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Os clichês de Ferreira Gullar

É cansativo ouvir e comentar as mesmas coisas, mas é um esforço que fazemos em nome da ciência política.

3 comentários
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(Basquiat, Clement e Andy Warhol).

Hoje vamos analisar dois textos publicos no domingo. Um é a coluna de Merval Pereira no Globo, intitulada “A missão de Lula“, o outro um artigo de Ferreira Gullar na Ilustrada da Folha, “É circo ou não é“.

Aqui vamos analisar o texto de Ferreira. É cansativo ouvir e comentar as mesmas coisas, mas é um esforço que fazemos em nome da ciência política.

O artigo de Merval será analisado em outro post.

Em primeiro lugar, aponte-se a politização dos cadernos culturais. Mas sobre isso, comentaremos em outra oportunidade. Vamos àquele tradicional esquema de comentários intercalados, que é a maneira mais simples de fazer um contraponto. Meus comentários vão em fonte normal. Eu pulei apenas a parte em que ele fala de “precatórios”, porque realmente não me interessa a opinião leiga de Gullar sobre o tema.

É um circo ou não é?

Por Ferreira Gullar, na Folha.

Repare o contínuo e infatigável esforço para desqualificar a CPI, chamando-a de circo, etc. Quero acreditar que Ferreira age quase inconscientemente. Nos últimos anos, seus artigos apenas ecoam e sintetizam opinões já consolidadas nos jornalões. Ele segue fielmente o roteiro, jamais faz uma afirmação que fuja do script. Uma pena que os únicos escritores consagrados que ousam escrever regularmente sobre política, todos eles sejam tão submissos aos mandamentos midiáticos.

Ultimamente, faço um esforço enorme para não perder a esperança em nosso país, em nossa capacidade de nos comportarmos com um mínimo de respeito pelo interesse público, pelos valores éticos, enfim, por construirmos uma nação digna deste nome.

Permitam-me usar um termo que está meio gasto de tanto que eu já o usei em meus posts: “xaropada”. É realmente lamentável que Ferreira Gullar se disponha a cometer lugares comuns tão enjoativos. O que me espanta é a grande contradição: no momento em que temos a Polícia Federal, o Ministério Público e o Congresso Nacional investigando, prendendo, e quebrando sigilos de esquemas infiltrados nas mais altas esferas da República, colunistas da mídia começam a “perder a esperança”. Ora, antes, quando esses bandidões não eram investigados, não se cogitava jamais em prendê-los e onde senadores e governadores era considerados intocáveis, aí sim, a esperança era grande? Ou Ferreira acha que não havia corrupção no Brasil antes de Demóstenes Torres?

É com dor no coração que eu comunico a vocês que o resto do texto só poderá ser lido pelos assinantes. Tenho que tomar cuidado para manter o blog sustentável.
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É que, a cada dia, como você, fico sabendo de coisas que me desanimam. Parece que a corrupção tomou conta do Estado brasileiro, que não há mais em quem confiar. O que desanima não são apenas as falcatruas praticadas por parlamentares, ministros, governadores, prefeitos, juízes… O pior é que esses dados refletem uma espécie de norma generalizada que dita o comportamento das pessoas e o próprio funcionamento da máquina pública.

Vou martelar: xaropada. Esse papinho de “desânimo” me lembra uma entrevista que meu irmão fez com o Mauro Santayana, onde ele recorda que a ditadura, em virtude da rigorosa censura que impunha à imprensa, não permitia que se divulgassem escândalos políticos, nem denúncias de corrupção. Com isso, ninguém protestava contra a corrupção, nem ficava desanimado. Aliás, essa foi uma consequência da ditadura que os analistas políticos não costumam observar: a independência entre os poderes foi prejudicada, com prejuízo ao combate à corrupção. Promotores públicos não tinham independência para investigar poderosos, porque quem seria louco de investigar generais? A mesma coisa valia para juízes e policiais federais. O país se corrompeu profundamente durante a ditadura militar. Tanto que os piores corruptos são pessoas vindas daquele ambiente. Não há razão para desanimar. A Polícia Federal, que era totalmente desqualificada e sucateada durante o governo FHC, tornou-se uma espécie de FBI durante a gestão Lula, senão em recursos e infra-estrutura, que ainda falta muito para isso, pelo menos em eficiência no combate aos crimes de colarinho branco.

