A reportagem acima, da Al Jazeera, traz imagens impressionantes daquela já está sendo chamada a 2ª revolução do Egito. Os manifestantes exigem a renúncia do marechal da aeronáutica, Hussein Tantawi, considerado o ditador “de facto” do país, e o agendamento das eleições presidenciais em data mais próxima.
Alguns analistas internacionais, como do Asia Times, começam a olhar com desconfiança para as manifestações populares do Egito, suspeitando que pode haver interesses externos movimentando-se por trás dos protestos.
Mas após assistir a uma série de vídeos das manifestações, publicados em blogs, em jornais da Itália e França, a impressão que eu tenho é de um desejo popular legítimo de dar prosseguimento às reformas democráticas pretendidas desde os primeiros protestos na praça Tahrir.
Havia uma certa desconfiança, por parte de analistas internacionais, incluindo aqueles mais independentes e desconfiados dos EUA, que a Irmandade Muçulmana poderia estar manobrando as manifestações com vistas a ampliar o seu poder. O analista do Asia Times menciona inclusive o rumor de que agentes do Irã estariam insuflando muçulmanos egípcios.
Essas teorias já arrefeceram, pois a Irmandade Muçulmana decidiu negociar com o governo, e não mais apoiar as manifestações, e mesmo assim estas cresceram de tamanho, revelando que havia um certo exagero sobre a força da Irmandade. Subestimou-se ainda, mais uma vez, o desejo do povo egípcio por democracia e liberdade, não aquela pela qual o Pentágono destrói países, mas um autêntico desejo de possuir um governo mais transparente e viver numa sociedade mais moderna.
O blogueiro egípcio que ciceroneamos aqui no Rio há duas semanas nos enviou mensagem bem tristes, dizendo que tem visto muita gente morrer da janela de seu apartamento, que fica bem na praça Tahrir. O exército tem usado um gás venenoso, que segundo o testemunho agora de várias autoridades, inclusive do ex-chefe da Agência Internacional de Energia Atômica, o prêmio Nobel da paz Mohamed El Baradei, cogitado para chefiar um governo civil provisório, já matou muita gente. Nosso amigo blogueiro confirma essa informação. “O gás tem matado mais que as armas de fogo”, nos contou.
Ao ver tanta gente na rua, enfrentando gás letal, tiros, cacetetes, frio, fome, sede, chuva, acampados na praça Tahrir, cheios de esperança e fúria mesmo diante de tantas dificuldades, eu penso na desculpa esfarrapada que deram os organizadores das marchas contra a corrupção no Brasil. Era feriado e chovia, disseram. Tá bom. A verdade é que o ser humano está disposto a enfrentar tudo, desde que tenha motivos para tal. Se não há motivos, não adiante mobilizar todos os meios de comunicação, convocar celebridades, que mesmo assim só teremos 30 pessoas em Brasília, como tivemos no dia 15 de novembro. Já no Egito, com os meios de comunicação dominados pelo governo, mais de cem mil pessoas foram à praça Tahrir na terça. Discursaram, enfrentaram desarmadas um exército disposto a matar, e agora estão lá acampados, dizendo que só saem quando o governo fizer o que eles exigem. É uma verdadeira aula de política e uma lição de história.
Mas eles têm razão para protestar. Relatório recente da Anistia Internacional denuncia que tem havido violações de direitos humanos ainda piores que as praticadas durante a ditadura Mubarak. O sentimento de que a revolução foi traída tem atormentado os egípcios, sendo esta a razão principal para voltarem às ruas.