das medidas de prisão cautelar no Brasil. Pelos dados recolhidos de dois Estados da Federação (Bahia e Santa Catarina), examinando processos tramitados entre 2008 e 2012, foi possível visualizar uma regularidade institucional na prática da aplicação das medidas cautelares de prisão.

A prisão cautelar, quando aplicada, se mostra excessiva em vários aspectos: uma parcela significativa dos indivíduos registrados no sistema carcerário não somente permanece presa sem julgamento por períodos não razoáveis, como a manutenção dessas prisões se dá sem motivações processuais consistentes.

A prisão em flagrante efetuada pela autoridade policial figura nos dados recolhidos como a forma quase exclusiva de repressão a delitos, aparecendo como garantia para o funcionamento do próprio sistema criminal. A manutenção da prisão em flagrante e a sua protelação temporal figuram nesses dados como instrumentos de legitimação do sistema de justiça.

Sem as prisões em flagrante, praticamente não haveria processos criminais, pois na Bahia o número de réus nessa situação é de 89,6%, e em Santa Catarina, de 77,5%. No crime de tráfico, o quadro indica que a quase totalidade dos réus foi alvo do flagrante (98,3% na Bahia e 93,8% em Santa Catarina).

A pesquisa evidenciou longos períodos efetivos de cumprimento da medida de prisão nos Estados estudados. A partir desta informação, foi possível reunir um conjunto de indicadores orientados a demonstrar que as razões dessa longa duração estão mais ligadas a problemas da administração do sistema criminal – incluídas as condições de defesa –, do que melhor justificadas por razões de cunho exclusivamente processual.

Um dos números mais estarrecedores da pesquisa indica a tendência de que a maioria dos réus presos cumpriu a quase totalidade do tempo de prisão durante o processo – portanto, antes mesmo da formação da culpa por uma sentença condenatória. A duração da prisão cautelar em ambos os Estados, aquela cumprida do início ao fim do processo, é extensa e aberrante. São 275,96 dias em Santa Catarina e 682,9 dias na Bahia.

Nessas condições, para que se figure o sistema criminal sob ares de legalidade, é preciso imaginar que durante todo esse tempo os diversos indivíduos presos à espera de julgamento estiveram a pôr em risco a coleta de provas ou ameaçando frustrar a aplicação da lei penal, riscos e ameaças que, quando existentes, só persistem porque a prova não é logo produzida e o julgamento custa a acontecer.

Esta ilação é difícil de se manter visto que a maioria dos crimes examinados era de pouca complexidade e sem violência à pessoa. Para corroborar tal fato, na Bahia e em Santa Catarina menos da metade dos processos examinados terminam em condenação (respectivamente 36,1% e 44,3%).

Isto significa que a maioria dos processos redunda em absolvição, prescrição, extinção de punibilidade, extinção do processo, exclusão de crime ou isenção de pena (no conjunto, o equivalente a 63,9% dos processos na Bahia e 55,7% em Santa Catarina). Isto significa que a maioria de indivíduos que esperou em média seis meses (Bahia) a um ano (Santa Catarina) presos, não foram condenados ao final do processo.

Os dados indicam que, ao lado da Justiça, a Polícia Judiciária e o próprio Ministério Público são instituições que respondem amplamente pelo atraso do procedimento criminal e que, assim, contribuem decisivamente para a irrazoabilidade do tempo da prisão antes do julgamento e mesmo da prisão antes do processo.

A comparação de duas realidades populacionais, culturais e institucionais relativamente distintas permitiu que se avaliasse de que modo um ordenamento jurídico único pode ser aplicado através de práticas e ritos aparentemente diversos, mas com resultados por vezes muito aproximados.

A pesquisa permite avaliar o excesso de prisão provisória e seus significados não somente jurídicos e constitucionais, mas também institucionais e políticos. Os dados colhidos na Justiça criminal indicaram que a prisão cautelar, longe de ser utilizada como ultima ratio, como recurso derradeiro e excepcional, é de fato a resposta usual, recorrente e normal do sistema.

A publicação foi realizada com base na investigação dos professores Rogerio Dultra dos Santos e Douglas Guimarães Leite, da Universidade Federal Fluminense.

O relatório final, publicado no Programa Pensando o Direito, da Secretaria de Assuntos Legislativos, é fruto de Edital Público conjunto do Ministério da Justiça e do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA). A pesquisa durou 09 meses recolhendo dados e contou com uma equipe multidisciplinar, composta por juristas, cientistas políticos, historiador, sociólogo e estatísticos.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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