Eis o maior pesadelo da democracia brasileira, a meu ver. Já nas últimas eleições, de 2010, tivemos esse problema, com aquela procuradora eleitoral, Sandra Cureau, que só tinha olhos para o PT, e estava toda hora nos jornais dando declarações notoriamente partidárias.
Parece que este ano teremos o mesmo problema.
Digo que é o maior pesadelo, porque é uma coisa até pior do que termos uma mídia conservadora. A mídia, mal ou bem, é privada, e sempre encontrará brechas para ser partidária e defender seus interesses econômicos.
O TSE não pode entrar nessa. A gente sabe, porém, como as coisas funcionam. Os técnicos e juízes do TSE pertencem justamente àquela camada social mais vulnerável às manipulações da grande mídia. A turma do saguão dos aeroportos, cujo maior preocupação é com a elevação do custo dos empregados domésticas, que antigamente eram submissos e exigiam pouco, e que vem se tornando cada vez mais altivos e exigindo maiores salários.
Eu disse que não gostei da propaganda do PT, por achá-la negativista demais, num momento em que precisamos combater o pessimismo vira-lata que a mídia quer impor ao país. Mas não sou marketeiro político e suponho que o vídeo foi resultado de um árduo trabalho de pesquisa.
Agora, proibí-lo porque critica a oposição? Peralá! O TSE quer proibir que os partidos falem de política?
Não. Não quer, porque a oposição pode fazer propaganda negativa do presente, com vistas a fazer crítica ao partido no governo. Normal. Oposição é para isso mesmo. Só que a justiça tem de ser equilibrada. Se a oposição tem direito de falar mal do presente, a situação tem direito de falar mal do passado!
É uma matemática simples e óbvia.
Se não age assim, então vou entender que o Judiciário está sendo partidário. Está sendo conservador. Está sendo de direita!
Se o PT ganhar estas eleições, será uma vitória histórica: contra a mídia, contra a classe média antibrasil, contra um Judiciário manipulador e de direita.
Eu acho que estamos no limiar de uma mudança diferente da que vimos anteriormente. O Brasil experimentou mudanças materiais profundas nos últimos anos. Mudanças que nos levaram a um patamar mais elevado de civilização. Como diria o ministro Barroso, nos afastamos um pouco de nosso crônico déficit civilizatório.
Se o PT ganhar as eleições, estas mudanças materiais terão a chance de se desdobrar, de maneira profunda, para a cultura política.
De certa maneira, a criminalização do PT, com o mensalão, é a raiz de todas essas perseguições. Para um determinado segmento, tudo que o PT faz é ilegal, imoral ou engorda.
Já o PSDB pode roubar à vontade, pode contratar abertamente milhares de mercenários virtuais, pode comprar reeleição, pode afundar a maior plataforma de petróleo do mundo, pode ficar 30 anos sem investir em estrutura hídrica e deixar São Paulo sem água, ou com água suja de volume morto. Não importa. Ninguém criminalizará o partido dos homens bons.
Por isso mesmo, a campanha do PT não pode ser uma campanha puramente eleitoral. Tem de ser uma campanha política, construída politicamente através do diálogo aberto e democrático com a população.
Para isso, é preciso sair da TV e ir para a internet. A TV é vertical e autoritária. A internet sim, é a expressão da democracia.
Eu tenho uma teoria maluca segundo a qual a internet pode ser ainda mais democrática do que a rua. Porque a rua implica num recorte antropológico e geográfico muito especial. Nem todo mundo pode ir à Paulista todos os dias. A começar pelos que não moram perto. Tem gente que é jovem demais para ir à rua (crianças); outros velhos demais; outros não podem andar; outros estão doentes; outros não gostam de chuva; outros não suportam calor; outros não gostam de frio. Além do mais, a rua mostra energia, disposição, mas não discute. E o indivíduo não existe na rua. A rua mostra o coletivo, a força de um grupo, ou grupos. A rua mostra quantidade. A internet mostra qualidade, e permite o debate qualificado.
Por isso, a coisa mais democrática que o governo pode fazer pela sociedade é oferecer infra-estrutura de banda larga a todo país. Essa é uma bandeira democrática que o TSE poderia abraçar. Obrigar o Estado a suprir banda larga a todo país, e obrigar os candidatos a terem sites completos, registrados no TSE. Ao invés disso, o TSE prefere patrocinar anúncios sobre “votar limpo”, o que já mostra um recorde ideológico muito claro, porque liga o voto ao moralismo de ocasião da imprensa partidária. Limpo é o candidato blindado e protegido pela imprensa. O candidato atacado pela imprensa não é limpo.
O TSE não tem direito de usar nenhum adjetivo. O cidadão tem que votar bem informado, e isso supõe acesso a fontes plurais de informação. Então o TSE poderia fazer propaganda advertindo o eleitor a se informar sobre seus candidatos através de fontes variadas, alertando-o para jamais confiar na primeira denúncia ou no primeiro elogio que ver na mídia.
Abaixo, a matéria do Fernando Brito que me inspirou a escrever esse artigo.
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A lógica do TSE: dizer que o Brasil está um caos, pode; que estava um caos, não pode
Por Fernando Brito, no Tijolaço.
Eu, como sou “das antigas”, tenho apreço por aquela regra lógica da transitividade, que diz que se a=b e b=c, então a=c. Ou o mesmo para melhor, pior, maior, menor.
Como estamos numa democracia, é livre (e legítimo) um partido político criticar a situação econômica do país.
O PSBD, por exemplo, veiculou comerciais onde uma atriz simula uma passageira de ônibus que tenta mostrar que os eleitores de Lula e Dilma não estão satisfeitos com o governo atual.
Claro que é propaganda eleitoral negativa.
Portanto, não se pode entender que o TSE entenda que, para fazer propaganda negativa de seus antecessores, o comercial do PT seja considerado uma transgressão à lei da propaganda gratuita.
E o mande tirar do ar.
A não ser que estivesse acontecendo uma impensável simbiose de simpatias entre o TSE e a oposição.
O PSDB se sente atingido, a mídia cria o clima de que é “propaganda eleitoral” indevida (se for, o outro não é?) e o TSE cassa a peça publicitária.
Mas, como já ficou evidente que aquela regrinha da transitividade não vale no TSE, então não pode ser isso.
Ficamos assim, então: a oposição pode criticar o governo e o partido do governo não pode criticar a oposição.
Viva a democracia!
PS. Particularmente, acho ótimo que o PT tenha de fazer outro comercial para colocar no lugar. Eu não gosto nada de propaganda negativa, embora esta, pela falta de qualquer crítica na mídia ao período santificado do beato Fernando Henrique Cardoso, quando o Brasil era uma maravilha, tenha sido um soco no estômago da hipocrisia.