Antes tarde do que nunca: Freixo repudia black blocs, violência e quebra-quebra

Antes tarde do que nunca. Acredito que Marcelo Freixo nunca tenha defendido a violência. Mas muita gente defendeu, e gente próxima a Marcelo Freixo. Com essa entrevista, contudo, o deputado estadual pelo PSOL-RJ, deixa claro que não entende nenhuma forma de violência como aceitável numa democracia.

Claro que é preciso criticar polícia e suas truculências. Mas a resposta não é reagindo com mais violência.

Ninguém quer proibir manifestação. Ao contrário, manifestação é saudável. Mas é preciso entender que violência não é só o ato de quebrar banco e jogar pedra e rojão na polícia. Violência também é fechar trânsito sem preocupação nenhuma com os transtornos da cidade, e sem avisar às autoridades para que elas possam organizar o fluxo das ruas.

Caos também mata. Pessoas precisam ir ao médico, ao hospital, precisam mandar mensagens urgentes, precisam estudar, trabalhar. Manifestações, em pleno século XXI, tem de ser inteligentes. Selvageria e barbárie é tudo que não precisamos no Brasil.

Muitas manifestações que aconteceram no Rio em 2013 tinham cunho bem agressivo. Numa delas, contra um jogo no Maracanã, na Copa das Confederações, os manifestantes hostilizaram um grupo de pessoas que assistiam ao jogo num bar. Isso também é violência, porque pode degenerar em brigas e morte.

Há várias outras formas de violência, todas elas ligadas à táticas de força, que não envolvem disposição para o diálogo. Pior do que quebrar agências bancárias, para mim, por exemplo, é depredar prédios públicos. Uma coisa é entrar numa câmara de vereadores para protestar e influenciar uma votação. Outra é entrar para quebrar tudo e ocupar a casa indefinidamente, como tentaram fazer, tentando impor decisões – mesmo que aparentemente justas – à força. Isso também é violência.

Faltou Freixo deixar bem claro que manifestações são importantes, mas são um complemento para ações ainda mais essenciais numa democracia: o voto e a participação política, via debate público. As três coisas precisam ser articuladas sempre em harmonia: voto, debate e manifestação.

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‘Não é quebrando bancos que se destrói o capitalismo’, afirma Marcelo Freixo

Em entrevista, deputado defende direito de militantes do Psol de participar de protestos na Copa

AZIZ FILHO E ROZANE MONTEIRO, NO JORNAL O DIA

Rio – A voz do deputado estadual Marcelo Freixo (Psol) chega a ficar embargada quando ele fala da tentativa de ligar seu nome à morte do cinegrafista Santiago Andrade em um protesto pelas mãos de dois manifestantes. “Não dá para você me associar a um homicídio de forma leviana e irresponsável. Isso é muito sério. É a minha vida”, disse Freixo em entrevista ao DIA ontem em seu gabinete na Alerj. Mas a emoção logo dá lugar à defesa do direito que os militantes do Psol têm de, segundo o deputado, participar de manifestações na Copa do Mundo deste ano. Desde que encontrem uma forma de se diferenciar dos black blocs e de outros grupos que usam a violência.

O DIA : Qual sua avaliação do período entre as primeiras manifestações de junho e o protesto do dia seis, que levou à morte do cinegrafista Santiago Andrade?

Marcelo Freixo: Essa tragédia do Santiago é fruto dessa escalada da violência. A qualquer momento, a gente poderia ter uma pessoa morta de qualquer um dos lados. Isso é fato. Essa pedra estava cantada. As manifestações foram se acirrando, guetificando. Quebra-quebra não é o histórico das manifestações sindicais, partidárias. Esse processo é recente. Isso foi afastando as pessoas e não resolveu o problema das pautas. O que vai ser das manifestações com a morte do Santiago ainda é muito imprevisível. Mas muda o cenário.

O sr. acha que a violência vai aumentar?

Espero que não.

A condenação à violência cometida por manifestantes não demorou muito a acontecer?

Black bloc nunca foi uma tática partidária. A tentativa de associar isso aos partidos é uma temeridade. O grande problema é que faltou olhar não só para o que precisava ser enfrentado, e dizer: “Olha, do lado de cá também tem problema.” Não havia o imaginário de que aquilo poderia chegar aonde chegou.

É possível isolar os manifestantes violentos?

É fundamental, é a tendência de acontecer. Acho que esses movimentos têm que ser separados porque as passeatas são importantes. Não tem que ter violência nunca. Eu não defendo violência, nem nunca defendi. Violência nunca foi método. Não é quebrando bancos que se destrói o capitalismo. Muito menos batendo em jornalista.

A polícia prendeu dois rapazes que já foram denunciados por homicídio doloso pela morte de Santiago e houve a tentativa de associar a ação da dupla a seu nome. O que o sr. tem a dizer sobre isso?

