A pauta do mensalão não pode acabar. A mídia quer recriar o clima de linchamento por tempo indeterminado. Talvez esteja preocupada com a crescente indignação, incluindo junto a setores influentes da comunidade jurídica, contra as arbitrariedades, desmandos, ilegalidades ou mesmo simples crueldades, praticadas sobretudo pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, sempre com apoio da grande imprensa.
Entretanto, a irresponsabilidade da nossa mídia, que não tem limites, agora flerta com a subversão pura. Não se enganem. Há subversão à esquerda, algumas irresponsáveis, outras conectadas a situações limites que não deixam outra saída; mas também há subversão à direita, patrocinada pela Casa Grande, em geral com vistas a prejudicar politicamente seus adversários no governo.
Repórteres da Folha entrevistaram 20 familiares de presos do Complexo Penitenciário da Papuda. Desses 20, apenas 2 mulheres confirmaram “rumores de rebelião”.
Entretanto, a reportagem inicia com a seguinte asserção:
Familiares de presos do Complexo Penitenciário da Papuda relatam clima de tensão dentro das unidades do presídio e afirmam que os detentos estão “revoltados” com o tratamento, considerado diferenciado, dado aos presos do mensalão.
E qual seria o “tratamento diferenciado”, o “privilégio” dos presos do mensalão? Um só. A reportagem responde:
A insatisfação é motivada principalmente pelo tratamento diferenciado que os presos do mensalão tiveram ao receber visitas. Na primeira semana, parlamentares tiveram acesso aos condenados no processo fora do horário regular e sem pegar fila. Depois, os presos do mensalão passaram a ter visitas às sextas -para os demais detentos, elas são restritas às quartas ou quintas. Há duas semanas, a Vara de Execuções Penais suspendeu as visitas às sextas. Mas a revolta entre os familiares persiste, e há clima de insatisfação entre os detentos.
O presídio decidiu permitir que os presos do mensalão recebessem visitas num dia específico porque o caso deles é diferente: como são ex-autoridades políticas, houve caravanas de parlamentares e ministros para visitá-los nos primeiros dias, o que transtornava a rotina da Papuda.
Toda essa desordem foi causada, aliás, pelo show ridículo de Joaquim Barbosa. Os condenados não deveriam estar sequer presos em regime fechado. Podiam estar em regime semi-aberto e, portanto, receber visitas fora da cadeia.
Além disso, a própria reportagem diz que os juízes já terminaram, há duas semanas, com o tal dia especial para visitas aos presos políticos.
Ou seja, o único “privilégio” dado aos presos do mensalão já não existe há duas semanas. Mesmo assim, os repórteres insistem que o “clima de revolta” continua. Como se presidiários, em qualquer lugar do mundo, fossem as pessoas mais pacatas e tranquilas do mundo, mormente num presídio de segurança máxima que abriga criminosos de altíssima periculosidade.
O que me preocupa, no entanto, é a possibilidade dos próprios repórteres da Folha, ao entrevistarem os familiares dos presos, estarem insuflando, mesmo que com sutis insinuações, algum tipo de comportamento.
O simples sensacionalismo sobre o caso já é uma forma de insuflar. Os presidários da Papuda não são bobos. Sabem que, neste momento, a mídia está de olho no presídio. Eles e seus familiares sabem (ou vão descobrir logo logo) que qualquer frase contra os condenados do mensalão encontrarão a simpatia dos grandes meios de comunicação. O processo de linchamento público não pode parar. Ele faz parte da estratégia para que os embargos infringentes não tenham sucesso, e que nenhuma revisão criminal prospere junto ao STF.
Só que, na minha opinião, eles (a grande imprensa) estão apenas acrescentando mais capítulos à lista negra de sucessivos arbítrios midiáticos e judiciários cometidos nesse julgamento. Quanto mais pressão eles fazem, mais claro fica que houve publicidade opressiva, e que há necessidade, portanto, de anular toda a Ação Penal 470.
O caso tem de ser desmembrado, e os réus sem foro privilegiado tem de ser julgados em primeira instância, como são todos os brasileiros.
E as provas tem de ser, pela primeira vez, levadas em conta. Juíz tem que seguir os autos, e não as colunas de Merval Pereira.
Juiz não tem que escrever prefácio em livro de jornalista que está acusando os réus, como fez Ayres Brito, numa inacreditável afronta à mais básica ética de um juiz.