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Guido Mantega: Bancos tem 1 mês para cortar juros em 40%

Assistam a entrevista do ministro da Fazenda, Guido Mantega.

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Assistam a entrevista do ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao UOL:

Leia abaixo a transcrição da entrevista:

Leia a transcrição da entrevista:

Guido Mantega – 25/5/2011

Narração de abertura: Guido Mantega tem 63 anos. É ministro da Fazenda desde 2006. Foi nomeado pelo ex-presidente Lula e mantido no cargo pela presidente Dilma Rousseff.

Mantega nasceu em Gênova, na Itália. Chegou ao Brasil com 3 anos e meio. É formado em economia pela USP.

Antes de assumir a Fazenda, Guido Mantega foi ministro do Planejamento e presidente do BNDES, também no governo Lula.

Filiado ao PT, o ministro trabalhou como assessor econômico nas campanhas presidenciais de Lula de 1989 a 2002.

No governo Dilma, a missão de Mantega tem sido pensar em soluções para o Brasil crescer e não sucumbir à crise internacional.

Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um “Poder e Política – Entrevista”.

Este programa é uma realização da jornal Folha de S.Paulo e dos portais UOL e Folha.com. Hoje participa também da entrevista o jornalista da Folha Valdo Cruz.

As entrevistas são todas gravadas no estúdio do Grupo Folha em Brasília. Hoje, excepcionalmente, está sendo gravada na sede do Ministério da Fazenda em Brasília porque o entrevistado é o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

*Folha/UOL: Ministro, muito obrigado por sua entrevista. Eu começo perguntando: qual é a perspectiva de crescimento do PIB neste ano de 2012? *

*Guido Mantega: * Olha, nós começamos o ano com a economia pouco aquecida [no] primeiro trimestre e, já a partir de abril e maio, a economia começa a reagir às medidas que o governo tem tomado.

*Folha/UOL: Mas vocês estavam prevendo no começo do ano um crescimento [do PIB] de 4,5% [ao ano] a 5% [ao ano]. Recentemente o sr. fez uma revisão. E o agravamento da crise internacional acabou mudando totalmente a estratégia de vocês. Então qual é hoje a previsão do sr. para o crescimento em 2012? *

Guido Mantega: Minha previsão não é mais 4,5% [ao ano] porque não dá, mesmo que no segundo semestre estaremos crescendo a 4,5%, 5%. Porém, como o primeiro semestre será mais fraco, nós não conseguiremos essa marca. É que nós vivemos um momento de incertezas por causa da situação internacional, que tende a se agravar. Mesmo assim o Brasil será um dos poucos países que, em 2012, terá um crescimento maior do que em 2011.

Folha/UOL: Mas o Banco Central já fala em um crescimento próximo a 3,5%, ano fechado [de] 2012. É exequível pensar em 3,5%?

Guido Mantega: É exequível pensar em 3,5% a 4%. Nós temos sempre que perseguir mais. O governo não pode se acomodar e ficar olhando. O governo, principalmente quando acontecem problemas, ele tem que tomar medidas para eliminar esses problemas e superá-los. Então acho que de 3,5% a 4,5% é uma boa previsão para o crescimento neste ano caso não haja um agravamento da crise internacional.

Folha/UOL: Tenho uma história, hein Fernando, tem uma história que é comentada no mercado de que o sr. [Guido Mantega] ganhou dois apelidos. O sr. é “animador de auditório” ou então “levantador de PIB”, porque seu estilo é otimista. O que o sr. acha desses dois apelidos que o sr. ganhou? “Levantador de PIB” e “animador de auditório”.

