A defesa de Pizzolato na Itália


 

Por que eu me interesso tanto pelo caso Pizzolato?

Simples, porque ele é, no momento, a única possibilidade real de rediscutir os arbítrios da Ação Penal 470.

Os arbítrios e o próprio mérito das sentenças.

O governo tem de respeitar sentenças do STF.

A sociedade, num ambiente democrático, pode e deve debatê-las; não o fazendo, corremos o risco de cairmos, em algum momento, numa ditadura judicial.

Não há verdades absolutas numa democracia, e mais ainda em sentenças judiciais.

Tudo deve ser posto sob o escrutínio implacável de um debate livre e aberto de ideias.

Se uma sentença for sólida, o debate servirá para a consolidar ainda mais.

Se for frágil, poderá ser questionada e revisada.

A Ação Penal 470 é o mais perigoso ovo de serpente da nossa democracia.

Há uma luta política e simbólica nos bastidores da AP 470 que precisa ser combatida.

É preciso enfrentar de frente os erros da Procuradoria e do STF, porque eles desnudam o mal que a mídia faz ao país, ao conseguir pressionar e acuar setores poderosos do Estado.

Se a mídia consegue corromper e acuar até ministros indicados pelo PT, para trabalharem contra o PT, imagine o poder de influência que ela não teria com ministros indicados por ela mesma, pela própria mídia, como viria a acontecer no caso de vitória de Aécio Neves.

O que eu acho inacreditável é que até a EBC e a Agência Brasil repitam a pauta da grande mídia, papagaiando que a Justiça Italiana libertou Pizzolato apenas por causa das prisões.

A EBC e similares deveriam se distinguir da mídia comercial por uma linha editorial corajosa e independente.

De que adianta o governo aceitar debater “regulação econômica da mídia” se permite que as principais ferramentas de comunicação do Estado sejam aparelhadas ideologicamente pela mídia conservadora?

Qual a função de uma mídia pública que apenas repete o noticiário da Globo?

É jogar dinheiro público no lixo!

Então é melhor fechar a EBC e a Agência Brasil!

A Justiça italiana, ao aceitar os argumentos da defesa de Pizzolato, entrou no mérito da sua acusação.

Houve questionamento, portanto, de todo o processo.

O factóide sobre o indiciamento de Pizzolato pela PF por causa de documentos falsos é algo absolutamente periférico.

Qualquer perseguido político tem o direito, consagrado internacionalmente, de falsificar documentos.

Todos os perseguidos políticos brasileiros que fugiram do país, como José Serra, falsificaram documentos para fugir de uma perseguição injusta do Estado.

A história de qualquer democracia moderna é repleta de erros judiciários.

A literatura e o cinema americanos, por exemplo, oferecem um vasto e rico mosaico de erros famosos.

A democracia amadurece quando aprende a encarar seus erros de frente, e a fazer reavaliações históricas.

O Judiciário brasileiro tem de passar pelo crivo de um debate livre, um debate livre sobretudo dos miasmas mal cheirosos de uma imprensa desonesta, golpista e profundamente antidemocrática.

No caso da AP 470, é preciso mostrar ao país o papel jogado pela imprensa em todo o episódio, e desnudar a incrível pressão psicológica sobre os juízes, governo, procuradores e opinião pública.

Todas as armas semióticas foram disparadas para se atingir o objetivo final, que era enfraquecer e derrotar o PT.

Por isso a eleição de 2014 foi tão importante. Todo o ódio construído contra o PT nasceu ali, nas entranhas podres do julgamento do mensalão.

Abaixo, o resumo em português da defesa de Henrique Pizzolato, na Itália. Repare que a questão das prisões foi apenas um dos cinco pontos principais mencionados pela defesa. Leia com atenção e carinho, porque há muito mais coisa em jogo do que apenas os destinos de um cidadão brasileiro.

Se preferir ler a íntegra, em italiano, clique aqui.

*

BREVES INFORMAÇÕES SOBRE O CASO DE HENRIQUE PIZZOLATO

Henrique Pizzolato, cidadão ítalo/brasileiro, encontra-se preso na Casa Circondariale di Modena, na condição de estradando requisitado pelo Brasil para cumprir pena – 25 meses em regime fechado, mais 25 meses em regime semi-aberto (de uma pena de 12 anos e 7 meses) – de reclusão nas prisões brasileiras.