E eu, burro velho, embora sabendo disso tudo, não paro de me surpreender. Acontece de tudo, até CPI criada pelo governo. Nunca se viu isto, já que CPI é um recurso da oposição; quer dizer, era, porque a de Cachoeira foi invenção do Lula e seu partido, e conta com o apoio da presidente Dilma. Isso porque, no primeiro momento, os implicados pareciam ser apenas adversários deles, a turma do mensalão.

Pronto, agora chegamos à parte que realmente interessa no texto. Ferreira fala: “até CPI criada pelo governo. Nunca se viu isto, já que CPI é um recurso da oposição”. A tese de Ferreira é mais uma dessas teses leigas, vulgares, que a mídia vai repetindo até virar verdade absoluta. CPI é uma comissão parlamentar de inquérito. Não há nada na lei sobre CPI ser um instrumento da oposição, e só da oposição. Nossa democracia é jovem, então não podemos amarrar as ações do parlamento aos hábitos de poucos anos de experiência. CPI serve, entre outras coisas, para levar adiante investigações que, por envolver autoridades públicas, tem implicações políticas graves, e que, por isso mesmo, devem ser objeto de debate e investigação no parlamento. Por quê? Porque esse debate ajudará o Congresso e a sociedade a conhecer melhor os males que assolam o país e a propor as respectivas soluções. Nem polícia, nem MP nem o Judiciário propõem soluções. Eles apenas investigam e prendem bandidos. Os parlamentares podem fazer muito mais que apenas prendê-los. Pode criar leis mais rígidas, ou mais eficazes, fechar brechas, fortalecendo as instituições.

Daí Ferreira apela para mais um lugar-comum da mídia: “a[CPI] de Cachoeira foi invenção do Lula e seu partido e conta com o apoio da presidente Dilma”. Ora, é publico e notório que Lula apoiou a criação da CPI, mas é preciso sempre lembrar que ela foi criada, efetivamente, pela assinatura de mais de 400 parlamentares. Eu estou sempre repetindo isso aqui no blog: temos o dever de lhes dar esse crédito. Assim como os parlamentares são literalmente esculachados quando enterram CPIs por medo de suas consequências, devemos elogiá-los quando eles as criam. Refiro-me, naturalmente, apenas às CPIs que são importantes ao interesse público.

Aí Ferreira Gullar faz uma ilação doentia: “Isso porque, no primeiro momento, os implicados pareciam ser apenas adversários deles, a turma do mensalão”. Ué, por ocasião da criação da CPI, os jornalões publicaram fotos com todos os líderes da oposição posando como seus autores. Durante vários dias, alías, os jornais falavam que o PT não queria mais criar CPI. É um samba do criolo doido.

Além do mais, a CPI, pelo que eu sei, nasceu também da pressão da opinião pública, não? No afã de desqualificar a CPI, os colunistas de oposição esquecem desse detalhe. Quando é do interesse deles, a opinião pública existe, quando não, eles somem com a opinião pública.

Eis, porém, que novas revelações envolveram gente do PT e aliados do governo, sem falar numa empresa corrupta que é responsável por grande parte das obras do PAC, o Plano de Aceleração do Crescimento do governo federal.

Mas o que fazer, agora, se a CPI já estava criada? Voltar atrás seria impossível, e nem era preciso, uma vez que, dos 30 membros da CPI, apenas sete são da oposição, quer dizer, não decidirão nada.

Aí Ferreira recai na irritante contradição que todos os colunistas vem martelando, como se o público fosse imbecil. Ora, os políticos são espertalhões ou bobocas? Se são espertalhões, porque produziriam uma CPI que os prejudicariam?

As informações levantadas por Ferreira mostram, em primeiro lugar, que parlamentares e o governo foram corajosos em criar a CPI. Desde o início se sabia que a CPI poderia respingar em aliados, e mesmo assim ela foi criada. Quer dizer então que se o governo enterra uma CPI com medo de que ela respingue em seus aliados, ele é desonesto; e se a leva adiante ele é burro? Qual a postura do governo e dos aliados que contentaria Gullar?

Mas essas revelações punham em risco um dos principais objetivos de Lula, que era usar a CPI para desqualificar o processo do mensalão, prestes a ser julgado pelo STF. Essa intenção foi favorecida por um fato que envolve o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, a quem caberá fazer a denúncia da quadrilha chefiada por José Dirceu. O PT tentou desqualificá-lo, apresentando-o como ligado a Demóstenes Torres e, portanto, a Cachoeira. A jogada não deu certo e, além do mais, está aí a maldita imprensa, que insiste em criar problemas, por levar à opinião pública informações inconvenientes.