Guido Mantega: Não tenho característica de “animador de auditório”. Não tenho essa virtude, essa qualidade. Agora, “levantador de PIB” é a minha função desde que eu assumi o Ministério da Fazenda. Eu assumi em 2006, em 2007 lançamos o Plano de Aceleração do Crescimento [o PAC], que nada mais é do que levantar o PIB. E o PIB foi levantado. Se você olhar: eu entrei em 2006. Em 2006 a economia cresceu 4%, ninguém acreditava, só o ministro da Fazenda. Em 2007 crescemos 6,1%. Em 2008, com a crise, 5,3%. Aí veio a crise em 2009 e foi menor. Mas em 2010 crescemos 7,5%. A média de 2007 a 2010, 4,5%. Eu me considero um “levantador de PIB”.

Folha/UOL: Tem uma crítica hoje no mercado que é o seguinte: o Ministério da Fazenda está procurando levantar o crédito, só que hoje em dia você tem alto endividamento das famílias, a inadimplência é maior… Esse modelo de crescimento forte do país baseado no aumento do consumo não está esgotado?

Guido Mantega: Olha, eu acho isso quase uma piada, dizer que o nosso modelo está esgotado. Em primeiro lugar, o endividamento das famílias brasileiras é dos menores do mundo. Sabe qual é o comprometimento de orçamento familiar das famílias brasileiras? Em torno de 20% a 22%. Sabe quanto é nos Estados Unidos? Na maioria dos países é acima de 80%. Portanto nós somos o lanterninha em termos de endividamento. Em segundo lugar, a economia brasileira continua gerando empregos. Vocês viram hoje o desemprego mais uma vez caindo. Portanto, uma das poucas economias do mundo que gera emprego. Massa salarial, isso é consumo, capacidade de consumo. A pesquisa de comércio varejista, a PMC, nos diz que o comércio varejista está crescendo 7% em 12 meses, portanto o mercado brasileiro está crescendo. O endividamento da população brasileira do ponto de vista relativo é baixo. Não sei com quem você vai comparar, mas se comparar, eu tenho aqui uma lista, depois te mostro a lista, todos os países tem um endividamento maior que o nosso.

Guido Mantega em entrevista ao Poder e Política
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Lula Marques/Folhapress
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O ministro da Fazenda, Guido Mantega, participa do programa “Poder e Política – Entrevista”, conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues Leia mais
Folha/UOL: Mas ministro, não obstante, a taxa de inadimplência não tem subido de uma forma até alarmante em certa medida?

Guido Mantega: Não, não tem alarmante. A taxa de inadimplência flutua ao longo do tempo. Ela tem uma correlação com o nível de atividade. Quando você aquece o nível de atividade, ela chega ao seu menor patamar. Quando você dá uma desaquecida, encarece o crédito, e nós fizemos isso no ano passado para combater a inflação, para combater o aquecimento da economia, então nós reduzimos o crédito, encarecemos o crédito. Além disso o setor financeiro talvez tenha exagerado um pouco na dose. Puxou mais o freio de mão e, quando você faz isso, você está fazendo uma ação pró-cíclica. O que é pró-cíclica? Olha, a economia está desacelerando, você toma uma medida que ajuda a desacelerar. Ela está desacelerando e começa a inadimplência a subir um pouco. Então você fala: eu vou reduzir o crédito, vou aprovar menos.

Folha/UOL: O sr. está dizendo que, se a economia voltar a crescer como todo mundo espera, o sr. espera que no segundo semestre esse movimento dos bancos e essa alta da inadimplência vai ser sobrestada pelo crescimento da economia?

Guido Mantega: Exatamente. Como a economia já está voltando a acelerar, o crédito está voltando a ser liberado. O Banco Central fez uma avaliação, no mês de abril houve um aumento de 8% no crédito de pessoa física e 4,5% de pessoa jurídica. Ou seja, está dando certo, vai funcionar. Os juros caindo também. E isso, claro, não é tão imediato o efeito, mas daqui a dois, três meses, você vai ver crédito suficiente para as operações.

*Folha/UOL: Os bancos privados fizeram aquilo que o governo desejava que eles fizessem ou ainda falta? *

Guido Mantega: Falta. Os bancos privados deram sinais de que vão fazer.

Folha/UOL: Falta quanto?