Pizzolato foi julgado e codenado no Supremo Tribunal Federal brasileiro no ano de 2012 juntamente com outras 39 pessoas, pois entre eles haviam 3 Deputados Federais acusados de receberem pagamentos mensais para aprovarem projetos de interesse do governo Lula (Partido dos Trabalhadores).

1) Violação do princípio do juiz natural e violação do direito ao duplo grau de jurisdição

O Supremo Tribunal Federal é competente para julgar crimes penais comuns atribuídos a pessoas que ocupam cargos específicos como: Presidente e Vice-Presidente da República, membros do Congresso Nacional, Ministros e Procurador Geral da República.

Esta competência tem somente o propósito de preservar o cargo/função (a importância, a elevadura do encargo) e não o cidadão detentor do cargo. O cidadão comum, como estabelece a Constituição Federal e as Leis de matéria penal, deve ser processado na primeira instância com o direito a todos os recursos para revisão da decisão, seja em sede ordinária, seja em sede extraordinária.

Henrique Pizzolato que, na época, não ocupava nenhum cargo político e jamais havia ocupado, foi julgado por este tribunal especial que não prevê qualquer impugnação (recurso) contra a sentença de condenação, nem mesmo por violação de leis.

Haver subtraído injustamente e erroneamente para Pizzolato o direito ao juiz natural e preconstituído por Lei (1ª instância), há consequentemente provocado uma grave violação dos direitos de defesa: a garantia ao duplo grau de jurisdição, o direito à impugnar uma decisão de condenação para obter uma reavaliação dos fatos e da sentença e verificar se o juiz respeitou normas processuais que garantem ao acusado o justo processo legal.

O julgamento único diante do Supremo Tribunal Federal suprimiu para Henrique Pizzolato a possibilidade de recorrer da sentença de condenação a outro tribunal, violando assim um dos primeiros e fundamental direito de defesa: o direito ao duplo grau de jurisdição.

Henrique Pizzolato foi julgado por um tribunal INCOMPETENTE que emitiu uma sentença INAPELÁVEL.

2) Violação do princípio de imparcialidade do órgão que julga

O princípio da imparcialidade diz que o juiz que acompanha a fase de investigação não pode julgar.
No processo diante do Supremo Tribunal brasileiro, o mesmo juiz, chamado de juiz relator, acompanhou a fase de inquérito/investigação (polícia federal, procurador), apresentou seu relatório final e também votou/julgou pela aceitação da denúncia apresentada pelo procurador, pronunciando-se, assim, sobre o conteúdo da mesma.
Ao ser aceita a denúncia, o inquérito se transforma em ação penal e inicia a fase do contraditório (procurador, advogados de defesa).

No caso em questão, o mesmo juiz relator acompanhou esta fase (contraditório), relacionando-se continuamente com o procurador federal e também participou e votou/julgou no julgamento de mérito (no ano de 2012), acumulando os cargos de relator, de juiz e presidente do Supremo Tribunal Federal, cargo que assumiu no curso do julgamento da Ação Penal 470 (número atribuído ao processo).

Este duplo papel é incompatível com as garantias ditadas na Convenção Americana de Direitos Humanos (da qual o Brasil é signatário) e da Convenção Européia dos Direitos do Homem que estabelece a imparcialidade do órgão que julga, princípio incompatível com a figura de um juiz que assume o duplo papel de “parte” (investigador, ) e juiz (que julga).

De fato, não pode ser considerado imparcial um juiz que contribuiu ativamente para a construção da hipótese acusatória.

3) Violação do direito de defesa no sentido estrito e as contradições das acusações contra Pizzolato [1]

Muitos documentos e elementos probatórios que teriam retirado as acusações contra Pizzolato foram negados à defesa com motivações enganosas.

O pocurador geral apresentou denúncia contra 40 pessoas, apesar de saber que as investigações da polícia federal não tinham sido concluídas e referiam-se a outras pessoas que não constaram da lista dos 40 acusados. Isto é, a polícia federal continuou as investigações mesmo depois da apresentação da denúncia pelo Ministério Público. E depois de feita a denúncia, a polícia apresentou documentos que demonstravam que Pizzolato não era responsável pelos fatos que foram atribuídos a ele.

