Fissuras na mídia & outros assuntos

Um dia como qualquer outro na imprensa brasileira. Apoio a golpes de Estado, terrorismo econômico, ataques a Lula, tudo regado a muito mensalão e brindes à Serra (via Merval). Enfim, as ladainhas de sempre.

Vamos começar os trabalhos com uma rápida análise da coluna do imorredouro Merval Pereira. O homem está feliz como pinto no lixo com a pesquisa Datafolha divulgada ontem, aquela que perguntou aos petistas se eles amam Maluf e divulgou o resultado como prova cabal do fracasso de Lula.

Reitero que um dos meus princípios é não criticar pesquisa eleitoral. Alimento deliberadamente a opinião ingênua de que os institutos de pesquisa são sérios e imparciais. Entretanto, para mim está lógico que o grupo Folha usou a pesquisa como forma de maximizar o impacto da foto de Maluf, Haddad e Lula. Não se passaram nem 11 dias da última pesquisa e o Datafolha fez outra às pressas apenas para captar o momento negativo do candidato petista.

É interessante saber a opinião das pessoas sobre a aliança entre PT e Maluf; entretanto, as perguntas já embutem a resposta que se deseja obter.

Merval esqueceu, naturalmente, de mencionar o aumento da rejeição à Serra. Mas viremos a página. Talvez Lula tenha errado em buscar apoio do PP. Mas as jogadas estratégicas do ex-presidente não devem ser avaliadas com pesquisas superficiais e tendenciosas, e sim à luz de resultados eleitorais. O melhor juiz neste episódio será o eleitor paulistano. Sem falar na história, que só julgará após avaliação criteriosa não apenas de vitórias eleitorais mas sobretudo da qualidade da administração do próximo prefeito paulistano.

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Em relação ao golpe no Paraguai, temos hoje algumas fissuras na grande mídia. Claudia Antunes e Clovis Rossi publicaram textos fortemente críticos ao golpe de Estado naquele país, furando o bloqueio pró-golpe que, contudo, ainda é predominante, omitindo-se inclusive as manifestações que estão sendo realizadas.

De qualquer forma, a minha opinião é que o Brasil não pode fazer muita coisa. Não podemos dar uma de ianques e impor democracia ao Paraguai à base de sanções que só vão prejudicar os pobres paraguaios. Foi um golpe, sim, mas foi um golpe lá no Paraguai, não aqui. O Mercosul, aliás, está fazendo uma bela limonada com esse limão azedo e aproveitando a ausência do Paraguai para aprovar o ingresso da Venezuela no bloco. De resto, o que os países podem fazer é deixar o Paraguai de castigo (fora do Mercosul) até a realização de novas eleições, em abril. A Venezuela cortou o fornecimento de petróleo ao Paraguai, mas creio que foi uma medida intempestiva de Chávez, que ele mesmo deverá rever logo.

O Mercosul possui um parlamento, e deverá discutir mais profundamente esse tipo de problema, que é muito sério. É preciso haver algumas regras mais claras sobre o instrumento “legais” para se derrubar um presidente. Em Honduras, foi uma canetada do judiciário; no Paraguai, uma tramóia parlamentar. Para apear um presidente, é preciso consultar o povo, sempre, através da realização de plebiscito. Como fizeram com Chávez, quando lhe acusaram de fraudar eleições. Fizeram um plebiscito e Chávez ganhou, e depois ganhou várias eleições, desmoralizando as acusações de fraude.

Agora entendemos o esforço dos “bolivarianos” para renovar os quadros legislativos, judiciários e militares de seus respectivos países. Não basta ganhar eleição presidencial, se toda a estrutura do Estado encontra-se ocupada pelos mesmos retrógrados e golpistas que dominaram o continente por séculos.

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Noto ainda o crescer da gritaria no âmbito do jornalismo econômico. Saiu a inflação, e agora entrou a inadimplência, o endividamento,   o crescimento baixo do PIB como ingredientes para assustar o público.  A economia mundial vive, de fato, um momento difícil. Aliás, é de se perguntar: e quando não foi assim? O Brasil enfrenta, por isso mesmo, dificuldades para crescer, e de novo perguntamos: quando foi fácil?

O Banco Central divulgou hoje o seu relatório trimestral, trazendo muitos dados sobre a economia brasileira. Não sei precisamente quais são inéditos, mas todos são recentes, e o importante é vê-los todos reunidos num só documento, o que nos permite fazer uma boa análise de conjuntura.

Separei alguns gráficos e comento logo abaixo deles.

Essa tabela é muito interessante porque traz uma previsão do crescimento do PIB em 2012, por setores. Observe que o Banco Central faz sempre estimativas conservadoras, e por isso mesmo reduziu sua estimativa para o crescimento do PIB este ano para 2,5%, contra 3,5% em sua projeção anterior.

Repare que o BC estima que a indústria brasileira vai terminar o ano com crescimento de 1,9%. É baixo, mas é um alívio saber que há previsão de que o setor fechará 2012 no positivo. Inclusive, o setor de transformação, que deverá crescer 0,5% este ano.

O segmento que mais crescerá no país este ano, segundo o BC, é o de “Serviços de Informação”. Depois de anos em que o setor que mais crescia era a agropecuária ou mineração, eu acho que isso é um indício de modernização do país.

 

Na tabela acima, o BC compila a “expectativa do mercado”. Note que o BC foi mais conservador do que o mercado em sua estimativa para o PIB deste ano: o mercado estima crescimento de 2,7%.  Para 2013, projeta-se crescimento de 4,5%, o que seria um ótimo índice. No tocante a inflação e juros, o mercado está otimista: inflação controlada de 5,2% este ano e um pouquinho maior no que vem, 5,6%, em virtude do esperado aquecimento da economia. O mercado espera dólar de R$ 1,90 ao fim de 2012, e R$ 1,87 ao fim de 2013.

O Banco Central espera um câmbio médio de R$ 2,00 para o dólar este ano, o que também é uma boa notícia, porque R$ 2 é um nível que ajuda os exportadores e ao mesmo tempo não sobrecarrega a inflação nem obstrui as necessárias importações.

 

 

De uma coisa os analistas não podem reclamar. O marasmo do PIB está servindo maravilhosamente para derrubar os juros no Brasil.

 

 

Esses números da exportação, até maio, mostram que os manufaturados foram o setor que mais aumentou suas exportações nos primeiros cinco meses do ano. No período, a exportação de manufaturados atingiu R$ 344,7 bilhões, alta de 3,2% sobre o ano anterior, enquanto a exportação de básicos cresceu somente 0,8%, para R$ 442,6 bilhões. Esses dados mostram que a choradeira sobre “desindustrialização” é, no mínimo, exagerada.

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Entretanto, eu sei que as coisas estão difíceis. Foi publicado esta semana um relatório do IBGE mostrando que a crise de 2009 eliminou mais de 10 mil fábricas no país.  Mas não posso acreditar em matéria da Folha e fico lhes devendo um estudo do relatório completo do IBGE.

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Por fim, um pouco de humor. O desempenho do senador Alvaro Dias ontem na CPI do Cachoeira.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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