Guido Mantega: Não, começaram no outro dia… Há duas semanas que eles se comprometeram…

Folha/UOL: Demoraram, ministro?

Guido Mantega: Olha, os bancos públicos saíram na frente e os bancos privados estão se organizando. Imagino que haja algum tempo para que você possa colocar as medidas na rua.

Folha/UOL: O que é esperado? Quantos meses o sr. acha, para os bancos privados chegarem onde o governo quer que eles cheguem?

Guido Mantega: Veja, em mais um mês tudo isso tem que estar rodando.

Folha/UOL: O que significa isso, “em mais um mês tem que estar tudo rodando”?

Guido Mantega: Nós reduzimos em 1% o IOF, isso é na veia. Então nós estamos ajudando. O Banco Central liberou um pouco de compulsório para o mercado.

Folha/UOL: De veículos…

Guido Mantega: De veículos. Não! Tinha liberado para carteira de bancos e agora para veículos. Então todo mundo está colaborando. Eles têm que reduzir as taxas de juros e aumentar o volume de crédito. No caso automobilístico, foi feito um pacto entre nós. Sentados na mesa, os maiores bancos brasileiros, o setor automotivo… Aí eu falei: bancos, qual é a função de vocês? Aumentar o volume de crédito, ser menos exigente, em vez de aprovar só dois ou três [empréstimos], aprovar quatro ou cinco, não é? Porque é fácil dizer “olha, aprova só um volume pequeno”. Diminuir a entrada e aumentar as prestações, não é? [Em troca disso] o Banco Central libera compulsório. Eles se comprometeram numa mesa comigo, faz o quê? Uma semana, duas semanas? Então não dá tempo ainda.

Folha/UOL: Mas é um mês. Final de junho, estamos falando do final de junho, os bancos vão ter que estar oferecendo mais crédito, esse volume de crédito será perceptível e o governo vai aferir se houve resultado ou não?

Guido Mantega: Exatamente. Aliás, nós temos resultado semanal, nós temos uma pesquisa semanal do Banco Central que mostra a taxa de juros que está sendo cobrada naquelas linhas e o volume de crédito que está sendo liberado. Para termos um controle.

Folha/UOL: Ministro, o sr. poderia citar algumas dessas taxas? Quanto é hoje e a quanto o sr. espera que chegue daqui a um mês?

Guido Mantega: Não, eu não sei de cabeça. Mas várias taxas, falando do Banco do Brasil e da Caixa Econômica, que eu conheço melhor, há taxas de juros que caem pela metade. É coisa assim, é muito significativo…

Folha/UOL: O sr. gostaria que tivesse o mesmo ritmo nos bancos privados?
Guido Mantega:…porque para o consumidor, o consumidor ele vai ter o produto mais barato, o produto vai custar menos. Ou ele compra mais, ou ele se endivida menos. Vai viabilizar… E cai a inflação.

Folha/UOL: Em termos objetivos: no final de junho, é desejável para o governo que os bancos privados tenham reduzido pela metade os de juros que cobram para esse tipo de empréstimo, para automóvel, por exemplo, em relação ao que cobrava antes dessas negociações?

Guido Mantega: Não, automóvel não é possível porque a taxa de juros de automóvel é das menores. Então não tem como reduzir.

Folha/UOL: Qual cairia pela metade?

Guido Mantega: Quando eu digo pela metade, eu estou falando mais dos bancos públicos, que eu conheço. Eu já… Se os bancos privados reduzirem 30%, 40% e aumentarem o volume, 30%, 40%, já estarão prestando um serviço à economia brasileira, está certo? A nossa intenção é ter um acompanhamento semanal dessa história e eu vou cobrar…

Folha/UOL: E se os bancos não reduzirem?

Guido Mantega: Bom, eu acho difícil porque já estão reduzindo.

Folha/UOL: Mas digamos que eles aumentem tarifa, como têm aumentado?
Guido Mantega: Agora eu vou fiscalizar tarifa. Temos um sistema para fiscalizar tarifa, temos um sistema para fiscalizar tarifa.

