Toda vez que os artigos mensais de FHC aparecem no jornal eu sinto repuxos estudantis. Imagino que tem a ver com o tempo em que escrevi meus primeiros artigos políticos, durante o primeiro reinado tucano. O artigo de hoje, intitulado Corrupção e Poder, reúne, mais uma vez, conceitos banais e midiáticos sobre a decadência moral da classe política brasileira.
Eu parei de subestimar os artigos de FHC, todavia. Quanto mais eu os acho enfadonhos, repetitivos e vazios, mais eles provocam repercussão. Então façamos uma análise rápida.
De fato, lendo com atenção, vemos que FHC tem uma suavidade que engana. O seu artigo traz acusações pesadíssimas, mas disfarçadas por seu estilo sonolento.
Por exemplo:
Antes o desvio de recursos roçava o poder, mas não era condição para o seu exercício.
Estamos diante de um sistema político que começa a ter a corrupção como esteio, mais do que simplesmente diante de pessoas corruptas.
Com essa linguagem, serena por fora, incendiária por dentro, FHC habilita-se a líder do novo udenismo, que aliás tem sido recorrentemente lembrado por FHC:
O “sistema” reage a essa argumentação dizendo tratar-se de “moralismo udenista”, referência às críticas que a UDN fazia aos governos do passado, como se ao povo não interessasse a moral republicana.
A característica principal desse tipo de artigo, a meu ver, é a tentativa constante de produzir uma situação maniqueísta. Em vez de participar realmente do debate, dialogando com pessoas e situações reais, o articulista inventa um adversário simplório e boçal, que representa o mal, o fisiologismo, a corrupção e o atraso. Daí, ele, FHC, se autoposiciona como contraponto ético e republicano a esse joão-bobo artificial e mudo. O resultado, naturalmente, é uma vitória completa, visto que o adversário não fala e não pensa.
Vejam esse trecho:
Esse tipo de ideologia vem associado a outra perversão corrente: fora do partido e do governo nada é ético; já o que se faz dentro do governo para beneficiar o partido encontra justificativa e se torna ético por definição.
Que ideologia é essa? Quem a professa? Ninguém, é claro. Ninguém seria tão idiota de dizer que “tudo que faz dentro do governo é ético por definição”.
Eu já percebi há tempos que isso é um vício acadêmico. Ou pseudo-acadêmico. Pinta-se um adversário hipotético, uma caricatura, para se criar um arremedo de dialética. Tenta-se disfarçar a pobreza de um debate tão artificial através do uso de uma linguagem rebuscada. Muitos se deixam iludir por essa artimanha. A maioria dos brasileiros não tem paciência para os devaneios moralistas e perfunctórios do ex-presidente, mas com certeza ele continua acendendo corações udenistas em Higienópolis e Leblon!
Alexandre
08/04/2013 - 13h59
Ao contrário do que você disse, FHC não foi maniqueísta e tampouco inventou adversários, como faz Lula.
Ele citou nomes e esquemas específicos dos quais discorda. E embasou muito bem seus argumentos.
reginaldo
06/11/2011 - 17h21
FHC já morreu faz tempo é um zumbir … falta só enterrar ….
José Honorato
06/11/2011 - 16h26
É louvável o esforço de criticar o texto do FHC. Um texto horrível, certamente. Faltou na crítica, porém, o essencial. O ex-presidente discursa como se nunca houvera ele também compactuado com as práticas que tão principescamente condena. Não era ACM um aliado fiel (e demandante) do ex-sociólogo? Não era o PFL ex-Arena hoje DEMo membro maior da aliança governista? Não enfrentou o governo dele uma série igualmente interminável de escândalos (pra não falar do maior deles, o da privataria)? Se a corrupção hoje encontra-se mais organicamente instalada nas esferas governamentais (a hipótese, que teria de ser provada, não é de todo absurda, mas diria respeito também ao PSDB), então tal processo de entranhamento conheceu uma intensificação também no governo dele, o vestal FHC… Ou, com base em suas recentes colunas, o cínico FHC.
Alberto Fuchs
06/11/2011 - 14h31
Um vício, sim, mas mais especificamente, é uma falácia conhecida: http://en.wikipedia.org/wiki/Straw_man
Agora, sua análise não é só rápida, é superficial a ponto de quem leu o artigo de FHC levantar uma sobrancelha de desconfiança. Logo no primeiro parágrafo FHC dialoga com o próprio Aldo Rebelo. No segundo, ele continua falando sobre o caso. No terceiro é que ele classifica o que já foi descrito nos dois anteriores como um tipo de ideologia. No quarto, ele fala sobre o mensalão, um caso específico. Enfim, do modo como você fala, é como se o artigo fosse todo vago, sobre formas que não encontram conteúdos no mundo real. E isso é falso; é só ler o texto: não só ele aponta problemas concretos como dá nomes aos bois.
Miguel do Rosário
06/11/2011 - 14h44
Olá Alberto, está certo. Ele cita Aldo Rebelo, mas não dialoga com ele. Pega uma frase descontextualizada e depois fantasia absolutamente. Aldo não falou que "tudo relacionado ao governo é ético". Sobre o mensalão, a fantasia vai ainda mais longe, ao dizer que nele "estava presente a ideologia que santifica o Estado". My God!