Pizzolato foi acusado pelo procurador pelos crimes de peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O procurador acusa que Pizzolato, no cargo de diretor de marketing do Banco do Brasil, havia “desviado” dinheiro de outra empresa (Visanet) em favor de uma agência de publicidade que, segundo a acusação, não havia feito as propagandas e o dono desta agência de publicidade repassou este dinheiro para os dirigentes do Partido dos Trabalhadores pagarem os parlamentares.

Pois uma perícia apresentada pela polícia federal ao procurador demonstrou que não foi Pizzolato quem autorizou e efetuou pagamentos para a agência de publicidade com o dinheiro da empresa Visanet. Consta na perícia que outros funcionários, de outra diretoria do Banco do Brasil, requisitaram que a Visanet efetuasse os pagamentos para a agência de publicidade e consta, também a lista das empresas que executaram as propagandas.

O procurador, em vez de apresentar e anexar esta perícia (e outros documentos) nos autos do processo para conhecimento do defensor de Pizzolato, pediu ao juiz relator que estas novas provas fossem separadas e colocadas em um outro processo. O procurador dirigindo-se ao juiz relator diz: “requeiro, com brevidade, que o procedimento que contém os atos probatórios posteriores à denúncia seja autuado em separado e receba nova numeração”.

O juiz relator, Joaquim Barbosa, acolheu o pedido e criou um procedimento paralelo (um inquérito paralelo), para esconder documentos que contradiziam a acusação que o procurador havia feito. O próprio juiz relator disse que: “…esse inquérito paralelo, o Procurador-Geral, ao formular a denúncia, pediu que os fatos posteriores àquela denúncia que ele estava formulando fossem apurados em um inquérito à parte, porque senão aquilo (o processo) não teria um fim. E esses fatos paralelos apurados à parte é que deram origem a esse Inquérito nº 2.474, que tramitou em segredo de justiça.” http://www.youtube.com/watch?v=B1olh0VKbSw

A existência deste inquérito paralelo, que também escondeu outros documentos importantes durante todo o processo, foi ocultado ao conhecimento e negado o acesso para o advogado de defesa de Pizzolato e para todos os outros réus.
Não se pode evitar de dizer que existiu uma “irritualidade” (mais correto dizer uma ilegalidade, senão um próprio ilícito) da “singular” escolha processual que efetivamente impediu aos acusados de conhecerem provas relevantes a seu próprio favor.

Em outra parte da denúncia, o procurador acusa que os dirigentes do Banco do Brasil: “o Gerente Executivo de Propaganda e Diretores de Marketing responsáveis pelo acompanhamento e supervisão dos contratos de publicidade, consentiram que a agência de publicidade se beneficiasse dos “bônus de volume” que sabiam eram devidos ao Banco do Brasil.

Neste item da denúncia, embora outras pessoas sejam citadas, o procurador acusa somente Pizzolato para ser processado no Supremo Tribunal Federal. No que diz respeito aos outros, o procurador decide que “Há outros envolvidos, cujas condutas serão apuradas no foro adequado.”

O advogado de Pizzolato requereu explicações sobre as outras pessoas citadas na denúncia como “outros envolvidos” juntamente com Pizzolato, mas que não foram denunciadas diante da Corte Suprema. O advogado havia tomado conhecimento pela imprensa que os outros citados estavam sendo investigados em um outro processo. E, de fato, existia um inquérito, sob segredo de justiça, em um tribunal de primeira instância, que investigava funcionário, formalmente encarregado pelo Banco do Brasil para fiscalizar a execução dos contratos de publicidade mantidos pelo banco com as agências de propaganda, função que foi erroneamente atribuída a Pizzolato pelo procurador brasileiro.

O procurador e o juiz relator, Joaquim Barbosa, inexplicavelmente, decidiram manter separada a investigação desta pessoa em um tribunal ordinário, investigado sobre os mesmos fatos atribuídos a Pizzolato. Investigação paralela, cujos resultados não constaram do processo no Supremo Tribunal Federal e não foram colocados à disposição da defesa de Pizzolato.