Folha/UOL: Mas eles serão punidos se aumentarem as tarifas?

Guido Mantega: Os bancos públicos hoje possuem 44% do mercado interno. Então isso se chama concorrência. Se eles [os bancos privados] bobearem, a concorrência vai pegar os clientes. Acho que ninguém quer perder cliente. Então os bancos públicos estarão cada vez mais agressivos oferecendo crédito a quem quer que seja. Primeiro se oferece aos clientes que já estão lá. E depois você fala: “olha, pessoal, venham aqui para o nosso banco, porque nós estamos oferecendo. Por que você está pagando essa taxa nesse banco?”. Isso começou em 2009. Eu estou falando isso, não é uma teoria. Em 2009 aconteceu isso. Os bancos privados puxaram totalmente o freio, aí os bancos públicos entraram. No início não acreditavam. Teve uma ou outra manifestação dizendo que iam quebrar os bancos públicos. Quebrou coisa nenhuma, aumentou o lucro dos bancos públicos. Quando eles viram que funcionava o sistema e eles se sentiram seguros… Porque não é para ninguém entrar e quebrar. Ninguém quer isso. É para o banco faturar mais, ganhar movimento. Ter mais clientes…

Folha/UOL: Ministro, falando em…

Guido Mantega: Eles necessariamente entrarão nisso.

Folha/UOL: Falando em juros, na semana que vem tem uma nova reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central. Qual é a sua expectativa para essa reunião?

Guido Mantega: Em relação ao Copom, cabe ao Banco Central decidir. Quando a gente fala “ir para uma taxa [de juros] civilizada” é no lingo prazo. Não é necessariamente em uma reunião. É quando o Banco Central achar possível, mas nós temos um tempo pela frente para que isso aconteça. E vai acontecer. Está acontecendo. Mas tem que ter um tempo e esse tempo é calibrado pelo Banco Central no caso da taxa básica. No caso das outras taxas estaremos fazendo uma pressão permanente até que elas cheguem nos patamares convenientes para a população brasileira.

Folha/UOL: Voltando à questão da inadimplência, ministro. O sr. disse recentemente que o governo prepara medidas exatamente para reduzir essa inadimplência, na hora em que as pessoas vão renegociar as suas dívidas para ter taxas menores. Quando essas medidas vão sair, ministro?

Guido Mantega: Bom, sempre existe um certo volume de inadimplência, o que costuma acontecer é que essa inadimplência fica parada. O sujeito paga, perdeu o crédito, fica muito caro para ele pagar. As regras atuais não favorecem o pagamento de débito. Porque assim, quando você tem uma inadimplência, o banco já provisionou e descontou 40% dos tributos que ele teria que pagar, que ele não paga. 40% é imposto de renda que o banco paga. Quando você faz a renegociação da dívida e torna adimplente, ele teria que pagar os 40% na cabeça. Aí fica muito cara a transação, porque o cliente não vai querer pagar os 40% e o banco também não quer pagar. Então o que nós vamos fazer é o seguinte: como ele não vai pagar à vista… Você deve lá R$ 1 milhão. Do jeito que está hoje a coisa, o banco teria que pagar 40% para fazer a reestruturação. O que vai ser feito é o seguinte, vai ser diferido ao longo do tempo do pagamento real. Então pego R$ 1 milhão, como renegocia? Você não pode pagar à vista esse R$ 1 milhão, mas se eu parcelar em três anos, você paga, te dou um desconto da multa, dos juros… E aquele imposto ao invés de ele pagar na cabeça, ele vai pagar diferido no tempo. E aí fica viável.

Folha/UOL: Sai quando isso ministro?

Guido Mantega: Sai em breve.

Folha/UOL: Qual impacto que ela [a medida] vai ter na sua opinião?

Guido Mantega: Vai ser um impacto bom, porque você vai diminuir a inadimplência. Uma parte desses inadimplentes gostariam de pagar, gostariam de ter uma saída.

