Um dos maiores empresários do país, Benjamin Steinbruch, presidente da CSN, presidente do conselho de administração da Fiesp, é direto: houve terrorismo fiscal, e este terrorismo não pode acovardar o país.
Guido Mantega, ao invés de ouvir os urubus, e dar para trás, como parece ter feito na questão de uma nova lei sobre as dívidas de municípios e estados, que poderia aliviar a situação da prefeitura de São Paulo (e todas as cidades e estados do país), permitindo investimentos sociais e em infra-estrutura, deveria antes ler a opinião de Steinbruch. Quem move a economia são trabalhadores e empresários, não Miriam Leitão, aliada do mercado financeiro.
Trecho: “Diante desses números, tendo a concordar com a ideia de que houve de fato um certo terrorismo fiscal após o anúncio dos resultados de setembro. (…) o terrorismo fiscal não pode acovardar o país.”
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Resumo da ópera
Por Benjamin Steinbruch*, na Folha
19/11/2013 – 03h00
Com a campanha de 2014 chegando às ruas, já dá para observar e avaliar propostas que começam a ser postas à mesa por pessoas ligadas a postulantes à Presidência.
Austeridade e corte de gastos são temas já em debate. Sem dúvida, a piora da situação fiscal decorre não só de desonerações, que reduzem as receitas, mas também e principalmente do forte aumento de gastos públicos, a maior parte em programas de transferência de renda. As despesas do Tesouro cresceram 13,5% de janeiro a setembro, taxa bem superior à inflação do período.
Apesar disso, o país não está à beira de um desastre fiscal. É preciso avaliar o desempenho no contexto global. Quem quiser fazer comparações pode abrir a revista “The Economist”, que publica estatísticas de 50 grandes economias.
O deficit fiscal nominal brasileiro, estimado pela revista para este ano, é de 3% do PIB. Com esse índice, o Brasil poderia se enquadrar no critério do Tratado de Maastricht, que criou a União Europeia e, entre outras medidas, estabeleceu em 3% do PIB o limite para o deficit orçamentário dos países da UE.
Só para se ter uma ideia, relaciono alguns deficit previstos para este ano: EUA, 4%; Japão, 8%; Reino Unido, 7,2%; França, 4,1%; Espanha, 7,1%; Índia, 5,2%; Israel, 3,5%; China, 2,0%; e Argentina, 3,3%.
Poucos países importantes têm moral para recriminar o Brasil em matéria de deficit fiscal. Talvez só a Noruega (superavit de 13,1% do PIB).
As agências de classificação de risco têm observado que a dívida pública brasileira está próxima de 70% do PIB. Sem dúvida, é muito alta. Mas, o que dizer de outras grandes economias, como os EUA, com 102% do PIB; França, com 86%; Reino Unido, com 85% e o Japão, com incríveis 228%?
Diante desses números, tendo a concordar com a ideia de que houve de fato um certo terrorismo fiscal após o anúncio dos resultados de setembro. O controle e a transparência da política fiscal são necessários e as contas públicas estão piorando, mas não se pode dar aos problemas uma dimensão maior do que eles efetivamente têm.
Difícil é entender como os defensores do fundamentalismo fiscal pretendem conciliá-lo, durante a campanha eleitoral, com a necessidade de manter o crescimento econômico e a criação de empregos, promessas que nenhum político ousa deixar de fazer.
A questão fiscal nos leva ao chamado nacional-desenvolvimentismo. Deverá o próximo governo manter os incentivos a setores da indústria com vocação para o crescimento e a internacionalização?
Não é segredo para ninguém que minha resposta é sim, apesar dos desmandos recentes. Qualquer raciocínio lógico indica que esse incentivo faz sentido. Pode-se divergir quanto a setores, a volume de crédito e outros benefícios que cada um pode receber. Mas soa incoerente argumentar que eles não devem ser incentivados ou que os eventuais estímulos devam atingir a todos os setores de forma igualitária.
Seria o mesmo que estimular a produção de oliveiras no Brasil com igual ênfase dada ao cultivo de café, soja ou laranja. Assim como a agricultura, a indústria também tem vocações, pelas condições naturais, pelas reservas de matérias-primas, pelas peculiaridades de sua mão de obra e até por suas tradições.
E as privatizações? É óbvio que a iniciativa privada tende a ser mais eficiente na administração de negócios, seja via aquisição de estatais seja via concessão de serviços públicos.
Mas é sempre necessário agir com cuidado nessa área. Defendi e continuo defendendo a permanência de setores estratégicos nas mãos do capital nacional. Alguém terá coragem de propor a desnacionalização de símbolos nacionais como Petrobras, Banco do Brasil ou Caixa?
O custo Brasil entra nesse debate. Foram muito bem-vindas as desonerações de folha de pagamento, ainda que tivessem sido limitadas a alguns setores. Elas ajudaram a piorar um pouco a situação fiscal do país, mas representaram ensaio necessário do caminho para elevar a competitividade da indústria brasileira, que enfrenta momento adverso. Seria lamentável se, atropelada pelo discurso fiscalista radical, essa experiência se perdesse.
Resumo da ópera: o terrorismo fiscal não pode acovardar o país.
* Benjamin Steinbruch é empresário, diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Escreve às terças, a cada duas semanas, no caderno ‘Mercado’.