Esta é uma demonstração de violação do direito de defesa, a violação do princípio de igualdade, evidenciando o diferente tratamento processual recebido por Pizzolato em relação aos outros funcionários do Banco do Brasil: Pizzolato foi processado no Supremo Tribunal Federal (última instância de decisão, sem direito a qualquer recurso), enquanto o processo de outros colegas foi enviado a tribunal ordinário (primeira instância), consequência de uma escolha discriminatória e arbitrária do procurador geral com o conhecimento e concordância do juiz relator.

Assim como estes procedimentos ilegais, diversas outras irregularidades foram feitas pelo juiz relator e pelo procurador. Não se pode compreender por qual motivo Henrique Pizzolato foi condenado se existem muitos documentos que provam que ele desconhecia e não era responsável pelos fatos que foram atribuídos a ele. [1].

O Banco do Brasil e a empresa Visanet nunca reclamaram qualquer “desvio” de dinheiro. Estas empresas afirmam nos documentos que constam no processo que todo o dinheiro, considerado“desviado” pela acusação, foi, de fato, utilizado na confecção de campanhas publicitárias. Provas que inocentam Pizzolato foram desconsideradas pela Corte Suprema, documentos foram ocultados em procedimentos paralelos aos quais foram negados acesso e conhecimento à defesa com argumentos enganosos.

As graves incongruências processuais, reforçam o convencimento de um julgamento no qual a figura de Pizzolato foi instrumentalmente envolvida somente para demonstrar ou reforçar o fundamento da hipótese acusatória, isto é, que os crimes foram cometidos com dinheiro público e com a cumplicidade de um funcionário do Banco do Brasil, politicamente próximo ao partido político envolvido. Pizzolato, nos anos 80 e 90, era um representante sindical sempre ligado ao Partido dos Trabalhadores (PT).

A acusação afirmou que Pizzolato tinha ligações com o PT. Assim ele era a pessoa “certa” para envolver na acusação: um perfeito trait d’union entre o Banco do Brasil, o titular da agência de propaganda e o Partido dos Trabalhadores para demonstrar um hipotético desenho criminoso, mas que, de fato, jamais foi demonstrado.

O processo que ficou conhecido como “Mensalão”, termo utilizado para descrever supostos pagamentos mensais aos deputados, envolveu figuras de primeiro plano do Partido dos Trabalhadores: presidente e tesoureiro do partido, presidente da Câmara dos Deputados, ex-Ministro do governo Lula. Quarenta pessoas foram processadas e julgadas no Supremo Tribunal Federal, que havia competência para julgar somente três pessoas que mantiveram o cargo de Deputado Federal, quando do inicío do julgamento.

Os interesses e as consequências políticas do processo são evidentes, como demonstrado pela pressão midiática criada sobre o julgamento que foi inteiramente transmitido ao vivo pela tv e acompanhado cotidianamente pela imprensa brasileira. Esta mesma imprensa que chamou de “Batman” o juiz relator Joaquim Barbosa, enquanto visto como “o vingador contra políticos corruptos e intocáveis”. O mesmo juiz que foi responsável por diversas irregularidades processuais comprovadas documentalmente.

Existem inúmeras violações do direito de defesa no procedimento jurídico da Ação Penal 470, demonstradas pela incompetência funcional do Supremo Tribunal Federal para julgar Pizzolato, negando-lhe o direito de recorrer da sentença, as conseqüências políticas da decisão judicial, a parcialidade do juiz relator e do procurador e as inúmeras violações processuais que limitaram e comprometeram o direito de defesa.

Estas várias violações do direito de defesa fazem concluir que a extradição de Henrique Pizzolato deve ser negada porque e quando “o estradando possa ser submetido (no caso: “foi submetido”) no Estado estrangeiro requerente a um julgamento criminal injusto para execução de uma pena discriminatória ou inspirada por iniciativa de perseguição por razões políticas que lesam direitos fundamentais do indivíduo, tais como o respeito ao direito do princípio de igualdade, o direito a um julgamento justo e a proibição de tratamento desumano ou degradante de prisioneiros” (decisão tomada pela Corte di Cassazione em outro caso de extradição – Cass. Pen, Sez VI, 23.01.2014, n. 5089).

