Bem informado é quem lê ou quem não lê jornais?


Por Theófilo Rodrigues*

A recente entrevista concedida pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso aos jornalistas Mario Magalhães e Josias de Souza no portal Uol trouxe novamente o debate sobre a qualificação do voto à baila. De acordo com FHC, “o PT está fincado nos menos informados, que coincide de ser os mais pobres. Não é porque são pobres que apoiam o PT, é porque são menos informados”.

A tese do sociólogo e ex-presidente teve grande repercussão na mídia e nas redes sociais. Arnaldo Jabor em sua coluna semanal no jornal O Globo a reverberou, ainda que sem mencionar a liderança do PSDB. Para Jabor “é necessária uma cartilha bem clara para a população que se perde nesse sarapatel de mentiras e manipulações da candidata a presidenta”. Diz ainda que “ao contrário do que diz Dilma, os pobres que não puderam estudar são, sim, absolutamente ignorantes sobre os reais problemas brasileiros”.

Linha parecida já havia sido publicada pelo editorial de 12 de setembro de O Globo. Na opinião do jornal “o partido [PT] terá de repensar propostas, para escapar da imagem da legenda apenas dos pobres, mal instruídos, dos grotões do país”.

Curiosamente a tese também é compartilhada, ainda que de forma enviesada, por um senador petista. Paulo Paim utiliza o argumento da crítica aos eleitores desinformados para defender o fim do voto obrigatório. “Penso que está na hora de acabar com a ilusão de que o voto obrigatório gere cidadãos politicamente evoluídos. É uma falácia. (…) Uma massa de eleitores desinformados que vende o voto porque é obrigado a votar diminui a legitimidade do sistema”, acredita o senador.

Afirmar que Lula e Dilma tiveram de 2006 para cá o voto das camadas mais pobres da população é uma coisa. Intuir que isso se deu por serem esses eleitores desinformados é outra coisa completamente diferente.

Aliás, a própria expressão “voto consciente” nem deveria ser incluída como categoria sociológica, por tão imprecisa que é. A definição mais próxima do que isso significa seria algo mais ou menos assim: “voto consciente é o meu, voto inconsciente é o dos outros”.

Pensando nisso, poderíamos inverter a questão: e se disséssemos que voto desinformado é o de quem acorda com a TV no programa da manhã, lê o seu jornal matinal, vai para o trabalho ouvindo a rádio que toca notícias, passa a tarde acessando um grande portal na internet e termina o dia assistindo o noticiário da TV por assinatura? Muitas informações em vários veículos diferentes, não é? Todas vindas da mesma empresa.

Desde Gramsci, passando por Althusser e Poulantzas, sabemos do poder de deformação ideológica e criação de consensos que esses veículos de comunicação possuem. A intelectual estadunidense Ellen Wood chega a afirmar que “um dos exemplos mais óbvios da visão distorcida produzida pela mera dicotomia entre o Estado como sede da coação e a sociedade civil como o espaço livre é o grau em que as liberdades civis, como a liberdade de expressão ou de imprensa nas sociedades capitalistas, são medidas não pela variedade de opiniões e debate oferecidos pela mídia, mas pelo grau em que as empresas de comunicação são propriedade privada e o capital é livre para lucrar com elas. A imprensa é livre quando é privada, mesmo que seja uma fábrica de consenso”.

O que cria a desinformação é o monopólio da informação. Mas a história já nos ensinou que nenhum império pode durar para sempre.

*Theófilo Rodrigues é cientista político, coordenador do Barão de Itararé no Rio de Janeiro e colunista no blog O Cafezinho.

Camilo Árabe:

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