Essa história é o literal ‘disse-me-disse’, ninguém me acusa. O delegado nunca me ligou. O debate é: o que é notícia? O fato é o seguinte: vem um advogado, num depoimento, numa delegacia. O estagiário recebe uma ligação. Mas quem diz que falou é o advogado, e aí diz o seguinte: “Olha, eu ouvi.” E eu fui atrás da Polícia Civil para saber. O delegado ouviu a conversa? O advogado passou o telefone para o delegado ouvir? Isso é uma outra situação. Mas aconteceu? Não. O único que ouviu a conversa foi o advogado. É única e exclusivamente a palavra do advogado.

O sr. já conhecia a ativista Elisa Quadros, a Sininho?

Sim, eu e todo mundo, né? Eu tive duas vezes contato com ela. Uma vez, no ano passado, quando ela procurou a Comissão de Direitos Humanos (CDH) para dizer que a milícia ia matá-la. Eu disse que ela tinha que registrar na delegacia. Foi o único contato que tive com ela. Eu a atenderia como atenderia qualquer outra pessoa. Ela me procurou no domingo (dia 9) para dizer: “Fulano (Fábio Raposo) foi preso. Ele vai ser torturado.” Pelo telefone. Aí eu falei: “Não tem sentido isso.” Se ele foi preso, então ele não vai ser torturado no presídio. No momento em que ele ingressa na prisão a gente acompanha e visita sistematicamente. Em nenhum momento falou de advogado. Ponto, acabou a ligação, nunca mais me ligou. E de repente, começa a me ligar a imprensa perguntando qual era minha relação com quem jogou o rojão. Hã? É de uma irresponsabilidade.

‘A qualquer momento, a gente poderia ter pessoa morta de qualquer um dos lados’, diz deputado
Foto: Carlo Wrede / Agência O Dia
O sr. acha que ganhou votos depois da tentativa de associar seu nome à morte de Santiago?

Isso mexeu muito comigo. O cara que está todo sujo de lama, um pouco mais de lama não faz diferença. Agora, quando você tem história… Eu trato a vida pública com seriedade. Não dá para você me associar a um homicídio de forma leviana e irresponsável. Isso é muito sério. É a minha vida. Eu não estou preocupado com voto.

O sr. vai se candidatar ao governo este ano?

Eu não sou candidato porque o Psol tem um planejamento mínimo. A gente precisa crescer no Legislativo. Os nossos principais nomes vão disputar o Legislativo. Serão nomes para deputados estaduais e federais, para que a gente possa fazer a disputa para o Executivo com mais estrutura. Se pega os principais nomes para disputar a um cargo em que a chance de não ganhar é muito grande, você, a médio prazo, acaba com o partido.

A ida do senador Lindbergh Farias (PT) ao ato em apoio ao sr. na segunda-feira foi sintomática?

Não. Tínhamos representantes da Rede, convidei deputados do PSD, PPS… Muitos mandaram mensagem, não podiam ir. Mas ele fez questão absoluta de ir e deu a sua declaração.

Isso pode aumentar a simpatia do Psol pelo senador num eventual segundo turno?

Não. Foi um gesto de solidariedade. Eu o conheço muito antes de ser deputado. Vamos ter candidato.

O sr. considera apoiar o senador do PT?

Essa é uma decisão partidária. Primeiro turno, Psol tem candidato. O que o Psol faz no segundo turno, em que não esteja, é uma decisão que cabe ao partido.

O sr. descarta o apoio ao candidato Garotinho (PR) no segundo turno?

Descartaria.

E ao Pezão (PMDB)?

Descartaria.

E Crivella (PRB)?

Ele é candidato? Não sei, Acho que o Crivella não é candidato. Em cima da hora, ele retira a candidatura.

Qual deve ser a posição dos militantes do Psol nos protestos na Copa?

A militância do Psol tem que se manifestar, desde a questão da passagem, a questão da transparência política, o que há de errado na Copa, que não é pouca coisa — superfaturamento, desvio de verba, enfim, seja lá do que for —, não faz sentido a militância do Psol não protestar ou não estar nas ruas. Agora, a luta política é pedagógica. A violência é o contrário da pedagogia porque ela exclui; ela reduz; ela, inclusive, é ineficiente.

E se não for possível separar os militantes do Psol dos que usam a violência nos protestos, como os black blocs?

Vai ter que ser possível. Tem que se afastar. Como vão fazer eu não sei. Mas é fundamental que o Psol se diferencie. O Psol não participou desses atos violentos. Mais do que nunca, o cuidado tem que ser redobrado para que não possa participar de atividades com essa característica. Quem quiser ter esse método que arque com as consequências. O Psol não pode ter nenhum risco de ser confundido com isso. Tem que organizar a sua pauta. Não tenho fórmula para dizer como eles vão se diferenciar. A solução não é não ter manifestação, a solução não é não ir para as ruas.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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