Assino embaixo das palavras do Fernando Brito no caso Barbosa X Noblat, e acrescento outras. Se Barbosa começar a processar seus críticos, será uma carnificina contra a liberdade de expressão.
Barbosa não pode aspirar a liberdade de falar pelos cotovelos, agredindo políticos, advogados, outros magistrados, Deus e o mundo, e pretender silenciar as críticas a si mesmo. Isso é despotismo!
Aliás, agora podemos ver quem é autoritário nesse país.
É bom deixar claro: o que está em jogo aqui não é a liberdade de imprensa. É algo maior. É a liberdade de expressão.
Barbosa é negro, e a questão de raça deve ser sempre respeitada e tratada com muito cuidado. Entretanto, isso não quer dizer que não se possa falar nada a respeito. Podemos até discordar da maneira como alguns tratam Barbosa, associando-o a símbolos como “capitão do mato”. Há racismo entranhado em toda parte. Mas não se combate isso com truculência judicial, agravada por vir da maior autoridade do judiciário brasileiro.
O que Noblat fala é o que se comenta em toda a parte, e não me refiro a ambientes dominados por membros da klu klux kan. Nos botequins, entre mulatos e negros, que somos nós mesmos, criticamos acidamente a decisão de Lula de indicar Barbosa, e nos perguntamos, entre perplexos e decepcionados, o que levou um político de inteligência e intuição tão reconhecidas a cometer um erro de consequências tão danosas para o país.
A resposta mais comum é que Lula escolheu Barbosa porque o ex-presidente tinha uma sensibilidade extrema para as desigualdades, inclusive a racial. Ele queria colorir o STF. A intenção foi das melhores. E escolheu o negro que acumulava mais diplomas que pode conhecer. Só que o inferno, como se sabe, tem uma super população de bem intencionados, e a gente só perdoa Lula porque é óbvio que ele não podia prever que Barbosa pularia, de maneira tão acintosa, para o lado da direita e da mídia.
A nossa grande mídia se preocupa com liberdade de expressão apenas em outros países. Quando é aqui, ela própria faz o papel de verdugo das liberdades, como é o caso de Ali Kamel, diretor de jornalismo da Globo, que vem processando, sistematicamente, blogueiros independentes.
A Globo, por exemplo, fez uma campanha intensa em defesa de um jornalista do Equador que chamara o presidente Rafael Correa de “assassino” no editorial de um grande periódico. Correia processou-o e exigiu 1 milhão de dólares, mas depois perdoou o jornalista na questão do dinheiro. Exigiu apenas retratação. A Globo vai criticar Barbosa (presidente do STF!), por processar Noblat a partir da interpretação subjetiva, dúbia, de que o blogueiro, que aliás é um mestiço como a maioria de nós, cometeu crime de “racismo”?
Seria até eufemismo dizer que eu costumo divergir de Noblat. Minhas críticas ao blogueiro da Globo são pesadas e flertam com a ofensa, embora sempre, quero acreditar, dentro dos limites, às vezes tênues, mas claros, da liberdade de que gozamos, de um lado, e do respeito à honra alheia, de outro.
Nessa luta contra a truculência e despotismo de Joaquim Barbosa, no entanto, estou a seu lado.
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Barbosa processa Noblat por racismo. Começou a vingança…
Por Fernando Brito, em seu blog.
Divirjo muitas vezes do jornalista Ricardo Noblat.
Quase sempre, aliás.
Muito menos aprecio a orientação política que ele assume em sua coluna em O Globo e em seu blog, na mesma empresa.
Não desconheço, também, que ele jamais tomou a defesa de outros profissionais, a que vê serem chamados de ‘blogueiros sujos”, sem que lhes proclame o direito de escrever o que pensam e tanto quanto qualquer outra publicação, merecerem – na proporção de suas audiências – a destinação de verbas publicitárias.
Nada disso, entretanto, faz deixar de ser absurdo que ele seja denunciado por racismo pelo Presidente do STF, Joaquim Barbosa, por tê-lo censurado por seus modos grosseiros ao agredir verbalmente Ricardo Levandowski.
Por dizer que Barbosa não tem o direito “tratar mal seus semelhantes, a debochar deles” e a “humilhá-los”.
Não tem, mesmo.
Ou que Barbosa teve, na sua indicação para a Corte,o fato de ser negro como elemento de convicção do Presidente Lula para decidir assim.
Foi, e que bom que tenha sido.
Porque significou a ascensão de um negro – como milhões de nossos irmãos – à corte mais alta do País, como é preciso para que esse país comece, um pouquinho, a exorcizar os séculos de discriminação, humilhação e injustiça.
Que Noblat tenha dito que o comportamento de Barbosa é eivado de autoritarismo e recalques, basta ver os espetáculos que ele protagoniza na TV Justiça, ante os olhos de todos.
Ou será que mandar um jornalista ir “chafurdar no lixo” é exemplo de comportamento equilibrado próprio de um magistrado?
Da mesma forma, não é temerário dizer que Joaquim Barbosa sabe do peso com que recai, diante do Ministério Público, uma demanda sua para que se processe alguém.
Noblat talvez seja só o primeiro.
O rancor da derrota final no processo da Ação penal 470, o chamado “mensalão”, já deixou claro, na diatribe final de Barbosa contra seus colegas, onde apontou um “maioria formada sob medida” que iria seguir sua “sanha reformadora”, que aquele era “apenas o primeiro passo”.
Talvez o primeiro passo seja justamente Noblat, a quem, por caminho transverso, se busque punir por ele, Barbosa, no trecho final do julgamento, não ter seguido razões de elevado valor jurídico, como a de dosar penas “sob medida” para evitar a progressão ao regime semi-aberto de determinados presos.
E talvez seja uma lição a Noblat de que os adversários que o enfrentamos com a verve, a ironia e o questionamentos políticos somos muito, muito mais democratas do que aqueles que acusam injúrias para exercer a perseguição.
Porque, afinal, o que se lhe imputa como injurioso é o mesmo – em palavras até mais duras – do que se acusou o jornalista Paulo Henrique Amorim em relação a Heraldo Pereira.
Quando muito, uma ofensa pessoal, não aos negros.
Noblat não achou isso merecedor de defesa.
Ainda assim, terá nossa defesa diante de um esgar autoritário.