A disputa eleitoral no Rio de Janeiro veio para o centro do palco da política nacional. Nos últimos dias, houve uma rápida movimentação nas peças do jogo, e a mídia, tucana como sempre, tem procurado contar uma história de vitórias para Aécio Neves.
Não é bem assim.
Em primeiro lugar, é preciso entender que a aparente loucura das alianças não é um movimento caótico, aleatório, mas antes uma sucessão de decisões encadeadas umas nas outras.
O PT lança um candidato próprio, enfurecendo o PMDB, que cria uma dissidência para apoiar Aécio.
O PSB fluminense, por sua vez, sempre teve uma ala fortemente dilmista. Quando Eduardo Campos bateu pé em relação à sua candidatura presidencial, Alexandre Cardoso, prefeito de Caxias, e principal nome do PSB no Rio, decidiu sair do partido para não sair da base de Dilma Rousseff.
Então o PSB do Rio, num gesto costurado pelo próprio vice-presidente da legenda, Roberto Amaral, decide se coligar ao PT. Esse é um fato político de importância talvez fundamental nessa campanha.
A mídia quer mostrar que Aécio conseguiu dividir o palanque de Dilma no estado. Ora, Dilma já tem palanque demais no Rio. E o tempo de TV do PMDB de Pezão já está garantido para o PT.
O que Dilma conseguiu no Rio foi antes abrir uma ponte com Eduardo Campos, num dos estados onde Marina Silva obteve a seu melhor desempenho em 2010.
Ou seja, Dilma entregou um pião (a dissidência do PMDB) para comer uma torre (o PSB).
Ontem, outra novidade. Através de uma articulação com Dilma, o PROS, que também andava flertando com Lindberg, adere à campanha de Garotinho, líder nas pesquisas no estado.
Aí o cálculo é um pouco mais complicado. Eu diria que Dilma entregou uma torre em troca de dois cavalos.
Ela gera um pequeno (na verdade, quase imperceptível) prejuízo de tempo de TV para Lindberg, mas se aproxima de Garotinho, cujo eleitorado, concentrado na baixa renda, se confunde com o de Dilma no estado. Um movimento de oposição radicalizado de Garotinho poderia trazer danos importantes à reeleição dela. A articulação para dar o PROS a Garotinho afasta esse risco.
A decisão do PMDB de lançar César Maia (DEM) para o senado tem a mão grande e pesada de Sérgio Cabral. Não consigo entender senão como um gesto desesperado e traiçoeiro. Como analisou o Fernando Brito, Cabral trocou Dilma, que ainda tem liderança absoluta nas pesquisas eleitorais, por um decadente César Maia, um isolacionista, que faz oposição até a si mesmo.
A entrada de César Maia enfureceu o prefeito Eduardo Paes, que apesar da sua crise de popularidade, ainda é o mais importante quadro do PMDB fluminense, e deve esfriar sua participação nas eleições. E afasta a família Garotinho da oposição.
Clarissa Garotinho, deputada estadual e filha do ex-governador, se apressou em divulgar, ontem, um texto intitulado: “FOI UM ERRO TER SIDO VICE DE RODRIGO MAIA”, em que explica o seu arrependimento de ter integrado chapa de Rodrigo Maia, filho de César, nas eleições municipais de 2012.
O fato é que o Rio de Janeiro se tornou, mais que nunca, crucial nessa campanha. Com Alckmin mantendo uma força surpreendente em São Paulo, e com Aécio devendo obter uma vitória folgada em Minas Gerais, a votação no Rio terá importância matemática talvez determinante para a Dilma Rousseff e, consequentemente, também para a oposição.
Neste sentido, repito, a aliança com o PSB é a grande jogada. A entrada de César Maia na chapa de Pezão, e a emergência de Jorge Picciani, presidente do PMDB-RJ, como cabo eleitoral mais entusiástico do chamado “Aezão”, além da figura de Sérgio Cabral, joga todos os símbolos de conservadorismo para o lado de Aécio. Mais que nunca ele terá a pecha de ser o candidato da “direita”, num estado com forte tradição de votar na esquerda, nem que seja numa esquerda de costumes conservadores, uma esquerda “evangélica”, como a representada por Garotinho.
Marcelo Santos
25/06/2014 - 22h22
Ou seja, a incoerência não está no âmbito estadual, e sim no federal.