4) Informações sobre o progresso da causa de Pizzolato na Itália

Pizzolato é também um cidadão italiano e veio para a Itália em busca de refúgio e do direito à justiça que lhe foi negado no Brasil. Ele encontra-se preso desde 5 de fevereiro passado, na casa Circondariale di Modena por mandato de prisão emitido pelo Brasil.

No dia 5 de junho passado houve uma audiência na Corte de Apelação de Bolonha, com o objetivo de julgar a extradição de Henrique. A Corte decidiu adiar o julgamento para 28 de outubro, sem analisar a defesa apresentada pelo advogado (a defesa contém 76 páginas com 66 documentos anexos). O motivo do adiamento deveu-se a um novo documento enviado pelo Ministério Público brasileiro, que chegou no mesmo dia 5, apresentando “opções” de penitenciárias brasileiras para Pizzolato e a Corte argumentou que não houve tempo para analisar estas informações (informações requeridas pelo procurador italiano no dia 15 de abril e que foram respondidas pelo procurador brasileiro somente depois de 50 dias).

A decisão da Corte de adiar a audiência para o dia 28 de outubro expõe Pizzolato, pessoa de 62 anos, ao menos por mais 5 meses detido em regime fechado. Ele já cumpriu 4 meses (de 5 de fevereiro a 5 de junho).
Mesmo que ele já esteja cumprindo uma pena de toda injusta em prisão na Itália, seu maior temor, sentimentos de pavor e medo (como descreve a psiquiatra da prisão) é devido à possibilidade de ser extraditado para cumprir pena nas prisões brasileiras.

Este sentimento deve-se a fatos reais, embora velados (ocultados) que são intangíveis e incontroláveis, por parte do Estado brasileiro: a corrupção da polícia carcerária e a existência de facções (grupos narcotraficantes) nas penitenciárias que ameaçam, extorquem, torturam e matam prisioneiros que, por sua vez, não têm a menor possibilidade de se defenderem.

5) Condições das prisões brasileiras

Existem diversas denúncias relativas às prisões brasileiras apresentadas por organismos internacionais de direitos humanos.

Amnesty International: relatório de 2013: “continua a aumentar o número de pessoas detidas. A falta de mais de 200.000 postos fez com que o sistema prisional fosse caracterizado por condições de vida desumanas e degradantes. No estado do “sonho”, os prisioneiros são trancados em celas fedorentas, superlotadas e inseguras. Mulheres menores foram aprisionadas nas mesmas unidades dos homens e foram recebidos inúmeros relatos de tortura, como sinais de asfixia com saco plástico, espancamentos e choques elétricos. Estas denúncias envolviam membros da polícia militar do Estado.”

Human Rights Watch: No relatório de 2014, a organização continua a encontrar generalizadas e graves condições de superlotação e violência que afligem as prisões brasileiras, também deficientes e carentes de condições sanitárias. Neste relatório vem declarado como a tortura é um “problema crônico” nos centros de detenção, enfatizando que a Sub-Comissão das Nações Unidas para a Prevenção da Tortura e de outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes havia recebido inúmeros e consistentes relatos de maus-tratos por parte dos prisioneiros. Além disso, enfatiza como os agentes da ordem, autores de tais abusos contra os detentos presos, raramente são levados à justiça.

Em 17 de dezembro de 2013 foi um escândalo a disseminação de um vídeo feito no interior do Complexo Penitenciário de Pedrinhas no Maranhão. No filme gravado com um celular de outro detento se vê o chão coberto de sangue e os corpos de três presos degolados, crivados de facadas e queimaduras, que foram assassinados depois de um confronto entre gangs dentro da prisão. http://www.liveleak.com/view?i=afc_1389180612

A gravidade dos fatos apurados é de fato chocante: o vídeo http://www.liveleak.com/view?i=41d_1388287576 , definida como “a cena mais bárbara que eu já vi”, segundo palavras do juiz do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que descreve a agonia de um homem com a perna totalmente cortada e torturado até a morte, enquanto o vídeo http://www.liveleak.com/view?i=79a_1397049910 retrata um prisioneiro esfaqueado repetidamente. Estas torturas e assassinatos ocorrem quando os prisioneiros não se alinham com alguma das gangs que ditam as leis dentro da penitenciária. No momento do ingresso na prisão, os mesmos agentes penitenciários obrigam o detento a aderir a uma gang. Recém chegados, os detentos recebem imediatamente ordens para conseguir dinheiro, telefones celulares e drogas, e devem pedir ajuda a todos os membros da família; se não cumprirem tais ordens serão punidos severamente. Neste caso, o juiz do CNJ descreveu aquele do preso que entrou pela primeira vez na prisão, por ter roubado pneus, e foi encontrado decapitado como aparece no vídeo.

