E se o Nassif tiver razão?


 

Há semanas que o blogueiro Luis Nassif, em geral um analista moderado e pacato, como convêm a um bom mineiro, tem martelado que a escolha de Gilmar Mendes para relatar as contas de campanha de Dilma Rousseff, não foi uma coincidência.

Aliás, duas coincidências: Gilmar foi “sorteado” para relatar as contas da campanha de Dilma e também do PT.

Reza a lenda que o raio da tempestade não cai jamais no mesmo lugar. Não foi o caso desta vez. O raio caiu três vezes no mesmo lugar.

Gilmar foi sorteado para relatar as contas de Dilma.

Gilmar foi sorteado para relatar as contas do PT.

Gilmar foi sorteado para relatar a interpelação que o PT decidiu fazer contra Aécio Neves, quando este disse que perdeu as eleições para uma “organização criminosa”.

Nassif especulou, com base na sua intuição mineira e quiçá em alguma informação mais sólida, que Toffoli entrou para o esquema da mídia e do golpe. E por isso teria fraudado o processo de escolha do relator das contas de campanha da Dilma duas vezes: 1) ao não esperar a nomeação de um novo ministro do TSE,  aproveitando-se da viagem da presidenta para fora do país; 2) manipulando o sorteio para escolher Gilmar Mendes.

A teoria de conspiração de Nassif, apesar de irretocável, não fez muito sucesso.

Eu mesmo não acreditei.

Pois agora começo a acreditar.

No domingo, a Folha dá manchete dizendo que a maioria dos brasileiros culpa Dilma pela corrupção na Petrobrás. É uma manchete mentirosa. A Folha fraudou a própria pesquisa, ao somar o eleitorado tucano, que afirma, naturalmente, que Dilma tem “muita responsabilidade” nos escândalos da Petrobrás, aos que acham que a presidenta tem “pouca responsabilidade”. Juntou ambos os grupos como sendo um só, os que dizem “sim, a presidenta tem culpa”, e produziu um factoide pró-impeachment.

Hoje, segunda-feira, outra rede do golpe foi jogada sobre a opinião pública.


A jogada é evidente. Como Gilmar é muito identificado como o principal e mais fiel quadro tucano dentro do Judiciário, eles armaram a rejeição como uma coisa “técnica”.

Com isso, blindam a decisão de Gilmar Mendes de rejeitar as contas de campanha da presidenta.

A gente tem de tirar o chapéu. Eles estão se aperfeiçoando.

O governo não ficou atento aos movimentos da escolha do relator. Ao invés de nomear logo o novo nome para o TSE, Dilma viajou ao exterior, dando margem para a traição de Toffoli.

O golpismo está atento aos mínimos erros e distrações do governo.

O jogo de xadrez atingiu um momento crítico.

A pesquisa Datafolha, apesar da manchete mentirosa da Folha, mostrou que a maioria da população começou a enxergar Dilma como alguém que luta contra a corrupção como nenhum outro presidente já fez.

Ou seja, a aprovação de Dilma está crescendo, e isso apavora a mídia e a oposição.

Segundo o Datafolha, a popularidade da presidenta, miraculosamente, diante dos ataques incessantes da mídia e da oposição, se manteve estável, no mesmo nível da campanha eleitoral.

Quem sabe não está em curso uma movimentação totalmente orquestrada para, de fato, derrubar Dilma?

A Globo faz uma entrevista com Aécio, no programa do Roberto D’Ávila, em que não há nenhum questionamento sobre as suspeitas envolvendo o senador. Ao contrário, serve de palanque para Aécio lançar o conceito de uma campanha pelo impeachment: “fui vencido por uma organização criminosa.”

Ou seja, Aécio não foi vencido pelo voto. Não fomos eu, nós, vocês, todos, tentando convencer a maioria da população de que o PSDB não tem moral nenhuma para se arvorar em paladino da ética, e que Dilma, apesar de seus inúmeros defeitos, era, de longe, a melhor opção para o país.

Em seguida, Aécio, num movimento esperto para testar e exercitar suas forças,  convoca manifestações de rua. Que foram um fiasco, mas contam sempre com a ajuda da grande mídia para reduzir o dano. As “dezenas” de participantes, segundo o portal Terra, se transformam em “milhares”, em matéria da Globo.

O Ministério Público e o procurador-geral já começam a sofrer pressões espúrias por parte da mídia.

Na alta cúpula do Judiciário, a única voz que se ouve, em entrevistas intermináveis, é a de Gilmar Mendes. Apesar de isolado tanto no TSE quanto no STF, ele parece pautar sozinho a agenda política dessas duas instituições. Como? Por causa do apoio incondicional da mídia.

Nunca um terceiro turno foi tão incendiário como agora. A oposição e a mídia ganharam experiência.

O erro fundamental do governo, por sua vez, é não sinalizar para as suas bases e não estruturar um sistema democrático de informação.

Não há necessidade de se fazer um comício na Central do Brasil, nem qualquer tipo de provocação “bolivariana”, mas poderia já ter definido os seus nomes políticos, o que lhe fortaleceria nesse momento crítico.

O governo, neste momento, está perigosamente fraco, porque grande parte dos ocupantes de ministérios vivem num limbo: não estão nem dentro nem fora da estrutura.

As bases sociais só recebem notícia ruim da grande mídia.

O próprio governo, repetindo o erro cometido em 2010, as negligencia.

Mercadante, o homem forte da Dilma, só dá entrevista para a Miriam Leitão, em tv fechada.

Miguel Rosseto não é empossado e, com isso, tem seus braços atados.

Enquanto isso, a mídia e seus aliados ampliam seu arsenal, de um lado, e aumentam a carga sobre seus críticos, de outro.

A Globo inaugura um novo telejornal na primeira hora da manhã.

Um tribunal do Distrito Federal aumenta a multa imposta à Carta Capital por matérias sobre Gilmar Mendes.

Matérias contra Lula, Dilma e qualquer nome da base aliada, podem ser publicadas à vontade.

Contra tucanos, não se pode falar nada.

Enquanto isso, o governo continua dando dinheiro para a Globo, a mesma empresa cujo diretor de jornalismo processa blogueiros, exigindo “indenização”.

É um jogo barra pesada.

E quanto tentamos nos convencer de que tudo vai terminar bem, que estamos sendo paranoicos, descobre-se que a esposa do juiz Sergio Moro, o novo Joaquim Barbosa da mídia, é advogada do PSDB.

Pior, o seu escritório de advocacia presta serviços para  a Shell, principal concorrente da Petrobrás.

Mas eles tem um ponto fraco: não ganharam as eleições.

Não se conformam com isso.

Não se conformam que o povo, mesmo com 12 anos de ataques sistemáticos da mídia, tenha resistido às suas mentiras e manipulações.

E, apesar da truculência da mídia e da covardia do governo, seguirá resistindo…

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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