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A leitura e os direitos humanos

LEIA MAIS, SEJA MAIS Ana de Hollanda, ex-ministra da Cultura Em palestra ministrada em 1988 e posteriormente publicada em coletâneas com o título “O direito à literatura”, o professor Antonio Candido tratou do assunto como um elemento indispensável dentro do conceito de direitos humanos. Assinalo alguns trechos: “Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível, […]

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Ana de Hollanda, ex-ministra da Cultura

Em palestra ministrada em 1988 e posteriormente publicada em coletâneas com o título “O direito à literatura”, o professor Antonio Candido tratou do assunto como um elemento indispensável dentro do conceito de direitos humanos. Assinalo alguns trechos:

“Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível, todas as criações de toque poético, ficcional ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das grandes civilizações.

Vista deste modo a literatura aparece claramente como manifestação universal de todos os homens em todos os tempos. Não há povo e não há homem que possam viver sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em contato com alguma espécie de fabulação. Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de passar as vinte e quatro horas do dia sem alguns momentos de entrega ao universo fabuloso. O sonho assegura durante o sono a presença indispensável desse universo, independentemente da nossa vontade. E durante a vigília a criação ficcional ou poética, que é a mola da literatura em todos os seus níveis e modalidades, está presente em cada um de nós, analfabeto ou erudito – como anedota, causo, história em quadrinho, noticiário policial, canção popular, moda de viola, samba carnavalesco. Ela se manifesta desde o devaneio amoroso ou econômico no ônibus até a atenção fixada na novela de televisão ou na leitura corrida de um romance.”

“…verifiquei que a literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos e portanto nos humaniza. Negar a fruição da literatura é mutilar a nossa humanidade.”

“…Uma sociedade justa pressupõe o respeito aos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um direitos inalienável.”

Iniciei meu artigo lançando mão de palavras e argumentações do mestre Antonio Candido de Mello e Souza por, sinceramente, não encontrar nada mais adequado para chamar atenção à relevância do livro e da leitura na vida do cidadão comum.

Os resultados da pesquisa RETRATOS DA LEITURA NO BRASIL, realizada pelo INSTITUTO PRO LIVRO e pelo IBOPE em 2011, apontavam que a média de livros lidos por habitantes no país é de quatro volumes por ano. É importante ressaltar que nesse percentual estão inclusos os livros didáticos, indicados pela escola, Bíblia e religiosos em geral, entre outros que fogem ao perfil literário descrito pelo professor Antônio Cândido.

Para incorporar a prática da leitura, principalmente a que cria o hábito de usufruí-la como fonte de lazer ou conhecimento, algumas iniciativas devem ser e estão sendo tomadas, particularmente pelo Estado.

Na abertura da XV Bienal do Livro, em 2011, a Presidenta Dilma assinou em conjunto com os ministros da Cultura e da Educação o decreto de criação do Plano Nacional do Livro e Leitura, que tem por objetivo primordial o acesso de todo cidadão ao livro e à leitura e, entre suas ações, prevê um conjunto de projetos, programas, atividades e eventos na área do livro, leitura, literatura e bibliotecas pelo país.

Nessa mesma ocasião, apreensiva com o baixo índice de leitura, a Presidenta encomendou ao Ministério da Cultura (MinC) e à Fundação Biblioteca Nacional (FBN) um programa de livro popular visando baratear e torná-lo mais acessível ao público. O Programa do Livro Popular foi iniciado com um piloto voltado para bibliotecas publicas e comunitárias, das quais foram atendidas em 2012 mais de duas mil em quase 1500 municípios de todos os estados brasileiros. Para a segunda etapa, foi programado o lançamento e distribuição ao público consumidor de uma coleção de 400 títulos ao preço máximo de R$10,00.

Complementando a política de aproximação do cidadão ao livro e à leitura, outros programas foram e devem ser desenvolvidos.

Ao considerar o fato da grande maioria dos municípios não contar com livrarias e, quando as tem, serem insuficientes ou mal abastecidas, o MinC e a FBN estudaram formas alternativas de fazer chegar o livro aos mais distantes rincões do país. Em 2011 foi criado o Circuito Nacional de Feiras de Livro e Festivais de Literatura, aproveitando os então existentes no País, mas que em seu segundo ano dobrou de tamanho. Em 2011 e 2012 foram investidos grandes recursos em editais públicos para parcerias com prefeituras, governos estaduais e organizações responsáveis pelas feiras, independente do montante arrecadado pela renúncia fiscal da Lei Rouanet. E, no ano passado, nada menos do que 15 milhões de leitores participaram do Circuito Nacional de Feiras de Livro.

