O emprego não será televisionado

Os grandes jornais esnobaram ostensivamente, em suas edições impressas, os números do Ministério do Trabalho sobre a geração de emprego divulgados ontem. Apenas o Estadão deu uma nota na capa. O Globo menciona ao final de uma nota sobre a crise no Trabalho, como se tratasse de um detalhe. As matérias internas sobre o emprego também são pequenas, superficiais e aparecem em local subalterno das páginas.

Eu acho impressionante que os jornais dêem tanto espaço para a crise européia e demonstrem tanta má vontade e preguiça em se debruçar sobre os números do emprego no Brasil. As notícias se restringem a menções apressadas à queda no saldo de geração de empregos de outubro na relação com 2010, que foi de 38%; e à redução, por parte do ministro do Trabalho, na estimativa de geração de empregos no acumulado do ano, que passou de 2,7 para 2,4 milhões de postos. E tudo isso sempre perdido no meio de observaçõezinhas ácidas sobre a “crise” política na pasta.

A importância dessa informação, porém, merecia infográficos, opiniões de especialistas, análises. Eu imaginei, ingenuamente, que o fato de termos dados negativos na comparação com o ano passado, poderia despertar o interesse da mídia no assunto. Mas não. Talvez com medo de encontrar, num estudo mais aprofundado, algum elemento positivo, a imprensa limitou-se a fazer uma careta e sacudir os ombros.

Mas deixemos a imprensa para lá e analisemos então os números do Caged. Preparei uma tabela, com os números por região:

 

Observe que o saldo de empregos de janeiro a outubro de 2011, calculado em 2,24 milhões de vagas, foi superior a todos os anos anteriores (e anos completos, de janeiro a dezembro) desde 2003, com exceção de 2010, cujo saldo atingiu o número excepcional de 2,6 milhões de vagas. Curiosidade: a região centro-oeste registra em 2011 o maior saldo de empregos de sua história.

É preciso considerar que o número do emprego tem características diferentes dos números referentes ao crescimento econômico, por exemplo. Há um limite para o estoque de empregos. Lembrando: a taxa de desemprego no Brasil caiu para 6% em setembro, último mês pesquisado pelo IBGE:

Parece-me uma matemática bem simples entender que, à medida que declina o desemprego no país, os saldos de geração daqui para frente serão necessariamente menores.

Ou seja, é imprenscidível sempre cotejar os dados de geração de emprego do Caged, que tem o valor de serem atualizados com mais celeridade, com a taxa de desemprego do IBGE.

Vamos agora ver o gráfico do Caged, com uma série histórica mostrando  a geração de emprego nos anos de 2002 a 2011. O fato de 2011 não ter terminado não importa muito neste caso, porque todo o saldo gerado em novembro deverá ser anulado em dezembro, que tradicionalmente registra forte recuo, em função do encerramento das contratações temporárias realizadas para o período natalino. O ministério previu que, até o final do ano, o saldo acumulado deverá ficar em 2,4 milhões de postos, mas sugeriu (segundo li nos jornais) que o número poderia ser um pouco menor. Então sejamos conservadores e estimemos o saldo em 2,2 milhões de empregos, que é o saldo alcançado de janeiro a outubro.

É tão difícil constatar que, num ano de crescimento baixo e num momento internacional extremamente negativo do ponto-de-vista econômico, teremos o segundo maior saldo de empregos em 10 anos?

E repito a formulação que fiz há pouco: é tão difícil compreender que o desemprego baixo irá, necessariamente, trazer saldos menores de geração de emprego?

De fato, o mundo vive hoje um momento delicado, com Europa e EUA atravessando depressão econômica, elevação do desemprego, instabilidade financeira. Tudo isso afeta o Brasil, naturalmente. Por outro lado, também vem criando oportunidades para que a nossa economia se consolide ainda mais perante o mundo desenvolvido, que assiste algo perplexo o Brasil gerando postos de trabalho ao mesmo tempo em que ele os perde.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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