Folha/UOL: Tem já alguma quantificação já de número?

Guido Mantega: Não. Aliás, nós já até fizemos a legislação, mas para até R$ 30 mil reais.

Folha/UOL: O sr. vai estender para quanto?

Guido Mantega: Vou estender para até R$ 80 ou R$ 100 mil. Então para até R$ 30 mil deu uma boa diminuída na inadimplência.

Folha/UOL: Então vai estender para até R$ 80 ou R$ 100 mil. Essa medida que vai facilitar para pessoas que tenham dívidas, digamos, de até R$ 100 mil, condições facilitadas para voltarem a ser adimplentes?

Guido Mantega: Exatamente. Os bancos apresentarão a elas condições que façam com elas se tornem novamente adimplentes. Agora, a gente fala em inadimplência, mas como a sociedade, é uma economia que tem quase pleno emprego, massa salarial cresce 5%, 5,5%, não dá para dizer que ela caminha para a inadimplência, com uma dívida familiar em torno de 20%, 22%, uma das menores do mundo, não dá para dizer. Então não esgotou o modelo coisa nenhuma. O nosso modelo está começando, esse modelo de desenvolvimento com inclusão social. Nós temos ainda a inclusão de vários brasileiros na classe C, no consumo, isso vai continuar, está continuando, porque todas as políticas sociais estão aí, a economia continua gerando emprego, uma das poucas que gera isso. Então essa dinâmica vai continuar. Então, falar em esgotamento do modelo é uma ousadia teórica.

Folha/UOL: O Brasil convive com taxas de inflação muito baixas em relação ao seu passado não muito remoto. Mas na comparação com taxas de inflação de países desenvolvidos, a nossa ainda é alta. Como o sr. acha que o Brasil passará a ter essas taxas mais baixas, perto de 2%, 1%, que é a dos países mais desenvolvidos.

Guido Mantega: Quando a gente conseguir fazer uma desindexação geral. Porque nós ainda temos resquícios do período inflacionário. Porque muita coisa avançou…

Folha/UOL: Tem algo a ser feito ainda neste ano para desindexar?

Guido Mantega: Vou te dar um exemplo. O IGP-M, ou o IGP, a família do IGP: IGP-M, IGP-DI, todos os IGPs. Ele é um resquício e ele é um indicador que mede variação cambial. Então, só para te dar um exemplo, a gente exporta minério de ferro, só que se você pegar a Vale, a Vale exporta 90% do que ela produz aqui e 10% fica no país. A medição do IGP é [com base em] 100% do que ela produz. Vai lá na produção e diz quanto subiu o preço. Bom, a Vale subiu 90% do preço lá para os chineses pagarem a conta e aí a gente leva esses 90% no índice da inflação e nós não vamos consumir esse minério, são eles que vão consumir. O mesmo vale para soja, vale para milho, todas as commodities. Então o IGP não é um bom índice para a inflação porque ele tem esse componente. Porém, ele é utilizado, por exemplo, nos contratos de locação. Então a gente teria que dar um jeito nisso.

Folha/UOL: O sr. pretende proibir que o IGP-M seja…

Guido Mantega: Não, veja bem, a gente procura sempre não interferir. Até mesmo porque o IGP-M não é obrigatório. São contratos particulares. Eu vou pedir para a Fundação Getúlio Vargas fazer o IGP… “preços no mercado interno”, alguma coisa assim, e não “preços gerais da produção”. Porque aí diria: esse índice mede aquilo que é consumido no Brasil. Aí é a inflação brasileira mesmo, e não aquilo que é exportado, que é a inflação de fora.

Folha/UOL: E deve ser feito nesse ano ainda? O sr. acha que a fundação pode fazer?

