Os cadernos de economia do Estadão e Globo amanheceram hoje com notícias preocupantes acerca do endividamento das famílias brasileiras. Miriam Leitão publicou um artigo intitulado “Lenha na Fogueira”, abortando o tema, do qual destaco um trecho e um gráfico:
De 2006 para cá, a dívida das famílias brasileiras cresceu 250%. No mesmo período, a renda subiu 80%. Em 2006, a dívida total era quitada com dois meses e meio de rendimentos. Hoje, o/a chefe de família precisa de cinco meses para pagar tudo o que deve. As famílias não têm percepção do aumento da dívida porque a dilatação dos prazos faz a prestação caber no bolso.
O aumento da dívida e da renda foi calculado pelo economista André Gamerman, da Opus Gestão, incluindo todos os rendimentos dos brasileiros, como salários e transferências do governo, e todas as dívidas. A diferença de ritmo fez o endividamento das famílias em relação à renda anual saltar de 21,97% para 41,83%, em pouco mais de cinco anos (vejam gráfico). O percentual é maior porque a estatística do Banco Central não considera as dívidas que não passam pelo sistema financeiro, como os carnês de lojas. Também não entram cheques pré-datados que ficam retidos com os lojistas.
No Estadão, a matéria, que teve chamada na capa, foi a manchete do caderno de Economia:
Eu considero que esse tipo de alarmismo tem um lado positivo, porque a pior coisa que pode acontecer a uma economia hoje em dia é assistir à explosão de uma bolha de crédito. O alarmismo nos deixa alertas. Mas a gente precisa estar bem informado para saber exatamente até que ponto a informação é alarmista, o que dificilmente veremos na mídia tradicional.
Os empresários tem seus consultores especializados, que elaboram relatórios periódicos sobre a situação econômica, e lêem os jornais com um sorrisinho irônico nos lábios, divertindo-se com o sensacionalismo que faz sofrer a massa ignara.
Então eu fucei os sites do Banco Central e da Confederação Nacional de Comércio (CNC), em busca de estatísticas que confirmassem, amenizassem ou negassem os dados e as conclusões oferecidas pelos jornalões. Encontrei dados sobretudo no CNC, que amenizam bastante o alarmismo da mídia.
Abaixo publico alguns gráficos retirados da edição de outubro do Relatório de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, incluindo a sua conclusão.
Esse é um bom gráfico para a gente analisar, porque ele separa as famílias em duas faixas de renda, até 10 salários e mais de 10 salários. Vamos focar no consumidor com renda familiar mensal menor de 10 salários: ele deve em média 29,4% de sua renda. Por alguma diferença de metodologia, é um número bem menor do que o informado pelo Banco Central.
Na tabela acima, observamos que o endividamento médio das famílias, considerando todas as faixas de renda, tem se mantido estável entre 29 e 30% nos últimos 12 meses.
Na tabela acima, vê-se que o número total de famílias endividadas cresceu bastante nos últimos meses, embora tenha declinado de fevereiro até agora.
Os dados do CNC, diferentemente dos do Banco Central, incluem as dívidas com carnê, etc, então eles me parecem bastante completos. De qualquer forma, vale a pena ler com atenção a conclusão, que informa sobre a melhora do perfil da carteira de crédito e afirma que os indicadores de inadimplência seguem favoráveis.
A própria Miriam Leitão admite que a inadimplência do consumidor permanece baixa, embora tenha subido este ano, ficando em 6,8% em setembro.
Segundo a Serasa Experian, empresa especializada, a tendência é de um forte recuo na inadimplência a partir do primeiro trimestre de 2012, em virtude da queda na inflação, queda no desemprego e queda nas taxas de juro.
O índice de inadimplência do Banco central, por sua vez, ficou em 5,7% em outubro deste ano, contra 4,6% no mesmo mês de 2010, e 5,5% em setembro. O histórico do BC mostra que a inadimplência no Brasil costuma cair fortemente em novembro e dezembro, certamente por causa do 13º salário.
No site do Serasa, encontrei dados historicos para o índice de inadimplência desde 1999, que revela um crescimento gradual do índice.
Com a expansão do crédito popular no país, que antes não existia, é natural que aumente a inadimplência; mesmo assim, é importante mantê-lo sob controle, para evitar surpresas desagradáveis no futuro.
Com a queda no desemprego, o maior índice formalização, e o desejo da maioria dos brasileiros (segundo a Miriam Leitão) de usar o 13º para quitar dívidas, temos um cenário promissor contra a inadimplência em 2012.
Conclusão das conclusões: Governo, investidores e cidadãos devem permanecer atentos ao nível de endividamento, que de fato vem crescendo, mas como a tendência hoje é de crescimento econômico e estabilidade no nível de emprego, as perspectivas em relação à inadimplência e ao próprio endividamento são de queda. Não há, portanto, motivo para alarmismo.
Link da ilustração da capa.
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