Esse texto de Marona nos oferece uma excelente plataforma de debate. Temos que debater, por exemplo, a perigosa vulgarização de violências contra prédios públicos, em especial legislativos. Por trás disso, há um clima meio estranho que mistura demandas trabalhistas reais com leviandade, radicalismo e intransigência. As conquistas democráticas não podem ser sabotadas pelo abuso.
Não é porque temos liberdade para manifestar que vamos permitir que grupos de pressão invadam legislativos e agridam parlamentares eleitos, alguns dos quais, como bem disse Marona, são nossos representantes. Além do mais, ao impedi-los de trabalhar, os manifestantes fazem mal apenas à população, porque os representantes não perdem nada com isso. Pelo contrário, ganham uma boa desculpa para ganharem sem fazer nada.
PORQUE NÃO APOIO A OCUPAÇÃO DE PRÉDIOS PÚBLICOS
Por Mario Marona, jornalista
Há os que consideram legítima a ocupação do plenário do legislativo por manifestantes. Há quem entenda que, mais do que legítima, a ocupação é necessária. Este grupo de opinião não se opõe, também, à depredação de patrimônio público, como o Itamaraty, em Brasília, ou um museu de História em Porto Alegre. Acha, ainda, que tem legitimidade a invasão da sede do governo. É possível que os que se alinham com este tipo de ação concordem com o uso de pedras e coqueteis molotov por militantes mascarados contra os policiais encarregados de reprimir os protestos.
Uma parte da sociedade, no entanto, defende a tese de que é livre o direito à manifestação, mas que o plenário do legislativo e a sede do governo não podem ser ocupados e interditados por manifestantes. São os mesmos que discordam da depredação de prédios públicos de qualquer natureza, assim como repudiam o ataque a quem quer que seja com pedras e vidros cheios de gasolina em combustão.
Vai ser difícil uma conclusão. Não é provável que os dois grupos venham a convergir, exceto, talvez, na identificação genérica que tenham com as reivindicações dos manifestantes – pelo menos quando elas são conhecidas, como agora, quando os professores do Rio pedem aumento salarial e melhores condições de trabalho. Quanto ao método, porém, a divisão parece insuperável.
A quem eventualmente possa interessar, tentarei deixar claras as minhas posições: estou no grupo dos que se opõem à ocupação e à depredação de prédios públicos; por mim, plenários invadidos devem ser, sim, evacuados e liberados para os seus usuários eleitos, um dos quais, por sinal, fez por merecer o meu voto; entendo que a polícia deve usar a força necessária para enfrentar os manifestantes, quando eles ocuparem prédios públicos, depredarem patrimônio do povo ou usarem de violência contra policiais e civis; manifesto meu firme desejo de que qualquer excesso cometido nas manifestações, por policiais ou por manifestantes, seja punido na forma da lei; não creio que manifestantes que escondem a cara possam representar alguém, além de oportunistas e deles mesmos; duvido muito da honestidade de manifestantes que dizem desprezar partidos políticos e se prestam à manipulação de grupos de pressão e… partidos políticos; não compartilho a tese, que considero fruto de má-fé ou enorme ignorância, segundo a qual vivemos numa ditadura, disfarçada ou não; e não contem comigo para derrubar qualquer governo eleito, em qualquer instância, a não ser pelo voto ou, se tiver que ser antes disso, por meio de um processo legal de impeachment em que o voto da maioria deve prevalecer.
Quanto aos métodos da polícia, não posso aprovar a truculência e a violência gratuitas. O Estado erra ao permitir repressão indiscriminada. Falta preparo à polícia, sem dúvida. Mas não tentem me convencer de que gás de pimenta – recurso usado no mundo inteiro – é pior do que cassetete, que gás lacrimogênio é pior do que bala de borracha – e de que tudo isso é pior do que tiros de verdade. Quem prefere que a polícia abra mão de suas armas – mesmo as não-letais – e impeça a invasão de uma instituição pública por meio de um papo reto e maneiro, não faz a menor ideia da encrenca em que se meteu. Ou se acha muito esperto. E não é.