A situação do emprego industrial

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(Ilustração da capa: Anselm Kiefer).

Hoje foram divulgados dois indicadores de emprego na indústria que agregam conteúdo ao debate em curso sobre a situação real do setor. Os números chegam num momento em que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anuncia uma série de medidas para ajudar a indústria brasileira a superar a crise.  Os analistas econômicos, como Celso Ming, do Estadão, dizem que as medidas do governo para resolver o problema de competitividade da indústria configuram somente “puxadinhos”. Em geral, há duas visões distintas: os analistas ligados mais organicamente à indústria defendem com unhas e dentes todas as medidas que o governo vem adotando: maior restrição ao capital especulativo, protecionismo, reduções da carga tributária para alguns setores. Uma ala mais liberal e mais independente acha que o problema da indústria é sua competitividade.

De qualquer forma, o que importa é o que o governo vem adotando medidas concretas para proteger a indústria nacional de um processo de deterioração provocado pelo câmbio sobrevalorizado.

Muitos argumentam, por outro lado, que o Brasil está vivendo uma tradicional “crise holandesa”, que consiste na pressão negativa das exportações de recursos naturais sobre o câmbio e consequentemente sobre as indústrias locais. Neste sentido, encontrei um interessante artigo (é de 2006, mas muitos de seus argumentos são válidos), que contesta a existência de uma “crise holandesa” no Brasil. O artigo observa, dentre outras coisas, que o setor agropecuário brasileiro hoje envolve uma extensa cadeia industrial, e que a exportação de seus produtos, portanto, tem efeitos positivos para todos os segmentos a ela relacionados.

Vamos aos números divulgados hoje. Um é o indicador de emprego na indústria segundo o IBGE; o outro é o relatório mensal de fev/12 do emprego industrial em São Paulo, segundo a Fiesp. O Cafezinho de hoje preparou tabelas e análises com bases nesses números.

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Falemos dos números do IBGE.  Segundo a instituição, o indicador de pessoal ocupado em janeiro caiu 0,5% na comparação com o mês anterior, e registrou uma alta bem modesta de 0,8% no acumulado de 12 meses. A queda no mês foi puxada pela indústria de transformação, que registrou queda de 0,6% no mês e alta de 0,7% no acumulado 12 meses.

É importante, contudo, analisar a situação por setores, o que nos mostrará quais efetivamente vivem uma crise e quais tem conseguido atravessar o momento difícil (crise no mundo desenvolvido) de maneira satisfatória em termos de geração de emprego.

Acho melhor nos atermos aos dados acumulados em 12 meses, porque assim evitamos nos basear em situações sazonais ou temporárias.

Pois bem, a principal atividade industrial no Brasil é o segmento de transporte (fabricação de autopeças, carros, caminhões, tratores, motos, etc). Este setor foi o que registrou a maior geração de emprego no acumulado dos últimos 12 meses: alta de 6,4% no pessoal ocupado. Também foi o que registrou o maior aumento na folha de pagamento real (ou seja, descontada a inflação): alta de 9% em 12 meses.

Dos 17 setores pesquisados pelo IBGE, 8 registraram queda no nível de emprego em 12 meses: minerais não-metálicos, têxteis, borracha e plástico, vestuário, fumo, calçados, papel e gráfica, madeira.

Observe que dentre estes setores que apresentaram queda no nível de emprego, nenhum pode ser considerado estratégico. A queda no setor de madeira é derivada do setor de papel e reflete ainda, em parte, a redução do desmatamento e a maior fiscalização no suprimento de matéria-prima. O setor de papel e gráfica sofre queda porque a base de comparação ainda é o ano eleitoral de 2010, quando bilhões de reais foram investidos pelos partidos na produção de materiais de campanha. Os setores têxteis e calçadista continuam sofrendo a concorrência asiática. O fumo sofre com a queda paulatina mas firme, entre os brasileiros, do vício do cigarro, tendência que é mundial.

 

Agora vamos analisar os dados divulgados hoje pela Fiesp, que abrangem somente o estado de São Paulo.  O Valor fez uma matéria em cima desses números, mas focou apenas num lado negativo, sem contextualizar e sem apresentar um histórico.  Segundo a Fiesp, o emprego na indústria paulista cresceu 0,10% em fevereiro, na comparação com o mês anterior; e 0,18% no acumulado jan/fev, na comparação com igual período de 2011. No acumulado de 12 meses, porém, a queda foi de 1,24%. A alta no mês de fevereiro se transforma em declínio de 0,10% quando sazonalizada, porque fevereiro é um mês que, tradicionalmente, gera mais empregos que outras épocas.

Entretanto, um histórico das variações mensais, com ajuste sazonal (ver gráfico abaixo), ilustra bem que o desempenho em fevereiro deste ano não fugiu do padrão. Todo ano, entre o final de um ano e início de outro, há forte vai e vem na geração do emprego, e que a geração em novembro deste ano foi a maior dos últimos sete anos. Houve um declínio acentuado do emprego entre julho e outubro de 2011, e depois uma forte recuperação a partir de novembro. A pequena queda sazonal em fevereiro deste ano (de 0,10%) não fica mal na fita quando consideramos que ela representa melhora em relação a janeiro, quando houve queda de 0,15%, que por sua vez teve como base de comparação um desempenho muito bom em dezembro, com alta de 1,71%.

 

Ainda usando os dados da Fiesp, vale dar uma olhada na evolução do emprego nos últimos sete anos, por setor, para conferirmos onde exatamente está a crise. Preparei uma tabela com base no histórico disponibilizado pela instituição, com números de junho de 2005 a fevereiro deste ano. A tabela compara o número de vagas em fevereiro de 2012 com fevereiro de 2006. Dos 26 setores analisados pela Fiesp, apenas 6 registraram queda no nível de emprego: equipamentos de informática, impressão, madeira, vestuário, têxteis e calçados.

Novamente, portanto, vemos a crise na indústria bastante localizada nos mesmos setores: têxteis, calçados, gráficas, madeira. O setor de informática é quase inexistente no Brasil, infelizmente; a estagnação do setor reflete ausência de investimento em tecnologia, tanto da parte do governo como de empresas privadas, mas não significa nenhuma “desindustrialização”.

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Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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