Guido Mantega: Ou também persuadi-los, aos contratantes, a usarem mais o IPCA e tudo mais. O que nós podemos fazer, e vamos fazer, é nos contratos de energia elétrica. Porque os contratos de energia elétrica feitos no passado são todos com IGP, IGP-M, IGP-DI etc. Então na renovação desses contratos, porque nós não violamos nenhum contrato, na renovação serão trocados. Na verdade, o ideal não é trocar, é não ter indexação.

Folha/UOL: Mas o sr. acha possível não ter indexação.

Guido Mantega: Não, ter algum sistema de correção, medindo assim, produtividade… Nos outros países não tem isso, isso é coisa do Brasil. Então isso temos que fazer.

Folha/UOL: Taxa de câmbio: está perto de R$ 2 [o valor de 1 dólar]. Qual é o patamar que o sr. acha que vai ser o de acomodação, e que vai ser bom para todos os lados, da taxa de câmbio?

Guido Mantega: Olha, nós… O governo não trabalha com uma taxa, o governo trabalha com o câmbio flutuante. O que nós podemos dizer, quando ele está muito sobrevalorizado, quando o real está muito valorizado e prejudica o país, prejudica exportação, diminui concorrência do produtor brasileiro, ou quando ele está desvalorizado. Então neste momento ele está num patamar mais favorável à produção manufatureira brasileira, fica mais barata.

Folha/UOL: É o ponto de equilíbrio, R$2?

Guido Mantega: Olha, eu não sei qual é o ponto de equilíbrio. Nós vivemos uma situação um pouco atípica, porque hoje está havendo uma desvalorização de todas as moedas, com exceção de duas, o iene e o dólar. Portanto não é o momento. Tanto que nós paramos de fazer aquelas medidas que não deixavam valorizar.

Folha/UOL: O real a R$ 2 leva a um pouco mais de inflação. Quanto representa, se o dólar ficar a R$ 2 até o final, na taxa de inflação deste ano, o sr. acha?

Guido Mantega: Muito pouco. Porque nós estamos falando de importação principalmente de manufaturados, manufaturados estão em crise no mundo todo. Há um rebaixamento de preços. Então é pequeno o impacto. Em compensação há uma queda do preço das commodities. Esse preço em queda das commodities é uma pressão desinflacionaria. Então uma coisa neutraliza a outra. Então nós não estamos preocupados…

Folha/UOL: Não haveria impacto relevante na sua avaliação?

Guido Mantega: Não haveria impacto relevante. É muito difícil fazer essa conta. Nós temos uma conta aqui, que é uma conta, digamos, uma estimativa, não é precisa, de que cada 10% que sobe o câmbio, poderia ter o impacto de 0,2, 0,3 de preço. Mas isso não considera o outro lado da questão, que é a queda das commodities.

Folha/UOL: Ministro, carros. Os brasileiros gostam muito de carros mas às vezes não gostam muito das montadoras. E nesse pacote de medidas que foi anunciado agora de novo tem um incentivo para as montadoras, é compreensível pelo impacto que eles têm na cadeia produtiva e de serviços. Agora, o governo poderia exigir uma contrapartida maior das montadoras quando faz isso? Por exemplo, exigindo carros mais modernos, menos poluentes.

Guido Mantega: Poderia, deveria e o fará no novo regime automotivo, que vai entrar em vigor, e já está até anunciado, nós anunciamos o novo regime no Brasil Maior 1.

Folha/UOL: Entra em vigor em 2013, não é isso?

Guido Mantega: Entra em vigor em 2013. Existem estímulos ou penalizações para a eficiência do carro. Eficiência energética, avanço tecnológico. Quem fizer isso, vai ter IPI reduzido por causa disso. Assim como nós queremos fazer o mesmo para a linha branca etc. Aliás, quando fizemos já foi assim, só ganharam desoneração aqueles produtos que estavam com a classificação A energética, ou seja, que gastava menos energia, que polui menos o meio ambiente.

Folha/UOL: Nesses pacotes todos já não poderia ser arrancado das montadoras alguma… pelo menos promessa?

Guido Mantega: Mas nós arrancamos redução de preços. Eles já vêm dando desconto, a verdade é essa.