Gullar faz uma ilação sem ao menos advertir o leitor de que é isso, uma ilação. Quanto a Gurgel, ele está sendo questionado por parlamentares e pela opinião pública, a verdadeira, não aquela meia dúzia de hidrófobos cujas cartinhas são publicadas em jornais impressos.

De qualquer modo, a CPI teria que ouvir Carlinhos Cachoeira, e só Deus sabe o que ele poderia revelar. Deus e nós também: nada, como se viu. É que ele se valeu do direito, que a Constituição lhe concede, de permanecer calado para não produzir provas contra si mesmo. Quem quer que tenha inventado isso -sempre em defesa dos inocentes, claro- com frequência favorece aos culpados, uma vez que o inocente, por nada temer, faz questão de contar toda a verdade. Calar, portanto, é confissão de culpa. De qualquer modo, Carlos Cachoeira, a conselho de seu advogado, não respondeu a nenhuma das perguntas que lhe foram feitas, deixando os parlamentares, que inutilmente o interrogavam, em situação constrangedora. Aquela sessão da CPI, em Brasília, só pode ser comparada a um espetáculo circense.

Besteira. Em todas as CPIs, no Brasil e em qualquer lugar do mundo, há depoentes que se reservam o direito de não responder. Isso não as desqualifica, nem as transforma em circo. No caso de Cachoeira, houve um erro, porque o depoimento deveria ser feito após o julgamento do criminoso.

E quem é o advogado de Cachoeira? Nada menos que o ex-ministro da Justiça de Lula, Márcio Thomaz Bastos, que, sentado a seu lado, como um segurança jurídico, ouvia os deputados e senadores se referirem a seu constituinte como “bandido, chefe de uma quadrilha de ladrões”. Estava ali por vontade própria ou por imposição do cliente? Não se sabe, mantinha-se indiferente, como se nada ouvisse.

Marcio Thomaz Bastos era um grande advogado antes de ser ministro de Lula, especializado justamente em direito criminal. Advogados defendem assassinos, estupradores, sequestrados, terroristas, e também corruptores e bicheiros, como Carlinhos Cachoeira. Criminalizar Bastos porque defende Cachoeira é apelar para o preconceito baixo, populesco, contra um direito constituicional, que protege inclusive o mais monstruoso dos cidadãos. Aquele monstro que matou dezenas de jovens na Finlândia também conta com um ótimo advogado.

Foi por saber Cachoeira culpado de todas aquelas falcatruas que o aconselhou a nada responder. Resta à CPI recorrer às provas documentais. Por isso mesmo, Thomaz Bastos já pediu a anulação delas. Cachoeira pode não ter razão, mas dinheiro não lhe falta. E o espetáculo continua…

Gullar encerra o texto com observações absolutamente vulgares sobre Cachoeira. Que o sujeito é culpado, todos sabemos, porque há provas nos autos. Tanto é que o sujeito está preso na Papuda. O que não compreendo é a conclusão: “o espetáculo continua”. A CPI quebrou o sigilo bancário, telefônico e fiscal de dezenas de pessoas, e até de uma das maiores empreiteiras do país, ou seja, está fazendo muita coisa que o Ministério Público a PF não conseguiram fazer. A CPI, naturalmente, não é perfeita. Como toda CPI, em qualquer lugar do mundo, há briga política e partidária, há gente tentando aparecer, outros querendo melar a investigação, enfim, é um parlamento, um casa de opiniões divergentes, não um conciábulo de bispos discretos e silenciosos.

O que me entristece é ver Ferreira Gullar, um poeta que sempre admirei, produzir um texto cujo objetivo é tão somente desqualificar o parlamento brasileiro. Repito, sei das mazelas do nosso legislativo, mas considerando que não há parlamento puro ou perfeito em nenhum lugar do mundo, espanta-me sempre ver a mídia brasileira tentando denegrir o nosso mesmo quando ele age corretamente, criando CPIs que podem atingir um governo aliado, e se esforçando para combater a corrução no Brasil.[/s2If]

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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zuleica jorgensen

05/06/2012 - 21h24

Este é mais um texto desastrado de Gullar, que ao que tudo indica, prefere mesmo é uma boa e sólida ditadura militar. Ex-comunista é como todo ex: um rancoroso incorrigível.

Francisco de Alcântara

05/06/2012 - 12h44

Nao tinha como nao lembrar de vc, Miguel, hahahaha

Abs…

http://nassifra.blogspot.com.br/2011/02/manual-do-jornalista-vendido-os-7-tipos.html

paulo astra

05/06/2012 - 11h25

O desembargador Tourinho Neto e Cachoeira
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/veja-e-o-estelionato-jornalistico


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