Esta notícia teve uma grande repercussão a nível internacional, foram 63 assassinatos no Complexo de Pedrinhas no ano de 2013, o que resultou na intervenção imediata do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH).

Apesar disso, recente inspeção realizada no início de julho de 2014, denunciou que no primeiro semestre deste ano 12 mortes já foram registradas na Penitenciária de Pedrinhas e a medida cautelar expedida pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, que pedia o compromisso do Estado brasileiro para a melhoria das condições carcerárias e o fim da violência, não foi atendida.

No passado 26 de maio de 2014, o relator especial das Nações Unidas contra a Tortura, Juan Mendez, declarou que a revista corporal de prisioneiros e suas famílias, chamada de”revista vexatória”, representa um tratamento cruel, desumano e degradante, contrário às normas internacionais para a proteção da dignidade das pessoas. Este modo de busca, consiste na obrigação para os visitantes (incluindo mulheres idosas, crianças e meninas com deficiência) de despir-se, curvar-se várias vezes, abrindo o ânus e a vagina e serem inspecionadas pelos guardas prisionais.

http://ponte.org/revistas-vexatorias-na-fundacao-casa-e-a-rotina-de-prisioneiros/
O mesmo juiz que conduziu a condenação de Pizzolato declarou diante dos alunos do Kings College de Londres, 30 de janeiro de 2014, que “As prisões brasileiras são inadequadas para os seres humanos. No ano passado, visitei algumas e a melhor palavra para definir é “horror”.

O juiz relator, Joaquim Barbosa, que investigou, dirigiu todas as fases do processo e também julgou, admitindo que aplicou penas exarcebadas, também se autoproclamou juiz de execução. Apesar das sentenças para os réus expoentes do PT (Pizzolato não era expoente) serem para cumprimento de pena em regime semi-aberto, permitindo inclusive o trabalho externo, Barbosa considerou que era necessário que a sexta parte da pena fosse cumprida dentro da instituição penitenciária. Tal decisão arbitrária, provavelmente justificada pela aversão pessoal do juiz relator Barbosa para com os prisioneiros ilustres da AP 470, foi denunciada por várias organizações, incluindo a Pastoral Carcerária (que sempre trabalhou pelos direitos dos prisioneiros) e pela Comissão de Justiça e Paz do Brasil, através da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Estas organizações, em um artigo de 15 de maio de 2014, e nota de 22 de maio evidenciaram que as repercussões desta decisão do juiz Barbosa poderia reverberar em outros 100 mil detentos, agravando ainda mais os problemas reais e terríveis do sistema prisional no Brasil.
http://carceraria.org.br/nota-da-pastoral-carceraria-sobre-o-mensalao-estamos-onde-sempre-estivemos.html
http://legcruz.jusbrasil.com.br/noticias/120285723/cbjp-emite-nota-sobre-acao-penal-470

Nota [1] As contradições nas acusações contra Pizzolato

Não se pode compreender por qual motivo Henrique Pizzolato foi condenado se existem muitos documentos que provam que ele desconhecia e não era responsável pelos fatos que foram atribuídos a ele.

A denúncia apresentada pelo procurador diz que, desde o ano de 2000, os dirigentes do Banco do Brasil: o Gerente Executivo de Propaganda e Diretores de Marketing, responsáveis pelo acompanhamento e fiscalização dos contratos de publicidade deste banco, teriam permitido (ou melhor se omitido de verificar) que a agência DNA Propaganda, recebia dos fornecedores uma comissão denominada “bônus de volume” que deveria ser integralmente devolvida para o Banco do Brasil.

Se o procurador acusa um ilícito que vinha ocorrendo desde o ano 2000, inclusive com a participação do Gerente Executivo de Propaganda, e Pizzolato somente assumiu o cargo de diretor no ano 2003, não se compreende porque somente Pizzolato foi o único responsabilizado e acusado no processo diante do Supremo Tribunal Federal.