Folha/UOL: Mas além do aspecto financeiro…

Guido Mantega: No curto prazo isso não é impossível. No curto prazo.

Folha/UOL: O sr. citou aqui que existe uma possibilidade, está todo mundo falando nisso, de um agravamento da crise na Europa, com a possibilidade de a Grécia sair da zona do Euro. Isso pode causar um impacto muito grande na economia mundial, inclusive no Brasil, não estamos isolados. Qual seria o plano B do Brasil caso ocorresse esse cenário de agravamento da crise econômica mundial?

Guido Mantega: Se houve o agravamento, nós temos todos os instrumentos para neutralizar essa situação que vai acontecer. Nós temos o dobro de reservas que tínhamos em 2008. Ou seja, hoje o Brasil tem melhores condições para enfrentar uma crise que não será igual a de 2008, será mais branda. Mas será séria do mesmo jeito. Nós temos o dobro de reservas, nós temos mais depósitos compulsórios, que é crédito que o Banco Central pode liberar. Nós podemos liberar divisas em moeda estrangeira a partir dos leilões. A situação fiscal é melhor ainda que em 2008, nós estamos fazendo o primário. Nós temos já a expertise, aprendemos em 2008, em 2009. Porque ali a gente estava começando. Então, às vezes, demorava um mês, dois, ara bolar uma medida. Agora nós somos muito rápidos, até nos antecipamos em certas medidas. E tem gente que diz que nós somos apressadinhos, veja você…

Folha/UOL: A redução da meta do superávit fiscal é uma consideração plausível para uma necessidade, para segurar a economia?

Guido Mantega: Bom, não vejo necessidade e continuamos fazendo dentro do parâmetro estabelecido dentro da Lei Orçamentária. Ou seja, 3%, mais de 3%.

Folha/UOL: Recentemente numa entrevista o sr. chegou a admitir, em caso de piora do cenário internacional, examinar essa possibilidade de reduzir o superávit primário. Existe essa possibilidade ministro?

Guido Mantega: Se houver uma hecatombe, aí claro, usaremos todos os instrumentos para não deixar a economia brasileira derrapar.

Folha/UOL: O que seria esse cenário de hecatombe, ministro, para levar a essa necessidade de reduzir o superávit primário? Existe essa possibilidade, ministro?

Guido Mantega: Por exemplo, a Grécia sai do Euro de uma forma desorganizada. Isso causa um problema em outros países da periferia que têm o seu sistema financeiro fragilizado e isso pode causar uma saída de capitais de vários países, pode criar um problema no comércio internacional, um travamento do comércio internacional. Tudo isso nós temos como suprir. Temos crédito. Temos mercado interno, porque vai faltar lá fora. Temos recursos financeiros, recursos fiscais. Então o Brasil está totalmente aparelhado para enfrentar até o pior. E vamos crescer de qualquer jeito.

Folha/UOL: A inflação fica em quanto nesse final de ano, ministro?

Guido Mantega: A inflação deste ano será menor que a do ano passado. Por enquanto ela está na casa do 5,2%, 5,1%. No ano passado foi 6,5%. Vamos aguardar aí a evolução das coisas, do cenário internacional. O cenário internacional tende a reduzir a inflação. Inclusive o petróleo também já está caindo de preço. Então se a crise se agravar, as commodities se desvalorizam mais, pressão deflacionária. Senão, se ficar nesse patamar, já houve uma redução, porque as commodities subiram muito e agora caíram uma parte do que subiram. Se ficar onde está, fica bom para nós.

Folha/UOL: Ministro, o sr. é filiado ao PT. Já pensou em disputar algum dia algum cargo público numa eleição?

Guido Mantega: Não, não pensei e nem pretendo pensar. Acho que não faz parte do meu estilo, do meu perfil. Eu sou um perfil mais técnico, eu gosto mais de um trabalho técnico. E saindo daqui não vou participar de nenhuma eleição.

