Paulo Moreira Leite e a defesa radical da blogosfera e da pluralidade democrática

Num gesto de coragem extraordinária, o jornalista Paulo Moreira Leite, chefe da sucursal da Istoé em Brasília, acaba de publicar um artigo que constitui uma enfática defesa do direito dos blogueiros de existir, e de não serem perseguidos covardemente pela grande imprensa.

Digo extraordinária, porque Leite se insurge contra reportagem da própria Istoé, que publicou esta semana matéria totalmente sem pé nem cabeça, inventando um “bunker de calúnias”, a funcionar a partir da prefeitura de Guarulhos.

Isso porque a revista descobriu, e não foi difícil porque era informação pública, aberta e transparente, que dois blogueiros publicavam anúncios institucionais da prefeitura. A revistou usou uma informação banal para caluniar. E agora sabemos que também mentiu: não há nenhum inquérito aberto no Ministério Público estadual sobre o caso.

Leite observa que blogueiros também tem direito a anúncios institucionais sem que se lhes acuse de nada, porque a imprensa tradicional recebe, desde sempre, milhões e milhões desse tipo de financiamento. Na verdade, a grande mídia disputa ferozmente cada centavo que sai das administrações federal, estaduais e municipais. Cada centímetro seu é vendido a preço de ouro. A um preço superfaturado, diga-se de passagem.

O jornalista vai mais longe, e defende uma nova regulamentação da mídia, que proteja os pequenos empreendedores de comunicação, como são os blogueiros, ao invés de servir apenas aos interesses de grandalhões pesados, que já não refletem a pluralidade da democracia brasileira.

A coragem, quando nasce, é sempre um espetáculo. Um espetáculo raro, bonito, profundo.

Parabéns, Paulo.

Os gladiadores romanos saudavam o imperador com uma frase trágica: “salve, César! Os que vão morrer te saúdam!”

O seu texto me deu a ideia de fazer uma paródia com sentido inverso: “Salve, Paulo! Os que vão viver te saúdam!”

Os blogueiros são uma espécie de gladiadores da nossa democracia, lutando em prol de informações e opiniões que fujam desse maldito consenso corporativo da grande mídia. Um falso consenso, neoliberal, antipopular, antinacional. Mas não querem morrer para glória de nenhuma liderança política, partido ou ideologia. Se estamos mesmo numa democracia, a pluralidade tem de ser protegida com muito carinho pela sociedade e pelas leis, porque é nela em que poderão nascer e proliferar, efetivamente, os germes de um futuro autenticamente democrático em nosso país.

Leia o texto.

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CAÇANDO BLOGUEIROS

Por Paulo Moreira Leite, em seu blog.

Quem impede o debate sobre a democratização dos meios de comunicação força o jogo na sombra de verbas públicas

Vamos falar da substância das coisas. A caçada a blogueiros simpáticos às conquistas criadas no país depois da posse de Lula, em 2003, iniciada com a investigação sobre um suposto “bunker” do PT na prefeitura de Guarulhos, deve ser visto como aquilo que é.

Uma tentativa autoritária de silenciar vozes que divergem do monopólio político da mídia.

Sei que essa frase parece panfleto esquerdista mas não é.

Num país onde 141 milhões de eleitores foram transformados em reserva de mercado de uma midia monopolizada pelo pensamento conservador, a internet tornou-se um espaço de resistência de uma sociedadde contraditória e diversificada. Todo mundo – direita, esquerda, centro, nada, tudo, xixi, cocô – está ali.

Vamos combinar. Hipocrisia demais não funciona. Truculência também não.

Até para ter um pouco de credibilidade, sem traços claros de ação eleitoral, a denúncia contra bloqueiros deveria ser acompanhada pela exposição pública da contabilidade dos grupos de mídia que loteiam cada minuto de sua programação e cada centímetro quadrado de suas páginas com milionárias verbas de publicidade federal, estatual, municipal – sem falar em empresas estatais.

Estamos falando de serviços de mendicância publicitária, de caráter milionário.

Seguido o método empregado em Guarulhos, seria didático exibir cada cifrão ao lado de cada pacotão de texto e fotos, concorda? Teriamos bom circo por meses e meses.

Tentar criminalizar blogueiros pela denuncia de gastos públicos – uns caraminguás, pelos padrões de mercado — é um esforço que apenas trái uma visão contrária à liberdade de imprensa, típica de quem não aceita diversidade nem contraponto, mas apenas elogios e submissão. É o pensamento único em método linha dura e capa de falso moralismo. Apesar do escândalo, é uma denuncia verbal-investigativa. Nada se provou de ilegal.

Nós sabemos qual é a questão de fundo.

Enquanto não se aceitar o debate sobre democratização dos meios de comunicação, que poderia permitir uma discussão pública, às claras, expondo imensos interesses econômico e politicos em conflito, como se fez em vários países avançados do capitalismo, o jogo nas sombras será inevitável. Isso porque as pessoas precisam receber informações, falar, conversar, dar opiniões. Elas concordam, discordam, rejeitam e querem mais.

Não adianta adiar a chegada de um novo grau de democracia e civilização. Ela transborda. Na agonia do regime de 1964, quando a imprensa amiga dos generais chegava a proteger a ditadura por todos os meios — inclusive derrotas eleitorais eram transformadas em vitória — os governadores de oposição financiavam nova publicações, sem ranço e sem compromentimento. Enquanto isso, até jornais alternativos, de faturamento menor do que a quitanda da esquina, eram alvo de uma devassa permanente por parte da ditadura. Empresários privados eram pressionados a saber quem ajudar — e a quem negar ajuda.

Aparelhismo?

Os últimos anos mostraram – e os blogueiros expressam isso — que o país não cabe nos limites mentais, políticos, culturais, do ideário conservador. Quer mais, quer diferente e por três vezes disse isso nas urnas. A internet e os blogueiros expressam isso. Têm este direito.

Alguma dúvida?

Este é o debate.