Por que o procurador acusa outros funcionários do Banco do Brasil, mas “seleciona” somente Pizzolato para ser processado no Supremo Tribunal Federal? Quem era o responsável pela conduta praticada no período de 2000 a 2003? Por que as outras pessoas que são citadas pelo procurador não foram também denunciadas no Supremo Tribunal Federal?

Cláudio de Castro Vasconcelos, citado na denúncia como o Gerente Executivo de Propaganda, que ocupava este cargo desde o ano de 1999, era o funcionário formalmente indicado pelo Banco do Brasil para acompanhar e fiscalizar a execução dos contratos de publicidade. Este funcionário, inexplicavelmente, foi investigado em outro processo diante de um tribunal de primeira instância, enquanto Pizzolato foi processado em tribunal de última instância. Uma decisão arbitrária e ilegal do procurador ao separar processos que tratavam de mesmos fatos, com o conhecimento do juiz relator, Joaquim Barbosa.

Por que o Gerente Executivo de Propaganda, funcionário responsável por acompanhar e fiscalizar a execução dos contratos de publicidade mantidos pelo Banco do Brasil com as agências de publicidade, citado na denúncia do procurador como responsável pelo mesmo fato atribuído a Pizzolato, foi processado em outro tribunal?

O Tribunal de Contas da União, tribunal competente para fiscalizar contas de empresas públicas, concluiu e decidiu em agosto de 2012 que os “bônus de volume” não eram devidos ao Banco do Brasil. Esta decisão se fundamentou em Lei que foi proposta pelo então Deputado Federal José Eduardo Cardoso (atual Ministro da Justiça) e foi sancionada pelo Presidente Lula no ano de 2010 – Lei 12.232/2010. A Lei regulamentou o que já era uma prática no mercado. O próprio Banco do Brasil jamais reclamou e nunca cobrou a devolução dos chamados “bônus de volume”.

(Bônus de Volume é um plano de incentivo (prêmio) oferecido de forma facultativa pelos veículos de comunicação para as agências de publicidade (semelhante ao oferecido pelas companhias aéreas aos seus clientes) . É pago em função do volume de publicidade proveniente de contratos atendidos por uma mesma agência – sejam contratos com empresas públicas ou privadas. Os “bônus” (dinheiro) que as agências recebem são receitas legítimas provenientes de uma relação exclusivamente privada entre o veículo de comunicação e a agência de publicidade, da qual nem o funcionário público, nem a empresa que contrata a agência de publicidade participam.)

Pizzolato foi acusado e condenado por um crime que, segundo a Lei, não é crime!!!

Por que o Supremo Tribunal Federal desconheceu a decisão do Tribunal de Contas da União e desconheceu a Lei (12232/2010) que inocentam Pizzolato?

O procurador acusa Pizzolato de haver favorecido a agência DNA Propaganda ao prorrogar o contrato de publicidade que vigorava desde o ano de 2000.

Os documentos do Banco do Brasil, comprovam que a decisão para prorrogar o contrato com a agência DNA Propaganda foi tomada pelo Conselho de Administração do Banco do Brasil, composto pelo Presidente do banco e sete Vice-presidentes na data de 04.02.2003, portanto ANTES de Pizzolato assumir o cargo de Diretor de Marketing na data de 17.02.2003.

Por que Pizzolato foi acusado por haver prorrogado o contrato para favorecer a agência DNA Propaganda se a decisão já havia sido tomada ANTES dele assumir o cargo de Diretor de Marketing?

A outra acusação constante na denúncia diz que Pizzolato e Luiz Gushiken, em atuação orquestrada, haviam subtraído no período de 2003/2004, em favor da empresa DNA Propaganda (comandada por Marcos Valério) e do Partido dos Trabalhadores, vultosas quantias do Fundo de Investimento Visanet, constituído com dinheiro do Banco do Brasil.

