O comercial do PT e alguns pitacos críticos da blogosfera

Reproduzo abaixo uma análise do jornalista e blogueiro Luiz Carlos Azenha. Jornalista de formação clássica, talvez um dos últimos no país, Azenha se mantém crítico e desconfiado, e não apenas analisa o último comercial do PT, que tanto impacto causou na oposição, como pondera sobre a própria dinâmica que obriga o governo a lançar mão de estratégias midiáticas de grande impacto.

Eu não gostei do anúncio. Achei terrivelmente depressivo. O Brasil está precisando lutar contra o baixo astral, não aumentá-lo. Mas também não suporto ufanismo. Gostaria de ver um partido tendo a coragem de mostrar seus próprios erros, e usar a interação com o público para corrigi-los. A importância da propaganda eleitoral na TV é que ela pode potencializar conceitos na rede. Vídeos veiculados originalmente na TV podem ser mais vistos na internet do que na própria TV. O sucesso do canal Porta dos Fundos, que já teve mais de 900 milhões de visitas (sic), prova isso.

O comercial, além disso, não usa a internet, não convoca os espectadores a entrarem nas redes sociais da campanha para se informarem mais e interagirem, o que eu acho um desperdício. Não traz nenhum conceito novo. Apenas trabalha com o medo de um retrocesso, que é real, mas que não pode ser o sentimento predominante de um partido que ainda se acredita transformador. Se a oposição vier agora com um comercial cheio de otimismo e esperança, teremos uma situação irônica. Os partidos que trabalham, diuturnamente, junto com a mídia, com o pessimismo, a depressão, o mal estar, poderão mostrar a si mesmos como paladinos de novas esperanças e novas alegrias.

Mas, enfim, não sou marketeiro. Só um blogueiro atrevido.

Abaixo, a análise de Azenha:

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Anúncio do PT: Comercial eficaz num meio em decadência

publicado em 14 de maio de 2014 às 21:53

Quantos jovens vão se impressionar com isso?

por Luiz Carlos Azenha, no Viomundo.

No Brasil, é assim: a eficácia do comercial do PT que explora o temor de uma volta ao passado, nas eleições de 2014, deve ser medida pela reação não só de líderes oposicionistas, mas também de colunistas e editores da mídia corporativa. Chiaram muito? É, então, o caminho.

Desde a improvável reeleição de Lula, em 2006, precedida por uma poderosa campanha midiática ligada ao escândalo do mensalão, o PT depositou todas as suas fichas na tabelinha Lula/João Santana. Concentrou-se no que Plinio de Arruda Sampaio batizou de “melhorismo”. Politizar as pessoas que ascenderam socialmente desde 2003 exigiria incluí-las nas decisões governamentais, em todos os níveis, o que possivelmente as colocaria em choque com os interesses das alianças ditas necessárias à governabilidade.

As decisões de gabinete, entre quatro paredes, sem transparência, permitem o toma-lá-dá-cá que sustenta tais alianças — desde que o povo fique longe delas. Por isso, o PT adotou um pêndulo: se aproxima dos movimentos sociais e, portanto, das ruas, em período eleitoral, para se afastar logo depois de conquistar um novo mandato.

Em 2013, o partido, tanto quanto todos os outros, foi surpreendido por um fato político que ajudou a criar: a ascensão social destapou uma série de demandas daqueles que subiram de vida. Querem, essencialmente, serviços públicos de melhor qualidade. Algumas pessoas, notadamente o cientista social André Singer, tentaram entender o fenômeno. Alguns petistas ou simpatizantes, inclusive na blogosfera, preferiram enfiar a cabeça na areia, feito avestruz, e decretar: os manifestantes são criminosos! Arruaceiros!

Sem entender o fenômeno, é óbvio que é impossível planejar o atendimento de demandas, ainda mais quando são difusas e não partem de lideranças definidas. “Coxinha” é o nome desqualificador adotado para os que vão às ruas. Muito melhor teria sido o PT demonstrar interesse em abrir novos canais de participação popular para a definição de políticas públicas, em todas as esferas. Avançar no governo digital, por exemplo. No orçamento participativo. Seriam as respostas de um partido antenado com as possibilidades abertas pelas novas tecnologias de comunicação.

É a revolução do celular, estúpido! Das mensagens instantâneas, dos memes, das redes sociais.

