Hoje eu li uma notícia curiosa. Cientistas descobriram que o excesso de neurônios pode atrapalhar o bom funcionamento do cérebro. Em alguns casos, até mesmo matá-lo. Em função disso, existe em nós um mecanismo natural, ativo desde o feto, para matar células nervosas. Uma quantidade de neurônios acima do necessário cria obstáculos para a realização das sinapses, as conexões nervosas que formam a nossa atividade mental. A descoberta reduz nossa sensação de culpa num dia de ressaca. Quem sabe se os trezentos mil neurônios que torrei ontem à noite, pensa o boêmio, não me tornarão mais inteligente?
A notícia também ajuda a explicar a genialidade humana, e por isso a associei a nosso eterno Niemeyer, um sujeito humilde e ao mesmo tempo tão superior. O gênio, na maioria das vezes, não é o mais inteligente. Nem faz questão de sê-lo. A arte está aí para provar essa verdade. Enquanto os poemas de Mario Quintana, por exemplo, parecem feitos com apenas poucos neurônios, e talvez por isso mesmo sejam tão belos e universais, há poetas que usam bilhões deles, com resultado lamentável.
A mesma coisa vale para as utopias. As mais poderosas, que demonstram resistência acima do normal, que pervadem lugares surpreendentes, são também as mais simples. Os sonhos de Niemeyer, com certeza, tão poderosamente simples, durarão muito mais que suas obras. Ele sabia disso, daí a sua humildade, daí a sua máxima tão emocionantemente humanista: a arquitetura é importante, porém mais importante é a vida.
Com a sua morte, Niemeyer repetiu, de certa forma, o feito de Vargas: constrangeu seus adversários; derrotou-os, inexoravelmente. Por um dia ou dois, o Brasil inteiro se tornou comunista, sonhador e arquiteto. O velhinho deve estar sorrindo, com a malícia de um anjo, num céu no qual ele não acreditava. Um céu que a gente inventa, profanando seu ateísmo, apenas para o imaginar por lá, amaciando a dura eternidade com a forma curvilínea e sedutora das utopias!