Outro programa que reforçou a proximidade do público com o livro e a leitura foi a Caravana de Escritores. Nada menos do que 181 escritores de todas as regiões do País participaram da edição inicial das 75 caravanas do Projeto Caravana de Escritores, que percorreu dez estados brasileiros para conversar sobre livros e literatura. Sem dúvida, esse é um tipo de experiência marcante para que jovens sintam o poder da palavra escrita e o potencial dessa ferramenta para a livre expressão de suas idéias.

Vale destacar o programa eficaz e bastante fomentado na gestão passada, o das Bibliotecas Mais Cultura, inspiradas nos modelos das Bibliotecas Parque de Bogotá e nas de Medellín. Outro foi o “Agentes de Leitura”, previsto para ser integrado às bibliotecas públicas municipais e escolares, aos Pontos de Leitura e ao projeto Arca das Letras, do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Esses jovens, os agentes, são selecionados e preparados para levar o livro e o interesse pela leitura a comunidades carentes. Com um kit formado por bicicleta, livros e mochila, passam a visitar casas, reunir moradores para promover a leitura, emprestam livros e voltam para rediscutir o conteúdo lido após 20 dias.

Uma preocupação bastante atual, no momento em que nosso país passa a ser objeto de interesse não só político, social e econômico, mas também cultural, é a da internacionalização da literatura brasileira. Nesse sentido, o Programa de Apoio à Tradução recebeu do governo federal um enorme reforço: de julho de 2011 a dezembro de 2012, foram aprovadas 177 novas traduções, o que equivale a mais de 100% de todas as concedidas nas duas décadas anteriores. E, sem dúvida, é sintomático desse interesse internacional o número de feiras internacionais de livros em que o Brasil tem sido homenageado: depois da de Bogotá, em 2012, vem a mais consagrada, a de Frankfurt, neste ano de 2013, a Feira do Livro de Bolonha, na Itália, considerada a mais importante na área de livros infantis e juvenis, em 2014, o Salão do Livro de Paris em 2015, a Feira do Livro de Londres em 2016 e, em 2017, Nova Iorque, entre outras que já estão em negociação, visando uma agenda estratégica de longo prazo.

Não há como colocar nesse espaço, sem tornar a leitura aborrecida, as inúmeras outras ações que refletem a ênfase que a FNB e o MinC vêm dando à questão, na gestão da Presidenta Dilma. Mas lembro, com orgulho, que no penúltimo mês de minha participação como Ministra, em agosto de 2012, o MinC lançou a campanha LEIA MAIS, SEJA MAIS nas emissoras televisivas e órgãos de imprensa, sob forte inspiração das idéias apregoadas pelo Professor Antonio Candido no clássico “O direito à literatura”.

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Basquiat

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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migueldorosario

09/09/2013 - 23h09

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Domingos Coelho

08/09/2013 - 16h43

falta ao governo da presidenta Dilma uma iniciativa mais incisiva sobre a escola. Os presidentes norte-americanos pelo menos uma vez por ano são filmados dentro de uma sala de aula conversando com alunos e professores. No fatidico 11 de setembro, Bush estava numa sala de aula na hora em que as torres cairam, lembram ?
pois é, falta este tipo atitude de nossos governantes. estar presente em sala de aula. perguntar ao professor por que motivo eles se aferram tanto a conteúdos ? por que nossos livros didáticos são tão descontextualidos das vidas das crianças ? por que motivo eles são usam tanto o MEC como justificativa para não iniciarem mudanças em curriculos e em rotinas em sala ? por que motivo a escola não cria a semana da leitura de livro, qualquer livro, sem a necessidade das famigeradas questões de intepretação de texto ?
A esta altura de seu mandato Dilma encontrou-se com Salman Khan (http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/dilma-convida-salman-khan-para-parceria-na-educacao-basica) para uma conversa vaga sobre a proposta dele, aceitando-a de forma acritica. Se fosse sobre alimentação, seria o oposto: o governo brasileiro discorreria horas e horas sobre seus projetos e beneficios sociais tipo “fome zero”. em 2003, sem nenhuma proposta, o governo lula ficou meses com o balão de ensaio da “alfabetização zero” da professora Esther Grossi, e ficou nisso.
as iniciativas que você alenca são interessantes, mas não parecem tocar no ponto central do texto do Antonio Candido.


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