A convergência ideológica dos partidos

A Folha de hoje traz uma interessante pesquisa sobre a percepção ideológica que os parlamentares brasileiros têm de si mesmos.

Uma das conclusões da pesquisa é que houve um significativo movimento de convergência ideológica entre 1990 e 2009 em direção ao centro. Certo, mas a mudança principal, conforme se vê no gráfico se dá entre 1990 e 1997, ou seja, ela reflete o profundo impacto que o fim do comunismo europeu e soviético tiveram na consciência política contemporânea.

No início da matéria, fala-se da existência de uma “direita envergonhada”:

A julgar pelo que deputados federais e senadores dizem de si mesmos, a direita nunca esteve tão envergonhada no Congresso Nacional quanto na última legislatura.

Pesquisa realizada com 139 congressistas mostra que em 2009 apenas 11,9% dos deputados e senadores se colocavam à direita da reputação de seus partidos (88,1% diziam se perceber à esquerda).
O percentual é o menor entre as seis edições da pesquisa, feita desde 1990 com 797 parlamentares diferentes, e mostra grande declínio em relação a 1997 e 2001.

Naqueles anos, durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso, 21,6% dos parlamentares se classificavam mais de direita do que seus próprios partidos.

A expressão é corroborada por um dos autores da pesquisa, Timothy Power:

“Na escala ideológica, é a direita que aparece como posição ultrapassada, já que o termo tem associação com ditadura e repressão. (…) Os políticos ainda fogem do rótulo ‘direita’ como se fosse o anjo da morte”, afirma Power, diretor do Programa de Estudos sobre o Brasil da Universidade de Oxford (Inglaterra).

Pode ser que alguns parlamentares sintam, sobretudo por razões eleitorais, um certo constrangimento em rotular-se de “direita”. O candidato José Serra, por exemplo, dizia que suas posições estavam à esquerda de Lula e Dilma. E o novo presidente do DEM, Agripino Maia, quando assumiu o mandato há alguns meses, causou enorme irritação entre o público conservador, ao recusar o rótulo de direitista. “O incrível país sem direita”, foi o título de um artigo publicado na Veja.

Os parlamentares de 1997 e 2001, porém, são diferentes daqueles de 2009.  Não foram precisamente eles, portanto, que passaram a ter mais “vergonha” de se declararem à direita de seus partidos, mas o eleitorado brasileiro é que optou por uma guinada política à esquerda à partir de 2002.  Se o pesquisador realizasse a mesma sondagem este ano, provavelmente os resultados seriam ainda mais negativos para a direita, também em função da escolha do eleitorado.

 

Congressistas se afastam de extremos e buscam o centro

Pesquisa indica menor distância ideológica entre os partidos políticos brasileiros
Percentual dos que dizem estar à direita é o menor entre as seis edições da pesquisa, realizada desde 1990

UIRÁ MACHADO – DE SÃO PAULO

A julgar pelo que deputados federais e senadores dizem de si mesmos, a direita nunca esteve tão envergonhada no Congresso Nacional quanto na última legislatura.

Pesquisa realizada com 139 congressistas mostra que em 2009 apenas 11,9% dos deputados e senadores se colocavam à direita da reputação de seus partidos (88,1% diziam se perceber à esquerda).
O percentual é o menor entre as seis edições da pesquisa, feita desde 1990 com 797 parlamentares diferentes, e mostra grande declínio em relação a 1997 e 2001.

Naqueles anos, durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso, 21,6% dos parlamentares se classificavam mais de direita do que seus próprios partidos.

Os dados integram a Pesquisa Legislativa Brasileira, cuja edição de 2009 foi analisada no livro “O Congresso por Ele Mesmo” (UFMG, 2011), organizado por Timothy Power e Cesar Zucco Jr.

“Na escala ideológica, é a direita que aparece como posição ultrapassada, já que o termo tem associação com ditadura e repressão. (…) Os políticos ainda fogem do rótulo ‘direita’ como se fosse o anjo da morte”, afirma Power, diretor do Programa de Estudos sobre o Brasil da Universidade de Oxford (Inglaterra).

Power diz “ainda” porque o fenômeno foi percebido em 1987 pelo cientista político Leôncio Martins Rodrigues, que então cunhou a expressão “direita envergonhada”.

Ao contrário do que então se imaginava, a passagem do tempo não deixou a direita mais à vontade. O Brasil democrático não cultivou conservadores assumidos, algo que ocorre em outros países.

“Nos últimos 20 anos, a esquerda brasileira acabou aceitando muitas das políticas econômicas propostas pela direita, mas a direita brasileira nunca soube converter essa imitação em legitimidade mais ampla”, diz Power.

NEOLIBERALISMO

Pesquisas conduzidas por Power mostram que em 1990 cerca de 72% dos congressistas que se diziam de esquerda defendiam maior presença do Estado na economia. Em 1997, com a voga neoliberal, o índice caiu para 47% e vem se mantendo estável.

Para Cesar Zucco, professor da Universidade Rutgers (EUA), os dados indicam que muitos congressistas se dizem de esquerda sem de fato defenderem posições tradicionalmente de esquerda, o que não ocorre com a direita.

“A esquerda veio para o centro, mas a direita continuou mais ou menos igual. O resultado é que, apesar de haver mais cadeiras ocupadas pela esquerda, o Congresso se percebe mais de centro e vê menos diferenças entre os polos ideológicos”, diz ele.

A convergência ideológica é analisada por David Samuels, professor da Universidade de Minesota (EUA). Para ele, o PT é o maior responsável por esse movimento.

“Afora o PT, nunca houve posições muito distintas entre os partidos. Quando o PT chega ao governo, razões pragmáticas levam a legenda para o centro. Com isso, a convergência no Congresso é acentuada”, afirma Samuels.

Segundo a classificação que os congressistas fazem dos partidos, praticamente todas as legendas de esquerda são vistas hoje mais à direita que em 1990, e as de direita, mais à esquerda.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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