Primeiramente, o Fundo de Incentivo Visanet (não de Investimento, como erroneamente o procurador escreveu na denúncia), não era constituído com dinheiro público (do Banco do Brasil), mas se tratava de um fundo de propriedade da Visa Internacional (sociedade privada) para ser utilizado em campanhas publicitárias da marca VISA pelos bancos brasileiros parceiros da Visanet, como se lê em documento enviado na data de 11.10.2005, assinado, na época, por executivo do Banco do Brasil que atualmente é o Presidente do Banco, Aldemir Bendine.

Por que o Supremo Tribunal Federal considerou que o dinheiro do Fundo Visanet era público se as empresas, Visanet e Banco do Brasil, afirmam que o dinheiro era privado?

A acusação diz que Pizzolato recebeu vantagem em dinheiro para liberar pagamentos com o dinheiro do Fundo de Incentivo Visanet para a agência de publicidade DNA Propaganda.

Pizzolato, no cargo de Diretor de Marketing, não tinha poder para liberar ou efetuar pagamentos para agências de publicidade.

Como estabelecido no Regulamento do Fundo de Incentivo Visanet, os bancos que optassem por utilizar o dinheiro do fundo para campanhas publicitárias da marca VISA, deveriam nomear um representante responsável por todos os trâmites requeridos pela Visanet. O Banco do Brasil nomeou o funcionário Léo Batista dos Santos, responsável por apresentar as propostas de ações de incentivo (campanhas publicitárias) para avaliação da Visanet e responsável para requisitar que a Visanet efetuasse os pagamentos para as empresas executoras destas campanhas (inclusive para a DNA Propaganda).

As comprovações disto, são as propostas e faturas que, Léo Batista dos Santos (Gerente de Divisão) e Douglas Macedo (Gerente Executivo), ambos funcionários da Diretoria de Varejo do Banco do Brasil, enviaram à Visanet, no valor de 73 milhões de reais, dito “desviado”, solicitando que a Visanet efetuasse os pagamentos para a agência DNA Propaganda de Marcos Valério (dados que são confirmados pela perícia ocultada no Inquérito paralelo 2474). A empresa Visanet efetuava os pagamentos diretamente para a DNA Propaganda em conta bancária que Pizzolato não tinha nenhum acesso.

Isto comprova que Henrique Pizzolato não tinha poder para decidir, nem dispor sobre pagamentos com dinheiro do Fundo Visanet. Pizzolato não tinha poder para requisitar que a Visanet efetuasse pagamentos para a DNA Propaganda.

Todos os documentos enviados para a Visanet, requisitando pagamentos, foram assinados pelo gestor, Léo Batista dos Santos.

Por que o Supremo Tribunal Federal considerou que Pizzolato era responsável por determinar pagamentos com dinheiro do Fundo Visanet, se os documentos comprovam que era outro funcionário, de outra diretoria do Banco do Brasil, que tinha esta função?

Por que a empresa Visanet, que efetuava os pagamentos diretamente para a DNA Propaganda e era responsável por averiguar se o Banco do Brasil utilizava corretamente ou não o dinheiro do Fundo Visanet, nunca reclamou qualquer ilicitude/crime?

Ao contrário do que a acusação diz “os serviços não foram prestados, as propagandas não existiram, pois o dinheiro foi desviado para o PT”, a Visanet, proprietária e responsável por verificar a correta utilização do dinheiro do Fundo Visanet, enviou documento (30.10.2006) ao Banco do Brasil, afirmando que o valor de 73 milhões foi totalmente utilizado em campanhas publicitárias. O Banco do Brasil, em documento enviado no dia 17.11.2006, confirma que “com as ações desenvolvidas, os objetivos do Fundo de Incentivo Visanet, de fato, foram atingidos. A propósito, no período de 2001 a 2005, houve um incremento da ordem de 149% e 137% no volume e faturamento, respectivamente, dos cartões de crédito emitidos pelo Banco com a marca Visa.”

Por que Pizzolato foi acusado criminalmente pelo desvio de 73 milhões, se as empresas: Banco do Brasil e Visanet jamais constataram qualquer desvio e, mais, afirmaram que o valor foi totalmente utilizado em campanhas publicitárias?

Nota: Esta é somente uma síntese da defesa apresentada pelo advogado Alessandro Sivelli que foi entregue no dia 30 de maio para a Corte de Apelação de Bolonha. Obviamente, este breve resumo não compreende todos os detalhes e todos os argumentos contidos na íntegra da defesa.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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