Folha/UOL: O sr. vota em São Paulo, fará campanha para Fernando Haddad?

Guido Mantega: Eu voto em São Paulo. O ministro da Fazenda tem dificuldade porque eu lido com todos os Estados, nós temos uma atuação, digamos, federalista, republicana. E eu tenho muito pouco tempo. Poderei fazer, se tiver alguma gravação, alguma coisa assim. Mas não vou fazer campanha de rua nem nada parecido. Eu não costumo me envolver muito nas eleições.

Folha/UOL: O sr. foi ministro no governo Lula, agora é ministro no governo Dilma. Conviveu com o presidente Lula, agora convive com a presidente Dilma. Qual é a grande diferença entre um e outro?

Guido Mantega: A diferença de personalidade, evidentemente, são duas pessoas… A Dilma é mais assim, mais um estilo técnico, até mais parecido, é economista etc. O presidente Lula tem mais da classe política, não é. Mas eu diria que tem mais semelhança do que diferença entre os dois. Claro, uma coisa é o estilo pessoal, como eles tratam, outra coisa é como governam. Então no governar, o estilo é parecido, a trajetória é a mesma, um governo é continuação do outro, é o mesmo projeto, é um projeto que foi implantado, que vai amadurecendo, que vai se desdobrando. É claro que a Dilma tem a vantagem de que ela fez o aprendizado, que ela passou oito anos com o presidente Lula e com isso aprendeu um monte de coisa, e com isso ficou preparada para o exercício, não é. Então acho que é cumulativo.

Folha/UOL: A presidente é mais brava do que o presidente Lula?

Guido Mantega: Olha, ambos são tipos sanguíneos com personalidades fortes. Os dois. E isso é necessário para dirigir grandes equipes e para administrar problemas do tamanho do Brasil. Então não dá para botar uma pessoa mole, que não cobre. Não pense que o Lula, quando havia alguma frustração, algo que não era cumprido, ele ficava muito nervoso e exigia fortemente. Então eu diria que não há muitas diferenças em relação a isso.

Folha/UOL: Um humorista que faz na internet uma imitação da presidente Dilma, agora passa até na TV Globo, na televisão. E é muito engraçado. Num desses quadros, ele, o humorista [como] Dilma interage com quem seria o sr. O sr. assistiu a esse quadro e é verdade que o sr. mostrou esse vídeo para a presidente Dilma?

Guido Mantega: [risos] Eu assisti esse quadro. Achei engraçado. Às vezes tem um pouco de baixaria, né? Então por isso que eu não mostrei para ela. Não tive coragem. Mas…

Folha/UOL: [risos] O sr. sabe se ela assistiu, ela disse ao sr. ou alguém disse que ela assistu?

Guido Mantega: Olha, [risos] eu não me lembro. Eu acho que alguém disse que ela assistiu. Um ou outro, eu não sei, porque, é aquele, como é que chama? O “kibe”, “Kibe Loco”.

Folha/UOL: “Kibe Loco” na internet, mas agora está na televisão, foi contratado pela TV Globo.

Guido Mantega: Sei.

Folha/UOL: O sr. acha engraçado?

Guido Mantega: Eu não tive oportunidade, porque eu não tenho tempo de assistir televisão. Quando eu chego em casa eu já pego um filme, alguma coisa assim, mais tarde. Então eu não vi nenhum programa. Mas eu vi esse filminho e eu achei que é engraçado. Eu ouvi dizer que ela olhou e achou engraçado também.

Folha/UOL: O sr. acha que é uma boa imitação?

Guido Mantega: [risos] É, a imitação é caricata evidentemente. Eu acho que é bem humorado. Eu acho que o humor é importante e deve ser tomado na esportiva, né? Mesmo quando às vezes pode ofender um pouco a pessoa, usar algumas palavras, algumas coisas exageradas.

Folha/UOL: Ministro Guido Mantega, muito obrigado por sua entrevista à Folha e ao UOL.

Guido Mantega: Eu agradeço a oportunidade.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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