Contrariamente ao que pensam alguns poucos petistas, as pessoas — especialmente os jovens — não estão indo às ruas apenas reivindicar: querem ser ouvidas, querem participar, o que é importante num país que sempre foi governado através de acertos de bastidores.

Os manifestantes não são necessariamente antipetistas, nem direitistas. Revelam desprezo por instituições que não lhes dizem respeito.

Muito já se falou sobre o esgotamento do lulismo, por conta da falta de sintonia entre o partido e as ruas.

Porém, também é importante refletir sobre as políticas de comunicação desastrosas. Não foi por falta de alerta, especialmente dos blogueiros. Em 2010, no primeiro encontro nacional, minha fala centrou-se na necessidade de produção de conteúdo próprio pela blogosfera, ou seja, de escapar da pauta única, que basicamente reflete a visão de mundo dos homens brancos, ricos e conservadores que são os donos da mídia corporativa. É, grosseiramente, a pauta do antipetismo.

Nunca, jamais, fizemos qualquer reivindicação de caráter pessoal: queríamos uma política pública para financiamento de novas vozes na mídia. De mulheres, negros, indígenas. Na internet, na rádio e TV comunitárias.

O governo federal, porém — especialmente no mandato de Dilma — optou pela “mídia técnica” e pelo “controle remoto”.

Por conta disso, ficou sem opções.

Hoje precisa apostar no poder de João Santana, num momento em que a TV perde vertiginosamente a importância na formação de opinião, especialmente de jovens. Estes, aliás, cada vez menos ficam diante de uma tela esperando o início de um programa. Fazem sua própria programação, no You Tube.

A TV, tanto quanto a internet, é um “meio quente”, ou seja, que engaja emocionalmente as pessoas.

Portanto, o anúncio de João Santana está formalmente correto. A questão é: terá o mesmo impacto de 2010, agora que o conteúdo televisivo pode ser dissecado e detonado nas próprias redes sociais?

Não há dúvida que a propaganda eleitoral — que não tem nada de gratuita — ainda terá papel fundamental este ano.

Porém, as redes sociais estão se tornando tão ou mais poderosas que a TV, uma vez que nelas os compartilhamentos vêm acompanhados pela chancela pessoal de quem dissemina conteúdo.

É amigo recomendando para amigo, parente recomendando para parente. É alguém em quem confiamos dizendo: leia isso, veja isso, ouça isso!

Barack Obama percebeu este salto qualitivativo nas comunicações em 2008, em sua primeira campanha nos Estados Unidos. Pegou os adversários de surpresa. Desenvolveu seus próprios meios para falar a uma nova geração e venceu com um comparecimento muito acima da média dos eleitores mais jovens.

Como já escrevi anteriormente, dada a concentração da mídia no Brasil, os barões do setor ganharam ainda mais poder com o advento das redes sociais.

A onda de pessimismo que tomou conta do país é uma demonstração disso.

Pode ter parentesco com as manifestações do ano passado, mas certamente foi aprofundada pelas manchetes da mídia corporativa compartilhadas aos milhões! É um filho dizendo para a mãe, ao impulsionar uma manchete de O Globo no Facebook: olha como as coisas andam ruins! Ou vice-versa. É o conteúdo raso do historiador do futuro, o notório antipetista Marco Antonio Villa, chancelado por alguém que conhecemos pessoalmente.

Além disso, tente uma experiência comigo: vá até seu aparelho de TV e tenta conversar com ele. Ouviu uma resposta? Pois é, incrivelmente, nas redes sociais há respostas! Há debates! É um meio muito mais vivo que a TV. Porém, o debate se dá em torno de conteúdos disponíveis. E é razoavelmente óbvio que a Globo tem mais poder de produzir e disseminar conteúdo que o Tijolaço, embora de qualidade incomparavelmente inferior.

O PT dormiu no ponto. Priorizou os interesses políticos e econômicos necessários à manutenção da coalizão governista. Sentou-se sobre a pauta da comunicação.

O resultado de 2014 vai demonstrar se o binômio Lula/João Santana ainda é suficiente, eleitoralmente, para sustentar a agenda do partido.

Seria ironia demais vê-la derrotada por aqueles que ajudou a ascender socialmente, influenciados em massa pela mídia corporativa que governos petistas bajularam e financiaram.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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