Reproduzo abaixo a opinião de Chauí, em palestra na Academia da PM do Rio. Entendo e respeito sua opinião sobre os Black Bocs, mas eu penso um pouco diferente. Os Black Bocs são um fenômeno antes niilista, de desencanto geral com todas as instituições e com a própria democracia, mas sem incorporar propriamente nenhum valor ideológico. Não tenho simpatia nenhuma pelo movimento. Ao contrário, já escrevi textos bem agressivos contra eles, sobretudo depois que um grupo atacou manifestantes que eu conhecia na passeata das centrais do dia 11 de julho. Passada a irritação, hoje entendo que o fenômeno tem duas facetas:
1) um niilismo juvenil, que é perigoso, violento e contagiante. Os jovens aderem ao movimento em busca de emoção e adrenalina. Aí pode haver um aspecto político contestatório genuíno, embora infestado de imbecis e brucutus. Os próprios Black Bocs fizeram há pouco, em sua página no Facebook, uma forte autocrítica, em que chamam o comportamento de alguns integrantes de “imbecil”; a crítica é sobretudo ao vandalismo indiscriminado, como quebrar bancas de jornal.
2) a manipulação por forças externas: é uma faceta mais sombria do movimento. Há toda espécie de infiltração e manipulação dentro dos Black Bocs. Nos protestos do Rio, via-se que havia líderes, organização e provavelmente até um financiamento oculto à violência. Aí sim, temos o perigo do movimento estar sendo manipulado para provocar instabilidade política e econômica no Brasil, com objetivo de desviar fluxos de investimento que viriam para cá e acabam se destinando aos Estados Unidos, em busca de maior segurança.
‘Black blocs’ agem com inspiração fascista, diz filósofa a PMs do Rio
na Folha.
Os “black blocs”, grupos que têm promovido atos violentos durante manifestações, têm mais inclinações fascistas do que anarquistas, afirmou ontem a filósofa Marilena Chaui, em palestra na Academia da Polícia Militar do Rio de Janeiro.
Para ela, os grupos têm como foco o ataque a indivíduos e não apresentam um plano de organização social futuro, em substituição à estrutura social vigente.
“Temos três formas de se colocar. Coloco os ‘blacks’ na fascista. Não é anarquismo, embora se apresentem assim. Porque, no caso do anarquista, o outro [indivíduo] nunca é seu alvo. Com os ‘blacks’, as outras pessoas são o alvo, tanto quanto as coisas”, disse ela.
Chaui afirmou ainda que as manifestações de junho em nada se assemelham aos protestos de maio de 1968, na França. Para ela, as reivindicações atuais dialogam com o poder constituído, o Estado.
“O grande lema [em 1968] era: é proibido proibir porque nós somos contra todas as formas de poder. Não se reivindicou nada. […] As manifestações de junho não disseram ‘não’ a coisa nenhuma. Eles se dirigiram ao poder, ao Estado e pediram diminuição da tarifa, mais verba para educação, saúde, CPIs e auditorias contra a corrupção e contra a Copa. Fizeram demandas institucionais ao poder.”
Professora da USP e doutora honoris causa pela Universidade de Paris, Chaui participou do ciclo de conferências sobre violência para cadetes e oficiais da Polícia Militar.
Chaui falou sobre “o mito da não violência brasileira”, descrevendo a estrutura social como “opressiva” em relação aos mais pobres.
A criação da identidade nacional como “passiva” seria uma forma de evitar mudanças sociais radicais, que prejudiquem os detentores do poder político e econômico.
Mas, na análise da filósofa, os “black blocs” não usam o que ela chama de violência revolucionária.
“Ela só se realiza se há um agente revolucionário que tem uma visão do que é inaceitável no presente e qual a institucionalidade futura que se pretende construir”, afirmou.
Ela ironizou algumas reivindicações desses grupos, como estatização dos bancos e a saída de Dilma Rousseff da Presidência.
“Uma jovenzinha disse assim: ‘Estamos sim num processo revolucionário. Temos já um programa’. Era o programa mínimo dessa semana. Dá vontade de dar um bom bocado, um sorvete, um café com leite com creme, uma mousse, agradar, afagar… Como é que pode ficar assim tão iludida”, disse a filósofa.
Para Chaui, o modelo “black bloc” é uma mescla de “partidos de extrema esquerda a procura de uma linguagem intempestiva de reconhecimento social e nacional” e “essa coisa anárquica”.
A filósofa defendeu que as manifestações previstas para setembro empunhem como bandeiras as reformas política e tributária.